texto por Bruno Lisboa
fotos de Flávio Charchar
Há 30 anos atrás, o manguebeat entrava para a história na cultura brasileira com impactos que ressoam até hoje. Criado em Recife, o movimento uniu estéticas globais (rock e hip hop) e regionais (maracatu, samba, coco) num mesmo balaio abrindo um caminho importante para que sua cultura local se impusesse sem necessidade de se adaptar (e se calar) ao cenário nacional inserindo a capital pernambucana no mapa da nova música brasileira e mundial.
Acertadamente, o legado desse período vem sendo celebrado em 2022 através de iniciativas como o projeto MangueFonia, show especial que reúne integrantes da Nação Zumbi, Mundo Livre S/A, Devotos e Eddie mais Otto e Siba, entre outros, e o documentário “Manguebit” (2022), de Jura Capela, que exibe os anos de ouro do movimento através de entrevistas com figuras centrais do movimento (e foi o grande vencedor do festival de documentários In-Edit Brasil 2022).
A abertura ficou a cargo do Mombojó que aproveitou a ocasião para celebrar 20 anos de estrada, conciliando hits como “Papapa” (do disco “Amigo do Tempo”, 2010) e “O Mais Vendido” (do álbum “Homem-Espuma”, 2006) com novas faixas como “Nunca Vai Embora”, presente no trabalho mais recente, a trilha do filme “Deságua”, lançada em 2020.
Entre uma canção e outra, Felipe S (que além da banda segue ativo em sua carreira solo) falou sobre a honra de dividir o palco com seus heróis locais e contou sobre os perrengues da apresentação que quase não aconteceu em virtude do baterista Vicente Machado ter testado positivo para Covid – ele foi substituído pelo empresário do grupo, que atendeu plenamente as expectativas. “Deixe-se Acreditar”, clássico do álbum de estreia “Nadadenovo” (2004), colocou ponto final numa apresentação pulsante e coesa.
Já a Mundo Livre S/A veio a BH divulgar o seu álbum mais recente, “Walking Dead Folia (Sorria, Você Teve Alta)”, álbum – lançado em janeiro de 2022 – em que o líder Fred 04 reforça sua verve de cronista contemporâneo mesclando seu texto afiado com sonoridades que vão do samba ao rock com pitadas eletrônicas, características que, aliás, definem o trabalho do grupo recifense.
As ótimas “Baile Infectado”, “Fake Milho”, “Necropolitano” e “Blue Gin e os Seres (de Vidro)” foram algumas das novas faixas que conviveram em plena harmonia ao lado de hinos como “Meu Esquema” (momento mais festejado da noite), “A Bola do Jogo” e “Bolo de Ameixa”, executada numa versão mais pesada e acelerada. Durante a apresentação Fred 04 trouxe à tona detalhes de gravação do novo disco, retribuiu os elogios aos seus conterrâneos e agradeceu a oportunidade de estar de volta em BH após 4 anos da última apresentação na cidade.
No bis, a sequência matadora iniciada por “Édipo, o Homem Que Virou Veículo”, passando por “O Mistério do Samba” e finalizada por “Livre Iniciativa” (com o Mombojó junto no palco) encerrou os trabalhos de uma noite memorável que colocou em voga o legado de gerações distintas, mas que, felizmente, seguem fazendo barulho dos bons. Que façam durante muito tempo.
– Bruno Lisboa escreve no Scream & Yell desde 2014.