texto por Paulo Pontes
fotos por Fernando Yokota
Às 16h30, ao passar em frente aos portões do Espaço Unimed, já era possível avistar um grupo significativo de fãs formando fila para o aguardado show de Liam Gallagher na capital paulista – a apresentação estava marcada apenas para às 21h30. Mas o grupo estava ali, firme e forte, se protegendo do sol intenso da forma como dava. Camisetas dos Beatles se misturavam às do Oasis, às de Liam e às do Manchester City (time de coração do vocalista).
À noite, já dentro da casa, o número de “uniformizados” só aumentava, e, às 21h30 (pontualidade britânica), após os telões mostrarem inúmeras imagens do vocalista intercaladas com adjetivos dados a Liam pelo próprio Liam (entre eles RNR Star, godlike, icon, legend e prophet — em sua bio do Twitter estão todos eles), o ex-Oasis entrou no palco com total apoio da torcida; uma torcida extremamente apaixonada, enlouquecida e pronta para contribuir com o time.
Mesmo com o calor intenso no interior do Espaço Unimed (Liam estava com uma já tradicional jaqueta parka que o acompanhou o show inteiro — e ainda teve uma faixa dedicada a ela), o público cantou, agitou, pulou, dançou e deu um show em vários momentos. Principalmente nas faixas do Oasis, o clima era de final de Champions League ou mesmo de Copa do Mundo (Liam chegou a decretar — ou será que estava “secando”? —, que o Brasil seria campeão do evento neste ano. Prophet?).
É claro que fica muito mais fácil contar com o apoio da torcida quando se entra em campo com a dupla “Morning Glory” e “Rock ‘n’ Roll Star” (como se fosse preciso mencionar, faixas presentes nos discos “(What’s The Story) Morning Glory”, de 1995, e “Definitely Maybe”, de 1994, segundo e primeiro álbuns lançados pelo Oasis, respectivamente). Como não poderia ser diferente, das 17 músicas, 10 foram retiradas da discografia do Oasis (quase um time completo)- no Lolla 2018, o máximo que ele “conseguiu” cantar foram 12.
Esperar uma grande presença de palco de Liam chega a ser ingenuidade. Como já era esperado, o vocalista deu poucos passos, ficou imóvel em vários momentos (mesmo quando estava “distante” do microfone) e manteve seu pandeiro meia-lua quase sempre em mãos (exceto quando decidiu presentear duas fãs com um par do instrumento). Ainda assim, é isso que os fãs sabem que vão ver no palco, é isso que eles querem e é isso que Liam entrega. À sua maneira, ele ainda é um ótimo frontman.
Na sequência, vieram duas da fase solo de Liam, “Wall of Glass”, do debute “As You Are” (2017), e “Everything’s Electric”, faixa coescrita com Dave Grohl (Foo Fighters) e que está presente no mais recente lançamento do britânico, o excelente “C’mon You Know” (2022). Posteriormente, o vocalista presenteou o público com uma trinca de músicas de sua antiga banda: “Stand by Me” (“Be Here Now” 1997), “Roll It Over” (“Standing on the Shoulder of Giants”, 2000) e “Slide Away” (do já mencionado álbum de estreia). A primeira levou, literalmente, alguns fãs às lágrimas.
A voz de Liam Gallagher está longe de ser a mesma de outrora (já tem um tempo), e isso ficou claro na faixa seguinte, a belíssima “More Power”, que é cadenciada e exige uma interpretação maior, com mais intensidade, para funcionar como deve. Felizmente, a faixa foi muito bem apoiada pelas duas backing vocals que fazem parte da ótima banda de apoio. De qualquer forma, também é nítida a melhora vocal de Liam em relação a alguns anos pré-pandemia.
Com tantos clássicos do Oasis e outras excelentes músicas da carreira solo (que tal “C’mon You Know”?) considero quase que injustificável a inserção de “Soul Love”, faixa presente no segundo e derradeiro álbum do Beady Eye, “BE” (2013), no setlist (circulou uma foto do setlist mostrando que a faixa entrou no lugar de “Better Days”, até então prevista para o show). Apesar de ter agradado uma parcela de fãs, foi um momento que serviu para deixar o bar do Espaço Unimed um pouco mais movimentado.
Uma das melhores músicas da carreira solo do vocalista, “Diamond in the Dark” (que poderia ser uma das faixas do disco “AM”, do Arctic Monkeys) foi a terceira e última do mais recente trabalho de Liam e precedeu duas de seu segundo disco (“Why Me? Why Not.”): “The River” e a balada “Once”.
O que o britânico trouxe a campo em seguida foi uma verdadeira seleção de clássicos do Oasis, intercalando faixas dos dois primeiros lançamentos da banda. Antes do bis rolou “Some Might Say”, “Supersonic” (o público foi a loucura) e “Wonderwall”, que Liam dedicou a dois jogadores brasileiros: Gabriel Jesus e o goleiro Ederson). Nesta última ele se deu ao luxo de deixar os fãs cantarem praticamente sozinhos cada refrão. A resposta, obviamente, foi excelente.
Ao final, os músicos deixaram o palco para retornarem aos gritos de “Olê, olê, olê, olê… Liam, Liam”. Ele dedicou a próxima faixa a sua… jaqueta (?!). Liam Gallagher sendo Liam Gallagher. O público nem se importou e cantou “Live Forever” em uníssono. De forma épica, o vocalista encerrou o show com “Champagne Supernova”, se despediu rapidamente e deixou um Espaço Unimed lotado feliz da vida. A torcida deixou o local com a sensação de ter contemplado uma partida que, ainda no apito inicial, já estava ganha. E foi de goleada.
– Paulo Pontes é colaborador do Whiplash, assina a Kontratak Kultural e escreve de rock, hard rock e metal no Scream & Yell. É autor do livro “A Arte de Narrar Vidas: histórias além dos biografados“.
– Fernando Yokota é fotógrafo de shows e de rua. Conheça seu trabalho: http://fernandoyokota.com.br/