por Marcelo Costa
Abrindo uma série de cinco New England IPAs, estilo surgido na segunda metade dos anos 10 na Nova Inglaterra, nos EUA, região que abriga os estados de Vermont, Connecticut, Maine, Massachusetts, New Hampshire e Rhode Island, cujo resultado é uma resposta às cervejas amargas da costa oeste americana (as West Coast IPAs), que revolucionaram o mercado cervejeiro nos anos 90. OAu seja, em uma New England IPA, o perfil de amargor será bem mais baixo, a textura exibirá uma suavidade ausente na West Coast (muito pela utilização de aveia na receita), a coloração normalmente tenderá ao amarelo turvo, como se fosse um suco concentrado, e muito aroma de frutas, contando ainda com a utilização de leveduras que consomem menos açucares. O benchmarking do estilo é a norte-americana Heady Topper, da The Alchemist, cerveja lendária e disputadíssima no mercado geek cervejeiro. No Brasil, a Trilha, de São Paulo, se especializou em produzir ótimas Juicy IPAs.
Para abrir a série, de Curitiba, surge a Bodebrown Mago de Houblon, que combina lupulina Mosaic, mais os lúpulos Amarillo, Citra e Simcoe com balanço dos maltes Pilsen, Munich, Carapils e trigo. De coloração amarela puxando para o dourado, turva, mas não como uma NE clássica, a Bodebrown Mago de Houblon apresenta um creme branco de excelente formação e retenção. No nariz, doçura açucarada de frutas maduras em destaque (abacaxi, maracujá e laranja) com leve percepção herbal (pinho) e floral. Na boca, doçura açucarada intensa no primeiro toque abrindo para um conjunto com muita fruta madura, tendendo principalmente a abacaxi e pêssego, mas com maracujá e laranja também presentes. O amargor é limpo, 50 IBUs agradáveis que soam 30. Já a textura é suave e cremosa. Dai pra frente, uma American IPA bem doce (mas sem nada de caramelo), levemente amarga e muito frutada, mas pouco NE. No final, abacaxi bem doce e amargor bem leve. No retrogosto, doçura.
De Curitiba para São Paulo com a escola de NEs da Trilha Cervejaria, que não tem surpreendido muito em seu clube Ultrafresco mensal (com cervejas enlatadas e enviadas mega frescas aos associados), mas sem traz cervejas interessantes. Um dos destaques do 4Pack do clube no mês de setembro de 2000 foi a Kolapso, uma Juicy Rye IPA com acréscimo de centeio e três variedades de lúpulos: Citra, El Dorado e Sabro. De coloração amarela, juicy tal qual um suco concentrado, e creme branco de ótima formação e retenção. No aroma, frutado intenso sugestionando manga e pêssego além de leve picância, floral sutil e doçura média. Na boca, uma explosão frutada com muita manga no primeiro toque, leve pêssego e laranja na sequencia, picância sutil, doçura e amargor médio (na casa dos 40 IBUs). A textura é suave e levemente picante. Dai pra frente, uma NE Rye IPA exemplar, saborosa, com tudo no lugar. No final, manga e amargor leve. No retrogosto, mamão.
Do São Paulo para Porto Alegre com a primeira da cervejaria Devaneio do Velhaco por aqui. A primeira é a Algemas Biológicas, uma Juicy IPA que combina malte Pilsen, trigo e aveia em flocos com os lúpulos Nelson Sauvin, Hallertau Blanc e Ella. De coloração amarela, turva, juicy tal qual um suco, e com creme branco de boa formação e retenção, a Devaneio do Velhaco Algemas Biológicas apresenta um aroma adocicado e frutado, remetendo a pera, uva verde, maçã verde e goiaba branca. Na boca, um suco de frutas (com pera, pêssego e damasco) no primeiro toque seguido de conforto frutado, leve picância e amargor aconchegante (41 IBUs). A textura é suave, como se espera do estilo, e, dai pra frente, temos uma New England IPA com tudo que se espera de uma Juicy, sem tirar nem por. Há aqui mamão, pêssego, pera e um tracinho resinoso bem discreto, e aceitável. No final, mamão papaya, No retrogosto, doçura, mamão e pêssego.
