de Ismael Machado
Verificou se o nó estava bem apertado. Foi até o pequeno armário e escolheu o que seria mais adequado para aquele momento. Escolheu um chicote de tamanho mediano. Ele fez um comentário qualquer. Ela o mandou calar a boca. Não lhe dera autorização para falar nada.
Ele se desculpou. Não adiantou. As nádegas nuas, gordas e brancas receberam o primeiro golpe. Gemeu. Ela mandou ele agradecer. Ele obedeceu. Outros golpes vieram tornando a pele branca cada vez mais avermelhada.
A sessão durou quarenta e cinco minutos, ao fim dos quais ela recebeu o valor combinado e mais um extra. Ele costumava ser generoso nisso. Antes que ele saísse ela ordenou que ficasse de quatro e lambesse suas botas de couro. Ele sorriu, feliz em obedecer.
Sozinha no apartamento, consultou a agenda. Havia sido o último do dia. Pensou em pegar um cinema. Sem pressa, esquentou água para um chá, enquanto se despia lentamente da roupa de couro, da máscara e repousava os utensílios no lugar de sempre. No lugar do couro, pôs uma prosaica camiseta de algodão com a estampa da Mafalda.
Na playlist do Spotify Amy Winehouse inicia ‘You Know, I’m No Good’. O celular vibra.
– Oi mãe. Tudo bem?
– Ismael Machado é escritor, roteirista e diretor audiovisual. Publicou cinco livros e é ganhador de 12 prêmios jornalísticos. Roteirista dos longas documentários “Soldados do Araguaia” e “Na Fronteira do Fim do Mundo” e da série documental “Ubuntu, a partilha quilombola“.