Ao vivo: Afiado, eliminadorzinho promove noite de amor ao barulho em São Paulo

texto por Renan Guerra
foto de Diogo Burilio
vídeo de Trabalho Sujo

O trio paulistano eliminadorzinho lançou no ano passado o ótimo “Rock Jr.”, seu disco de estreia – aqui no Scream & Yell eles apresentaram um faixa a faixa do disco na época do lançamento. Gabriel Eliott (voz e guitarra), João Pedro Haddad (baixo) e Tiago Souto Schützer (bateria) tem uma boa estrada nos palcos antes mesmo do disco de estreia, com shows intensos e uma atividade constante no cenário independente. Nessa semana seu primeiro ep, “nada mais restará”, de 2016, completou 6 anos de lançamento e essa data caiu bem no dia em que a banda se apresentaria no Centro da Terra, teatro localizado em Perdizes, zona oeste de São Paulo.

De pegada punk, o show da eliminadorzinho é uma lufada barulhenta de energia, por isso é curioso pensar na banda nesse espaço de teatro. O Centro da Terra fica localizado no subsolo de um prédio no alto de Perdizes, após você entrar no térreo, se desce diversos lances de escada, até que se chega lá embaixo – entendeu o trocadilho do nome do espaço? Nessa noite, enquanto o público se acomodava nas poltronas, um som constante que parecia uma interferência impregnava o ambiente, mantendo-se até a entrada da banda no palco. Esse “barulho” inicial já fazia parte de toda a mise-en-scène que os meninos prepararam para essa noite.

Intitulado de “666 canções de amor”, o show contava com uma tabuleta no canto do palco, com a numeração “666” em folhas de ofício. Cainan Willy, do selo Cavaca Records, fazia as vezes de auxiliar para a retirada de cada folha ao passar das canções. Para abrir, os três integrantes entram, sentam-se em banquinhos e tocam uma canção inédita, apenas com baixo, guitarra e violão. Dizendo assim, tudo parece muito formal, sério e conceitual, não é? Mas ao vivo isso tem um tom de galhofa, um bom humor sagaz e inteligente, que ganha mais força quando o trio abandona o banquinho-e-violão e se volta para a formatação usual da banda, com baixo-guitarra-bateria, e já manda muito barulho, um atrás do outro.

O início do show foi marcado por canções inéditas que funcionaram de forma muito boa nesse formato de teatro, com o público sentadinho. Enérgicas e barulhentas, as canções ecoavam algo entre o punk e o shoegaze, remetendo a nomes como Sonic Youth, Yo La Tengo e outras bandas que alternam entre o silêncio e as grandes distorções. Esse primeiro bloco das “666 canções de amor” funcionou como um processo aberto, em que o público pode assistir essas novas experimentações da banda como um processo de criação mesmo.

O caminho do show seria como rebobinar uma fita. Depois das canções inéditas, eles mergulharam nas faixas do “Rock Jr.”. Curtas e velozes, essas canções fizeram o público se movimentar nas cadeiras, é como se elas pedissem para que a gente pulasse ou se chacoalhasse ao nosso modo, sem muitas regras. “Eu só preciso de um tempo”, “Pompeia” e “Baixo Astral”, por exemplo, são canções que provam a versatilidade da banda em cena, entre a barulheira e o pop, criando canções que evocam o punk, mas que grudam na cabeça como chiclete.

Depois disso, o tempo voltou mais e a eliminadorzinho tocou na íntegra o ep “nada mais restará”, como forma de celebrar os seis anos de seu lançamento. São canções de uma quase outra banda, considerando o tempo e a evolução do trio. De todo modo, é muito interessante como a vibe lânguida e mais melancólica dessas canções lá do início ganha em barulho e energia ao vivo, especialmente por causa do entrosamento da banda no palco, numa formação bem amarrada e coesa.

Considerando o tempo e a impossibilidade de se cantar 666 canções numa noite, a banda mandou uma espécie de medley barulhento em que as canções ficaram mais curtas e tocadas em ritmo veloz. Barulho e bom humor: uma boa dupla pra fechar a noite e mostrar a versatilidade da eliminadorzinho no palco. É muito interessante pensar em como eles passeiam de um show de rock desses pra se debater na plateia com a possibilidade de um show inventivo num palco mais sisudo como o de um teatro, isso tudo, claro, sem soar cabeçudo ou forçadamente experimental, ums brincadeira entre a galhofa e a virtuose sonora que soa natural.

Se você ainda não ouviu, a dica é voltar e dar o play em “Rock Jr.”. E, quando possível, vê-los ao vivo! É uma energia única, daquelas que o rock ainda pode nos proporcionar, porém sem nenhuma pretensão, nenhum grande arroubo de “salvar o rock”, apenas as boas intenções de se fazer um bom barulho ao lado de gente boa e sincera.

– Marcelo Costa (@screamyell) edita o Scream & Yell desde 2000 e assina a Calmantes com Champagne. A foto que abre o texto é de Yasmin Kalaf / Divulgação

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