De volta ao Sudeste, desta vez em Itupeva, interior de São Paulo, casa da Startup Brewing, responsável pela linha UX, que, após passar por aqui com a Double Quarentine #2.5, retorna ao site com a Double Quarentine #3.0, que aposta na combinação dos lúpulos Warrior, Amarillo, Citra, Yellow Sub e Galaxy. De belíssima coloração amarela turva, juicy tal qual um suco, e creme branco de ótima formação e retenção, a UX Double Quarentine #3.0 apresenta um aroma que traz frutas amarelas leves aliadas a um discreto toque resinoso, nada excessivo ou exagerado. Na boca, frutado cítrico (frutas amarelas) leve no primeiro toque e na sequencia, sem muito aprofundamento, mas com muito punch, seguido de um resinoso quase imperceptível. Não há percepção acentuada de amargor e a textura é suave, como pede o estilo. Dai pra frente, uma Double NE correta, deliciosa, mas que poderia ser mais profunda nas frutas. No final, frutado sutil e leve álcool (7.7%). No retrogosto, picância leve e frutado.
A próxima New England IPA é da Mafiosa, de Valinhos, no interior de São Paulo, a Tarantula’s Juice, terceira NE da linha Password da cervejaria, que destaca aqui a combinação dos lúpulos El Dorado e Ekuanot. De coloração amarela, levemente turva, com creme branco espesso de ótima formação e retenção. No nariz, uma pancada de frutas com manga sutil se sobressaindo e um herbal ainda mais discreto marcando presença. Na boca, frutado no primeiro toque (sem muita definição) e levemente puxando para manga e também limão na sequencia, além de leve remissão a toranja. O amargor é equilibradíssimo, na casa dos 40 IBUs, e a textura é suavezinha. Dai pra frente, uma New England IPA caprichada, com bastante sugestão frutada (manga, limão e toranja), maciez na medida e conjunto bacana. No final, toranja e limão. No retrogosto, toranja.
De Valinhos para Natal, no Rio Grande do Norte, casa da HopMundi, que produziu a receita dessa Double NE (com adição de abacaxi e coco e uso dos lúpulos Sabro e BRU1) na fábrica da Startup Brewing, em Itupeva, no interior de São Paulo. A ideia dos caras com a Paradise Cove, nome de uma badalada praia californiana, era replicar o drink Pina Colada. De coloração amarela turva, juicy tal qual um suco, e creme branco espesso (lembrando milk-shake IPA) de ótima formação e retenção, a HopMundi Paradise Cove exibe um aroma com muita sugestão de coco em destaque, e o abacaxi logo ali, mais abaixo. Na boca, doçura no primeiro toque (menos intensa do que no drink) atropelada por coco, que deixa o abacaxi de lado e assume o protagonismo na receita, que ainda deixa escapar uma leve picância alcóolica (8.2%), que não incomoda, e um amargor bem equilibrado pros 50 IBUs que a casa entrega. A textura é suave e levemente picante. Dai pra frente, uma NE Pina Colada não tão doce, com mais coco do que abacaxi, e deliciosa. No final, coco e amargor leve. No retrogosto, praia.
Do Rio Grande do Norte para Santos, na baixista santista, ainda que essa também seja uma receita da Everbrew produzida na fábrica da Startup Brewing, em Itupeva, no interior de São Paulo, a Maine Berry Gelato é a versão da Everbrew Maine (muito lúpulo Citra) com adição de terpenos, óleo de plantas de aromas especiais. De coloração amarela turva, juicy tal qual um suco, e creme branco espesso de ótima formação e retenção, a Everbrew Maine Berry Gelato apresenta um aroma incrível, com notas que remetem a limonada suíça com leve manjericão. Na boca, limão siciliano envolvido em baunilha sutil no primeiro toque abrindo para um conjunto que reforça a sugestão de limonada suíça mais manjericão bem sutil. Os 60 IBUs são bem equilibrados soando 30. Já a textura é cremosa. Dai pra frente, uma New England IPA diferenciada, com uma pegada cítrica e herbal incrível, combinando notas de limão, manjericão e baunilha de maneira soberba. No final, herbal e amargor suaves. No retrogosto, cítrico envolvente. Uou!
De Santos para a capital paulista, casa da Molinarius, que produz suas receitas na fábrica da Mea Culpa, em Cotia, com a OverCitra, uma receita colaborativa do cervejeiro Sérgio Muller com o EAP – Empório Alto dos Pinheiros, produzida para o 11º aniversário da casa, e inclusa posteriormente na linha Hoppinnes, da Molinarius. De coloração amarela, turva, juicy tal qual um suco de laranja, com creme branco de ótima formação e longa retenção, a Molinarius OverCitra apresenta um aroma que é uma pancada de frutas cítricas, com toranja em destaque, mas também laranja, maracujá e manga. Na boca, frutado cítrico intenso (puxado para toranja) no primeiro toque abrindo acompanhado de doçura leve e amargor sutil, 36 IBUs que acompanharam o bebedor daqui em diante (e até parecem uns 60) em meio a toranja, maracujá e laranja. A textura é cremosa, suave e levemente picante. Dai pra frente, uma NE exemplar, cuja receita tira tudo de melhor de um lúpulo clássico, o Citra. No final, toranja e amargor. No retrogosto, amargor mais prolongado e toranja.
