entrevista por Leonardo Vinhas
Das bandas surgidas na cena alternativa argentina da década passada, Las Ligas Menores talvez tenha sido o que mais se “internacionalizou”. É difícil pensar em outro nome do cenário indie do período que tenha feito mais turnês pelos Estados Unidos, Europa e América Latina do que o quinteto formado por Anabella Cartolano (voz e guitarra), Pablo Kemper (voz e guitarra), Micaela García (batería), Nina Carrara (teclados) e Angie Cases Bocci (baixo, que substituiu a baixista original, Luli Zamtlejfer, em 2019).
O quinteto faz parte do que a imprensa argentina chama de “geração pós-El Mató”, em referência ao grande impacto que o El Mató a Un Policía Motorizado teve na cena underground local. Essa geração, que inclui bandas como Bestia Bebé e Atras Hay Truenos, tem uma sonoridade fortemente baseada no indie rock noventista, em algum lugar entre o pop, o lo-fi e o ruído, com canções simples, de poucos acordes, e com os instrumentos formando uma massa sonora quase homogênea.
Também vale destacar que elas integram uma movimentação que começou quase conjuntamente com outras bandas por meio do selo/coletivo Laptra, responsável por lançar todo o material do Las Ligas Menores e de gente como Hojas Secas, Media Hermana, Mi Pequeña Muerte, o próprio El Mató e os veteranos indie 107 Faunos. Além disso, a relação com o Bestia Bebé é especialmente próxima: o frontaman Tom Quintans, já produziu várias gravações do Las Ligas Menores, e tem hoje um projeto com Luli Zemtlejfer chamado Tigre Ulli.
“El Disco Suplente”, um EP de 2012, foi o primeiro lançamento da banda. Depois vieram dois álbuns (um homônimo de 2014 e “El Fuego Artificial”, de 2018), outro EP (“Ni Una Canción”, de 2016) e um bom tanto de singles. Em meio a tudo isso, as turnês não paravam de sair, e a banda caiu nas graças da rádio KEXP, que as colocou em alta rotação em sua programação. E vendo as muitas apresentações ao vivo que a banda tem nos canais online, fica mais fácil entender o apelo de suas canções: o que soa repetitivo em estúdio se mostra cheio de camadas, e com uma energia bruta que não tira nada da proposta pop essencial ao som.
Pouco antes de vir ao Brasil para sua primeira turnê, a tecladista Nina Carrara conversou por e-mail com o Scream & Yell e contou um pouco do que vem acontecendo com a banda, e o que o público pode esperar nas apresentações em solo nacional.
A banda tem tocado em palcos cada vez maiores na América Latina. Porém, ainda há países – como o Brasil – onde a banda é menos conhecida. e por isso volta a tocar em palcos menores. Como é para você essa alternância que mistura a ascensão com o “retorno às raízes”?
Algo que nos diverte nessa viagem ao Brasil é que desde antes da pandemia não tocamos em um país onde não havíamos estado antes. Isso é bom, porque você vai sem expectativas, então qualquer reação que recebermos parecerá muito positiva.
O som da banda tinha um lado quase lo-fi no primeiro álbum. De alguma forma, esse espírito mais simples foi mantido, mas agora tanto a produção quanto os arranjos têm um lado mais sofisticado. Parece-me que é uma evolução um pouco natural, mas teria também a ver com o fato de vocês estarem fazendo shows para plateias maiores, que requerem um som mais “cheio”?
Acho que essa mudança não teve a ver com o tamanho dos palcos, mas sim com o fato de termos tocado tanto ao longo dos anos e pensado em como as novas músicas vão soar em nossos shows. Gostamos muito do que acontece em nossos shows, e às vezes é difícil não pensar em como uma música vai soar ao vivo ao produzi-la.
Las Ligas Menores ganhou popularidade tanto pelos seus shows quanto pelas redes sociais. No entanto, parece-me que a banda não sucumbiu à lógica das redes de “lançar conteúdo” – em três anos, foram cinco singles. Isso me faz pensar que a lógica de movimentar a banda ainda tem muito mais a ver com o artístico e criativo do que com o comercial, né?
De certa forma, não priorizamos apenas o artístico, mas também o pessoal, no sentido de produzirmos as músicas no ritmo em que elas surgem e tentarmos não nos sentirmos pressionados a lançar algo novo o tempo todo. É algo que nos permite ser uma banda independente, apesar de que às vezes nos sentimos em dívida com o público que nos ouve por não lançarmos tanto material.
Um desses singles foi a versão de “Vigilantes del Espejo”. A versão do Pixies (“Todo lo que Pienso Hoy”, versão de “All I Think About Now”) para o disco-tributo “Gigante”, também ficou conhecida. Esses covers parecem buscar um lado um pouco mais punk, mais festeiro da banda. Tocar músicas de outras pessoas é, portanto, uma diversão, mais do que uma homenagem?
É algo que nos diverte, sim, mas o estilo da versão depende mais do que tudo do que podemos pensar para que não seja exatamente igual ao original. Se estiverem em inglês, costumamos traduzi-los para o espanhol, como fizemos com a versão de Pixies ou a do Galaxie 500 (“Fotos”, que é uma versão de “Pictures”), que também fizemos. No caso dos “Vigilantes del Espejo”, foi um convite da própria banda [Triángulo del Amor Bizarro] para participar de um álbum de covers das músicas de seu último álbum, o que foi uma grande honra.
Vocês estão prestes a fazer sua primeira turnê pelo Brasil. Alguns contemporâneos e líderes do Las Ligas Menores já passaram por aqui antes, como Bestia Bebé (e que vai voltar nesse ano) e El Mató a Un Polícia Motorizado (que já esteve aqui várias vezes). Eles compartilharam algumas de suas experiências aqui com você? Ou pelo menos deram sugestões de como se divertir aqui? (risos)
Haha, nós realmente não perguntamos isso a eles, mas sabemos que eles se divertiram muito. Por outro lado, todos nós fomos de férias para o Brasil em algum momento, então conhecemos o país um pouquinho, e poder sair em turnê dessa vez é muito emocionante. Eles também nos disseram que existem algumas bandas das quais podemos gostar, então também estamos ansiosos para ouvi-las.
O último álbum saiu há cinco anos e era diferente do primeiro. Com o que tem saído desde então, tudo aponta para algo que também terá outra proposta. Então, como vocês estão pensando este novo álbum e quando ele será lançado?
Estamos gravando nosso terceiro álbum nestes meses. Todas as músicas já estão compostas, mas os arranjos precisam ser gravados. Vai seguir o caminho dos nossos últimos singles (“Hice Todo Mal”, “La Nieve” e “Piedra del Águila”), sim, porque gravamos no mesmo estúdio e com o mesmo produtor (Pipe Quintans). Nós vamos soltar mais algumas faixas, e esperamos que vocês gostem delas.
– Leonardo Vinhas é jornalista, escritor e produtor cultural. Colabora com o Scream & Yell desde 2000, onde também assina a coluna Conexão Latina. É também colaborador eventual dos sites Music Non Stop (Brasil) e Zona de Obras (Espanha).