Cinema: “Meu álbum de amores”, de Rafael Gomes, é uma deliciosa comédia romântica sobre amor e música

texto de Renan Guerra

Júlio (Gabriel Leone) estava com planos de morar junto da sua namorada, porém ele toma um pé na bunda enquanto os dois visitam “o decorado”, isto é, aquele apartamento modelo que as imobiliárias adoravam vender hoje em dia. A situação já muda a vida de Júlio de cabeça pra baixo, porém sem ter nem tempo para a fossa, ele já descobre uma informação que irá bagunçar tudo ainda mais: seu pai biológico foi um famoso cantor popular na década de 70 e, após seu falecimento, deixou para ele uma herança, além da descoberta de um novo irmão, Felipe (Felipe Frazão).

Entre a desilusão amorosa e o novo cenário familiar, Júlio e o irmão decidem voltar no passado do pai e reencontrar antigos amores do cantor Odilon Ricardo (interpretado também por Leone). É nesse passeio pelas paixões, pelas canções e pelos mistérios do coração que o filme “Meu álbum de amores”, de Rafael Gomes, passeia. Como que numa viagem musical, o filme nos conquista por sua leveza, pela forma simples e delicada com que nos envolve nos amores de Júlio, Felipe e todos os outros personagens que cruzam o caminho deles, tudo com o sabor de uma boa comédia romântica.

Resumindo a história pelo olhar de Júlio, Felipe e Odilon, como nos dois primeiros parágrafos acima, faz até parecer que esse é um filme sobre homens, mas são as mulheres as personagens fundamentais nesse desenrolar da história. As mulheres que cercam Júlio: sua ex-namorada Alice (Carla Salle), sua mãe Maria Helena (Maria Luísa Mendonça), sua melhor amiga Fabiana (Olívia Torres) e seus encontros e desencontros com Laura (Mayara Constantino); bem como as mulheres que formaram a vida de Odilon Ricardo, representadas em participações especiais de luxo: Clarisse Abujamra, Regina Braga, Cleide Queiroz e Laila Garin.

Tudo em “Meu álbum de amores” é conectado pela música, seja a relação dos personagens em si com a música quanto com as inserções de números musicais do passado de Odilon Ricardo. Essas tais antigas canções populares foram criadas especialmente para o filme por Arnaldo Antunes e Odair José, em uma trilha que é completada pela direção musical de Marcus Preto e Pupillo (Nação Zumbi). Esse casamento entre comédia romântica e musical só é possível pelo roteiro bem amarrado de Vinicius Calderoni, Rafael Gomes e Luna Grimberg, que consegue ir e vir no tempo criando envolvimento do espectador, que torce e se emociona com os encontros e as desilusões na tela.

Conhecido por muitos pelo curta “Tapa na Pantera” (2006), que virou hit no YouTube, Rafael Gomes tem como uma espécie de marca de seus primeiros longa-mentragens essa relação entre amor e música. “45 dias sem você” (2018) e “Músicas para morrer de amor” (2019) são como filmes que cohabitam os mesmos universos pós-modernos de romance, solidão, medo e fúria que uma paixão pode conter – tudo embalado por canções clássicas da MPB e hits perdidos do nosso indie nacional.

“Meu álbum de amores” pode quase fechar uma espécie de trilogia desses amores musicais de Gomes, e é curioso que alguns atores aparecem nos três filmes: Ícaro Silva, Rafael de Bona e Mayara Constantino. Mayara, aliás, é uma parceira constante de Gomes, como aquelas atrizes sempre presentes nos filmes de Almodóvar, sabe? Mayara Constantino aparece nos três filmes citados, encenou ao lado do diretor o espetáculo “Música para cortar os pulsos” e, ainda lá em 2009, foi a protagonista da série juvenil “Tudo o Que é Sólido Pode Derreter”, produzida para a TV Cultura. E essa parceria tem motivo: o texto de Rafael ganha uma naturalidade e uma verdade saborosas na atuação de Mayara – qualidade aqui também sobressaltada na atuação de Gabriel Leone e Felipe Frazão, que se mostram soltos em meio ao texto e sustentam de forma cativante essa irmandade improvável.

Chegando agora aos cinemas brasileiros, “Meu álbum de amores” cativa através de seu elenco bem entrosado e de sua narrativa leve, que nos leva a flanar por amores, sonhos e pequenas alegrias. No final das contas, é um filme aconchegante para apaixonados e para os fãs de uma boa comédia romântica.

– Renan Guerra é jornalista e escreve para o Scream & Yell desde 2014. Faz parte do Podcast Vamos Falar Sobre Música e colabora com o Monkeybuzz e a Revista Balaclava

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