texto por Marcelo Costa
fotos por Fernando Yokota
Joss Stone lançou seu primeiro disco quando tinha 16 anos em 2003 e… vendeu 6 milhões de cópias. O segundo, no ano seguinte, vendeu ainda mais. Agora, aos 35, segue na estrada carregando a filhota Violet, de 1 ano e 4 meses, a tiracolo (quem teve oportunidade de acompanhar os stories da artista em São Paulo pôde sorrir com a fofura das duas) e o segundo filho na barriga – o elegante vestido dourado que escolheu para a apresentação paulista marcava a barriguinha de grávida chamando a atenção tanto quanto seu cabelo a lá Marylin Monroe e, claro, seu vozeirão e, principalmente, sua simpatia, numa deliciosa aula que combinava tanto as disciplinas de técnica vocal quanto de domínio de público.
A escocesa KT Tunstall iria abrir a noite no Espaço Unimed (ex-Espaço das Américas), mas não acordou bem na segunda-feira e precisou cancelar sua vinda ao Brasil. Escalada de última hora e anunciada pela produção na véspera, a brasileira Céu trouxe uma versão compacta de seu novo show para o palco e acompanhada do maridão Pupillo Oliveira na bateria, de Lucas Martins no baixo e de Leo Mendes nas seis cordas, fez uma apresentação enxuta e deliciosa combinando covers de Rita Lee (“Chega Mais”) e Grupo Revelação (“Deixa Acontecer”) com hits próprios do quilate de “Coreto”, “Perfume do Invisivel”, “Minhas Bics” e “Malemolência”.
Se o público para ver Céu já era bom, a casa – no formato pista vip com cadeiras elevadas ao fundo mais mezanino – encheu nos minutos que antecederam a entrada de Joss Stone no palco, totalizando 4 mil pessoas. Impressionada, Joss pisou no palco (descalça – como sempre – sob os tapetes que tomavam todo o ambiente) feliz e visivelmente agradecida pela presença massiva de fãs – um sentimento que ela iria compartilhar com os presentes em vários momentos da noite. “Free Me”, single de seu quarto álbum, “Colour Me Free” (2009), abriu a noite entregando um som cheio, cristalino e excelente (num local que não prima por isso) além de uma bela iluminação, duas caracteristicas presentes do início ao fim da noite.
Acompanhada de uma banda eficiente (baixo, guitarra, bateria, teclados e dois backings), Joss fez um passeio por sua discografia tocando ao menos uma canção de cada um de seus oito discos (num repertório de 15 canções – duas delas, medleys). Do disco novo, lançado em fevereiro, ela mostrou a faixa título, “Never Forget my Love”, perguntando ao final se alguém ali já tinha ouvido o álbum, e celebrando ante a resposta positiva da audiência no gargarejo. “Big Ol’ Game”, de seu terceiro álbum, “Introducing Joss Stone” (2007), surgiu num arranjo suave e dançante permitindo ainda que Joss convidasse o público a sussurar com ela – no que, claro, foi atendida.
Conversando sempre com o público, seja no meio das canções, e principalmente entre elas, Joss trocou a água que bebia no começo da noite pelo chá inglês e foi trazendo a audiência para perto de si, mudando o set list fixado no chão a todo momento. “Oh To Be Loved by You”, outra nova, veio na sequência, seguida do primeiro grande momento do show, a dobradinha “Tell Me What We’re Gonna Do Now / Turn Your Lights Down Low”, em versão mais densa e guitarreira – se o público já não estivesse nas mãos dela, essa seria a hora para beijar seus pés. Na sequência, o reggaezinho “Harry’s Symphony Dub” a levou a cantar ao lado do casal de backings vocals.
Ausente do set list, mas pedida insistentemente pelo público, “Teardrops” foi inclusa na noite, mas com uma advertência: “Não sei se me lembro da letra, mas vamos tentar. Se não der certo, não aconteceu tudo bem, faz parte da vida”. Com o auxílio dos fãs, ela relembrou a letra e o número vira outro dos grandes momentos da noite. Mas o páreo seria duro, já que “Karma” (do álbum “LP1”, de 2011) viria forte e elevaria os ânimos ainda mais (dentro do palco e na plateia) a ponto de Joss, ao final, questionar: “Uau, o que fazer depois disso??? Talvez ir pra casa???”. Que nada. O público pede “The Love We Had”, ausente do set, e ela canta um trecho a capella.
Para a parte final da apresentação, ela começa a brincar olhando o set list no chão: “Ok, essa daqui vocês não precisam… e essa também não”. E então entrega o mega hit “Super Duper Love”, para alegria da audiência, com direito a break para o público cantar junto os “yeah yeah yeah” e o refrão. No fim do número, agradecida, ela aplaude o público e se curva em sinal de reverencia. O medley “Midnight Train to Georgia / I Say a Little Prayer / It’s a Man’s Man’s Man’s World” encerra a primeira parte do set, e ela sai rapidamente do palco após, praticamente, uma hora redonda de apresentação (o show começou com 20 minutos de atraso, às 21h50).
Quase 10 minutos depois, após insistentes (mas não tão altos) pedidos de bis, a banda retorna e Joss pisa seu tapete rindo. “Uma mais?”, ela provoca. “You Had Me” surge numa versão acelerada e corpulenta, para delírio dos presentes. Joss, então, pisa no freio com “Music”, que aparece numa versão bluezy com um crescendo matador. Para passar a régua na noite, “Right To Be Wrong” em 10 minutos impecáveis e com um break no meio que permitiu ao público declarar seu amor entoando “We Love You”: com as mãos no rosto, meio que sem acreditar, ela era toda sorrisos. “How do I say it back?”, ela pergunta. E ela mesma responde em português: “Te amo?”. Ainda deu tempo de, no melhor estilo Roberto Carlos, arremessar flores (girassóis) para a plateia…
Em sua (inexplicavelmente) única apresentação no Brasil em 2022, Joss Stone deu aula de carisma, simpatia, técnica vocal e domínio de público. A sensação é de que, ao contrário de muitos artistas cujo palco parece uma obrigação extenuante, o tablado poderia ser sua casa, e não seria estranho se no futuro ela desenhasse um espaço ali com lugar para um berço, um sofá, uma cama, com quadros, posteres e plantas, e o dividisse com seu público, porque a sensação após 90 minutos de show é de ser recebido pela artista em sua casa, ser enlevado no universo maravilhoso da música e, ao final, ainda receber um “obrigado pela visita” da anfitriã. Não é toda noite que isso acontece num show. Não mesmo.
– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne.
– Fernando Yokota é fotógrafo de shows e de rua. Conheça seu trabalho: http://fernandoyokota.com.br/