entrevista por Marcela Güther
A brasiliense Raquel Campos nasceu em 1988, é poeta, ensaísta e professora de literatura. Atualmente, trabalha como editora na Relatar-se. Foi professora de Teoria Literária da UNESP (2021-2022) e co-organizou o livro “HC 21: leituras de Haroldo de Campos” (7Letras, 2021). Acadêmica, tem pós-doutorado em Estudos Literários pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR) e doutorado em Literatura pela Universidade de Brasília (UNB).
“Sad Trip” é seu primeiro livro. A obra mescla as atuais reflexões da vida adulta com uma linguagem divertida, repleta de construções poéticas, feitas com gírias e expressões coloquiais utilizadas por sua geração. A obra veio ao mundo por um convite de Natália Agra, poeta que junto Fabiano Calixto toca a editora independente Corsário Satã, e tem a orelha assinada pela tradutora, pesquisadora e também poeta Francesca Cricelli.
Alvaro Dutra, a quem o livro “Sad Trip” é dedicado, gravou um LP contendo cinco poemas de Raquel Campos musicados e o poeta, tradutor e crítico venezuelano Jesús Montoya traduziu onze poemas do livro de estreia de Raquel para a revista eletrônica de literatura Círculo de Poesía. Na conversa abaixo, Raquel fala sobre motivações, influencias literárias, inspirações e muito mais.
O que motivou a escrita do livro? Como foi o processo de escrita?
A escrita do livro se iniciou durante a quarentena, num período bastante difícil e de muita desilusão. O livro, de alguma forma, reflete esse isolamento através de uma análise poética introspectiva sobre momentos importantes da minha própria vida, como a mudança de Brasília (a cidade que eu morei durante toda a minha vida) para São Paulo e a sensação de derrota imposta pela pandemia. O processo de escrita se decorreu em aproximadamente um ano, quando senti que já havia selecionado os poemas para a publicação.
Quais são as suas principais influências literárias?
Poetas brasileiros, particularmente os concretistas de São Paulo, com quem convivi desde a minha infância através do contato pessoal e das leituras (sou neta do poeta Augusto de Campos). Além disso, desenvolvi durante a adolescência uma grande paixão pelo poeta Augusto dos Anjos e por outros como Fernando Pessoa e Cesário Verde. Atualmente, tenho estudado bastante poesia contemporânea, focando mais nas mulheres poetas, como Marília Garcia, Miriam Alves, Francesca Cricelli etc.
Que livros influenciaram diretamente a obra?
Acho que “Sad Trip” dialoga bastante com a obra poética do Paulo Leminski e da Hilda Hilst. São grandes influências que marcaram não só a escrita do livro, como também a minha produção como um todo. O livro “Sad Trip” é reflexo do seu tempo e inclui questões como a sexualidade feminina, a mudança de cidade e a frustração com os obstáculos mais dolorosos da vida, como a perda, o luto e a inadequação social.
Você escreve desde quando? Como começou a escrever?
Escrevo desde criança. Comento, na minha tese de doutorado, que um dos meus primeiros escritos foi um “poema concreto”, de 1994, quando eu tinha seis anos. Claro que ainda não havia nenhuma intenção formal no poema, apenas a sensação de liberdade de poder brincar com as palavras. Experimentei muitas formas diferentes de escrita poética durante a minha adolescência e comecei a publicar poemas online, há aproximadamente uma década. Em 2020, publiquei uma plaquete com “5 poemas” pela Galileu Edições e mais recentemente o livro “Sad Trip”.
Se você pudesse resumir os temas centrais do livro, quais seriam?
A sensação de vivenciar derrotas e frustrações durante a vida. Algumas impressões pessoais sobre a vida em Brasília e a vida em São Paulo. Homenagens aos poetas que me influenciaram, tais como Augusto de Campos, Haroldo de Campos e Décio Pignatari, além de alguns escritos sobre amor e sexualidade.
Por que escolher esses temas?
São temas que atravessam a minha vida adulta e que fazem parte da minha vida e poesia. São formas de enxergar o mundo poeticamente, com suas belezas e suas dores, tentando transformar isso em algo maior que eu e algo que possa dialogar com possíveis leitores, criando identificações com o outro a partir da minha própria experiência.
Como você definiria seu estilo de escrita?
Acredito que seja um estilo de escrita sintético, autobiográfico, misturando temas complexos com palavras simples, palavrões e gírias. Existe também uma complexidade e um trabalho com a linguagem poética, mas que procuro intercalar com momentos mais coloquiais. Talvez esta mistura seja o que mais caracterize o meu estilo de escrita.
Como é o seu processo de escrita?
Gosto de me dedicar com mais afinco à escrita de um livro, concentrando o máximo de esforço e tempo possível a essa atividade. No entanto, a escrita do Sad Trip ocorreu mais lentamente, durante o período de um ano, o que refletiu também a própria lentidão e a confusão temporal causadas pela longa quarentena que enfrentamos em 2020 e ainda em 2021.
Você tem algum ritual de preparação para a escrita? Tem alguma meta diária de escrita?
Não tenho nenhuma meta diária, gosto de contar com a indisciplina e o caos para me ajudar no processo criativo, rs.
Como foi a sua aproximação com a editora? Como foi o processo de edição?
Já conhecia o trabalho dos poetas Fabiano Calixto e Natália Agra, donos da editora Corsário-Satã. No entanto, a oportunidade de publicação de um livro foi um convite da própria Natália, o que me deixou muito surpresa e contente com a confiança. Sou uma grande admiradora de sua obra e da de Fabiano.
Quais são os seus projetos atuais de escrita? O que vem por aí?
Meu próximo livro de poemas se chamará “Meninas, eu vi” e será publicado pela editora Relatar-se no 1º semestre de 2023. O livro traz uma perspectiva feminista a respeito da sexualidade e prazer femininos.
– Marcela Güther é jornalista, produtora de conteúdo, assessora de imprensa e mediadora do Leia Mulheres.