entrevista por Marcelo Costa
Chamada de “Billie Holiday de garagem” por Chico Science, Stela Campos tem uma longa bagagem de serviços prestados ao indie brasileiro. Seja em São Paulo, liderando a banda Lara Hanouska ou integrando a cult Funziona Senza Vapore, grupo formado por Cadão Volpato e outros membros remanescentes do Fellini (do qual Chico Science “emprestou” a músíca “Criança de Domingo”), ou Recife, tocando em projetos com as bandas Eddie, Devotos, Chico Science & Nação Zumbi e com Siba (Mestre Ambrósio), participando de coletâneas como “Baião de Viramundo” (2000) e “Reiginaldo Rossi” (1998) ou cantando a música tema da trilha do longa “Baile Perfumado” (1996), de Lírio Ferreira e Paulo Caldas, ou principalmente numa carreira solo deliciosamente inquieta, é um retrato de inteligência da música (im)popular brasileira.
Érico Theobaldo é produtor musical, compositor, dj e músico paulistano que circula por universos distintos como música eletrônica, teatro, hip hop e cinema. Assinou a trilha dos filmes “Natimorto” (Paulo Machline, 2009) e “Sueño Florianópolis” (Ana Katz, 2018) e, em parceria com Beto Villares, produziu e compôs para as séries, “Antônia”, “13 Dias Longe do Sol” (Fernando Moura, 2017-18), “Bandidos na TV” (Netflix, 2018), “Irmãos Freitas” (Sérgio Machado, 2019) e para os filmes “Bingo, o Rei das Manhãs” (Daniel Rezende, 2017) e “Malasartes” (Paulo Morelli, 2017). Entre suas produções musicais temos o hit “Telegrama”, de Zeca Baleiro, e o álbum “Antigamente Quilombos, Hoje Periferia” (2002), do Z’áfrica Brasil, além de remixes para Otto, Luisa Maita, Stela Campos e Tiê.
Juntos, Stela Campos e Érico Theobaldo carregam uma história musical de 20 anos: ele participou da banda de Stela para o lançamento do disco “Fim de Semana” (2002). Em 2015, voltaram a trabalhar juntos quando Érico idealizou e produziu o disco “Dumbo Reloaded”, com remixes das faixas do disco “Dumbo”, lançado por Stela em 2013. E agora retomam a colaboração com um single duplo: “Never Enough” é tema de abertura da primeira série de suspense produzida pela HBO no Brasil, “Vale dos Esquecidos”, que estreia em 25 de setembro. Já “Changing”, que aparece na série em versão instrumental, traz os dois cantando juntos numa colaboração que renderá um album em parceria para 2023. Abaixo, Stela conta como foi compor para a trilha de “Vale dos Esquecidos” e fala sobre a parceria com Érico.
“Never Enough” é tema de abertura da primeira série de suspense produzida pela HBO no Brasil, “Vale dos Esquecidos”. Conta um pouco sobre essa faixa! Como vocês pensaram essa música para a série?
Na verdade, foi uma conjunção de ideias musicais inesperadas. O Érico Theobaldo, com quem já trabalhei em vários projetos musicais, como o disco de remix “Dumbo Reloaded” (2015), estava começando a produzir a trilha quando me chamou para colaborar em uma faixa para uma das cenas. Quando eu assisti, logo lembrei de “Never Enough”, que eu tinha acabado de compor durante a pandemia. Eu tinha várias músicas que tinha começado a fazer à moda antiga para mim, no meu laptop, sem banda, gravando instrumentos e editando, nos últimos dois anos. Quando o Érico ouviu, ele achou que tinha tudo a ver com o clima da série, até a letra combinava. Uma das coisas que chamou atenção foi o harmonium, instrumento de fole indiano, que dava uma estranheza e ficava legal com o tema de névoa e mistério da série. Então, o Érico pegou a faixa, criou beats com tambores, outras texturas de teclado, foi criando camadas e trabalhou na versão que entrou na série. Os diretores, Daniel Lieff e Fabio Mendonça e os outros produtores da trilha com o Érico, o Beto Vilares e Remi Chatain, gostaram e ela primeiro foi incluída na trilha, até que decidiram que seria tema de abertura. Eu e o Érico gravamos vários improvisos com o harmonium, que acabaram sendo usados em várias cenas. Daí entrou também na trilha “Hunter in Love”, música que tinha lançado em parceria com o Érico e Pedro Angeli (2020) e “Take your Time”, que saiu no meu último disco “Stela Campos” (2018), que regravei em uma nova versão para a série feita pelos Copans, projeto do Érico com Roger Menn.
“Never Enough” chega acompanhada de “Changing”, e aqui cabe uma brincadeira das “antigas”: é um duplo A side, ou “Changing” é um lado b de “Never Enough”? Essa também está na trilha, certo?
Quando o Érico estava compondo a trilha, ele me chamou para ver uma outra cena e ouvir uma música que ele estava compondo. Acabei trabalhando junto com ele na melodia e compus uma letra. Gravamos juntos e pela primeira vez ele cantou junto comigo. Um dueto que ficou muito legal. No fim, a música cantada acabou não entrando na série, entrou a versão instrumental. Mas gostamos tanto do resultado que decidimos lançar no single duplo. Ela é bem intimista, é diferente de “Never Enough”, mas também tem um clima etéreo, camadas sonoras, combina. Sim, se fosse um compacto de vinil, seria o lado B (risos).
O que vem mais por aí? Podemos esperar um álbum Stela/Érico?
Nessa aproximação para compor todas essas músicas da trilha da série, começamos a conversar sobre fazermos um álbum juntos. Vimos como as ideias musicais fluem rápido entre a gente. Eu já tenho algumas músicas que compus nesse período de pandemia que pensamos em trabalhar nelas juntos e incluir outras que esboçamos na trilha e não usamos e também criar outras novas. Nossa ideia é lançar em 2023. A gente costuma trabalhar rápido juntos, vamos conseguir!
– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne.