texto por Renan Guerra
Christophe Honoré é um dos nomes mais importantes do cinema francês no século XXI e seu olhar sobre temas LGBTIA+ e diversidade sempre é algo a se ficar atento, é só lembrarmos do já clássico “Canções de Amor” (2007) ou o mais recente e muito belo “Conquistar, Amar e Viver Intensamente” (2018). Por isso mesmo, sessão lotada no CineSesc, em São Paulo, para conferir “Winter Boy” (“Le Lycéen”, no original em francês), seu novo longa e que é seu projeto mais pessoal e íntimo. O filme acompanha a vida do jovem Lucas (Paul Kircher), de 17 anos, que perde o pai de forma repentina e precisa lidar com esse luto ao lado da família.
Honoré perdeu seu pai na adolescência e considera que “Winter Boy” é um filme que precisava ser feito, e ele foi adiando, mas sentiu que esse era o momento ideal de realizá-lo. O diretor acredita que esse era um filme muito importante para que ele colocar na tela esses sentimentos, sensações e essas dores de um momento turbulento de sua vida. Nesse sentido, para ele eram mais importantes as sensações e as intenções em torno desses acontecimentos do que qualquer outra coisa, por isso ele trouxe a história para o nosso tempo atual e coloca suas experiências na perspectiva de um jovem moderno interpretado de forma divina por Paul Kircher.
Kircher é a espinha dorsal do filme, pois é ele quem nos leva por essa história complexa e nos seduz com sua força juvenil. Ao lado dele, temos a maravilhosa Juliette Binoche, como a mãe Isabelle, uma pequena ponta do próprio Honoré como o pai Claude e Vincent Lacoste como o irmão Quentin. Para completar esse elenco principal, há ainda a participação de Erwan Kepoa Falé como o melhor amigo de Quentin e uma presença que irá mexer com a cabecinha do jovem Lucas. Para ficar claro, a linha narrativa do filme é: Lucas estuda em um internato, lá ele tem um namorado, quando surge a notícia da morte de seu pai, ele fica algum tempo distante da escola e passa alguns dias em Paris, com o irmão e seu amigo.
É uma linha narrativa bastante simples, mas que ganha outros contornos dentro do roteiro de Honoré, contando com pequenas inserções em que o protagonista nos conta, olhando para câmera, algumas das passagens da história. Com um roteiro bem amarrado e que dá conta das complexidades da trama, “Winter Boy” ainda tem uma câmera que nunca para quieta, que capta de forma muito genuína essa tensão e confusão do filme, é como se ela fosse um jovem agitado assim como Lucas, com aquele furor juvenil de quem acha que entende o mundo e sabe de tudo. E talvez seja essa forma de filmar, esse olhar muito único que transforma o filme de Honoré em uma experiência extremamente pungente sobre luto, dor e solidão, mas também um filme extremamente moderno quando fala de sexualidade, liberdade juvenil e descobertas.
São duas horas de um filme que passeia com languidez pela tela e que não tem medo de se aprofundar em temas espinhosos, entendendo a dor, o sofrimento como sentimentos fundamentais na nossa existência e, por isso mesmo, os filma com a beleza e complexidade que eles merecem. Juliette Binoche é uma explosão em cena, conseguindo transmitir a dor de sua personagem em cada mínimo detalhe. E ao lado do jovem Paul Kircher, eles entregam alguns dos momentos mais belos do filme. Kircher, aliás, é um nome a se ficar de olho: maduro, seguro e com um olhar extremamente cativante, ele é uma figura que conversa com a câmera com uma naturalidade muito interessante.
Com a dose certa de beleza e melancolia, Christophe Honoré faz em “Winter Boy” um de seus filmes mais belos, conseguindo transmitir de forma única todo esse turbilhão que envolve o amadurecimento atrelado a dor da finitude da vida.
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– Renan Guerra é jornalista e escreve para o Scream & Yell desde 2014. Faz parte do Podcast Vamos Falar Sobre Música e colabora com o Monkeybuzz e a Revista Balaclava.