Da capital paulista para Salvador, na Bahia, ainda que a Mindubier faça a produção de sua cerveja em Varzea Paulista, na Cervejaria Dádiva, interior de São Paulo, com a MinduHHHaze, uma Double New England IPA com triplo dry hopping dos lúpulos made in USA Citra, Mosaic e Simcoe. De coloração dourada levemente turva com creme branco espesso de excelente formação e longa retenção, a Mindubier MinduHHHaze apresenta uma aroma mega perfumado de frutas, com sugestão de manga, laranja, melão e toranja bem discreta. Na boca, doçura (frutada e maltada) no primeiro toque seguida de leve pegada cítrica (frutas amarelas), dulçor moderado e amargor comportado (50 IBUs) com leve picância de álcool (7.9%). A textura é suave, cremosa e levemente picante (de álcool) sobre a língua. Dai pra frente, uma Double NE caprichada, ainda que um tiquinho mais doce (e menos turva) do que espera com final levemente frutado e amarguinho. No retrogosto, amargor sutil, manga e casca de laranja.
Da Bahia para a capital paulista com mais uma Croma, a Stratify, uma New England IPA que destaca a utilização do lúpulo norte-americano Strata, acompanhado aqui por Mosaic. De coloração amarela turva, juicy tal qual um suco, e creme branco de excelente formação e longa retenção, a Croma Stratify apresenta um aroma que combina notas frutadas leves (melão e laranja sutis) com herbal equilibrado. Ainda é possível perceber floral delicado e uva verde na base. Na boca, doçura frutada levíssima que remete a melão no primeiro toque abrindo para um conjunto bastante saboroso que destaca uva verde acompanhada de leve doçura e de herbal discreto. O amargor é baixíssimo para os padrões (na casa dos 25 IBUs), o que é uma boa surpresa, pois funciona. A textura é suave. Dai pra frente, uma NE que não tende nem ao amargor exagerado nem a doçura extrema, ficando na deliciosa linha de equilíbrio que permite valorizar sutilezas, nada muito atirado na paleta, apenas sugestões deliciosas (como a de uva verde). No final, amargor bem levíssimo. No retrogosto, uva verde e harsch discreto.
Bodebrown Mago de Houblon
– Produto: New England IPA
– Nacionalidade: Curitiba, PR
– Graduação alcoólica: 6.1%
– Nota: 3.39 /5
Trilha Kolapsco
– Produto: New England Rye IPA
– Nacionalidade: São Paulo, SP
– Graduação alcoólica: 7%
– Nota: 4.01 /5
Devaneio do Velhaco Algemas Biológicas
– Produto: Juicy IPA
– Nacionalidade: Porto Alegre, RS
– Graduação alcoólica: 6.6%
– Nota: 3.99/5
UX Double Quarantine #3.0
– Produto: Double New England IPA
– Nacionalidade: Itupeva, SP
– Graduação alcoólica: 8%
– Nota: 3.92/5
Mafiosa Tarantula’s Juice
– Produto: New England IPA
– Nacionalidade: Valinhos, SP
– Graduação alcoólica: 6%
– Nota: 3.80/5
HopMundi Paradise Cove
– Produto: Double New England IPA
– Nacionalidade: Natal, RN
– Graduação alcoólica: 8.2%
– Nota: 4.00/5
Everbrew Maine Berry Gelato
– Produto: New England IPA
– Nacionalidade: Santos, SP
– Graduação alcoólica: 7.6%
– Nota: 4.10/5
Molinarius Overcitra
– Produto: New England IPA
– Nacionalidade: São Paulo, SP
– Graduação alcoólica: 6.3%
– Nota: 3.93/5
Mindubier MinduHHHaze
– Produto: Double New England IPA
– Nacionalidade: Salvador, BA
– Graduação alcoólica: 7.9%
– Nota: 3.97/5
Croma Stratify
– Produto: New England IPA
– Nacionalidade: São Paulo, SP
– Graduação alcoólica: 7%
– Nota: 4.06/5
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