entrevista por Guilherme Lage
O Faca Preta é punk como se deve ser. Um som direto, sem frescuras ou firulas e o melhor: Um dedo do meio em riste para o fascismo que tomou conta da política e da cultura brasileira nos últimos anos. Após um primeiro EP (em 2015) e participação na coletânea “Para Incomodar Vol.2” (2016), eles preparam o território para o vindouro primeiro disco cheio, “Resistir”.
Em meio aos percalços causados pela pandemia do novo coronavírus, eles aguardam o melhor momento para colocar o disco na rua. Enquanto isso, o grupo paulista mostra “Dias Melhores”, um clipe que regurgita a fúria e a ojeriza punk ao neofascismo bolsonarista e torna a banda, formada em 2013, um pilar da resistência underground contra o autoritarismo que caminha no país.
O guitarrista Anderson Boscari falou um pouco sobre tudo nessa entrevista: Guitarra, música, política, sem deixar nenhuma dúvida que se existe um muro que divide o país em direita e esquerda, não é em cima dele que o Faca Preta está.
A minha geração, que é a galera de 20 e tantos, 30 e poucos anos, não viveu a ditadura e esse momento atual tem sido o que de mais próximo já encontramos pelo caminho. O curioso é que muita gente que compõe essa geração do fim dos anos 80 e início dos 90 não se importava tanto com política ou mal conhecia. Você acha que agora é realmente o momento de o punk se posicionar, mostrar que está ao lado do povo e conseguir até dar um pouco mais de perspectiva a essas gerações e até para as mais jovens?
Eu acredito que sim! Pra mim o punk sempre foi uma escola. Foi ouvindo Cólera e Garotos Podres que aprendi muitas coisas que carrego pra toda minha vida. Foram através das letras das bandas que eu ouvi e ouço até hoje, que aprendi a entender melhor o porquê de hoje estarmos em uma situação tão sombria quanto a que estamos. Nesse momento é fundamental não só as bandas de punk rock, mas todos os artistas de forma geral, se posicionarem.
Legal você ter comentando sobre Cólera e Garotos, eles foram duas bandas que conseguiram extrapolar a música um pouco além dos ouvintes de punk rock, vocês procuram fazer isso também?
Sim, e isso tem um pouco a ver com a idéia do clipe. A gente quis fazer uma parada pra que todas as pessoas pudessem assistir, justamente pra tentar atingir um público que não está acostumado com o punk rock. A idéia é sempre levar a mensagem o mais longe que a gente puder.
Cara, a primeira vez que ouvi o Faca Preta foi no “Para Incomodar Vol. 2”, coletânea da HBB, inclusive fiz uma matéria sobre o disco pro jornal que trampava. Como você avalia a importância daquela coletânea? Ainda mais levando em consideração o estigma que street punk e Oi! já tiveram (e ainda podem ter) no cenário brasileiro?
Pra banda foi muito importante ter participado da coletânea. Muitas pessoas de vários lugares conheceram o Faca Preta por conta do CD. Acho que a coletânea veio em um momento legal, onde se discutia muito sobre o street punk e o Oi! no Brasil. Obviamente algumas pessoas torceram o nariz, mesmo antes de ouvir o que a gente tinha pra dizer, mas voltando um pouco na pergunta anterior, achamos sempre válido levar a mensagem pro maior número de pessoas que a gente puder.
Como você avalia a participação desse cenário street punk/Oi! na música contestadora brasileira nesse momento atual?
Das bandas que acompanho, vejo uma produção crescente nesse período. Vejo as bandas lançando novos sons, novos clipes, se posicionando através da internet… Acho muito importante a produção não parar!
Enquanto guitarrista, quais bandas te inspiram no instrumento? Você se dedica à guitarra? O Oi! é um pouco mais cadenciado que o punk tradicional, você procura isso ou não se limita apenas ao punk rock quando o assunto é o instrumento?
As bandas que me inspiram na guitarra são basicamente Cólera, Cock Sparrer, Rancid e Ramones. Mas o que me fez querer tocar guitarra realmente foi Ramones. Era algo que eu podia e conseguia tocar. Eu nunca me dediquei muito a estudar o instrumento, sempre toquei o básico. Depois de ler em uma biografia dos Ramones que o Johnny só tocava no ensaio pra não se aprimorar muito, me identifiquei, hahaha. Sobre a limitação, no nosso novo disco procuramos usar vários elementos de guitarra diferentes. Coisas com pouca distorção, acordes abertos, violão… Variamos bastante, mas tudo com a base no punk rock e muito bem trabalhado!
Uma curiosidade: Você acha que algumas pessoas muito apaixonadas pelo punk rock podem torcer um pouco o nariz para outros gêneros dentro do rock n’ roll? Haha, um exemplo: o heavy metal
Ah, com certeza! Eu quando era mais jovem e descobri o punk rock, achava todo o resto uma porcaria. (risos) Com o tempo a gente vai entendendo, aprendendo sobre, gostando de outros estilos, e até voltando a gostar de coisas que havíamos deixado de lado. A primeira banda que gostei na minha vida, inclusive, foi o Iron Maiden. Hoje em dia eu sou muito mais aberto a sonoridades, a coisas novas.
Cara, de onde vem o nome Faca Preta? É só um nome legal ou existe algo por trás?
Só um nome que a gente achou legal. Na verdade há muitos anos atrás eu e o Dudu, o outro guitarrista, queríamos montar um projeto, e uma das idéias de nome era Black Knife, também sem nenhum motivo. Quando ele entrou na banda, a gente chamava True Believers, mas estávamos buscando um nome em português, e ele deu a idéia da gente usar o Faca Preta.
Quais são agora os planos pro futuro da banda?
O nosso disco está pronto, mas devido a pandemia, vamos aguardar um momento mais adequado. Enquanto isso ainda vamos soltar um ou dois singles esse ano, talvez com clipe. A ideia é esperar passar tudo isso e lançar o disco com uma tour bem legal, passando por todos os lugares possíveis!
Já pode revelar o nome do disco ou ainda é uma surpresa?
Podemos sim! Nosso disco vai se chamar “Resistir”, que também é o nome de uma música do álbum!
Alguma previsão pro lançamento?
Ainda não… Devido a pandemia tudo acabou entrando em stand by.
Alguma mensagem pra quem “governa” esse país pra finalizarmos?
Nós nunca vamos estar do mesmo lado!
– Guilherme Lage (www.facebook.com/breadandkat) é jornalista e mora em Vila Velha, ES.