por Marcelo Costa
Abrindo uma nova sequencia de cervejas e cervejarias com a carioca Farra Bier, que marca presença primeiramente com sua All In IPA, uma American IPA de 7% de álcool e 70 IBUs que destaca os lúpulos Zythos e Citra. De coloração dourada levemente turva com creme branco de boa formação e retenção, a Farra Bier All In IPA apresenta um aroma que sugere frutas tropicais (maracujá, abacaxi, laranja) sobre uma base de mel com discreto toques florais. Na boca, leve sugestão de abacaxi (passado) no primeiro toque se abrindo para um conjunto suavemente amargo, com traços de maracujá e abacaxi, doçura de mel e amargor que parece metade do que a casa bate no peito e anuncia, O amargor começa pegado (na faixa dos 40 IBUs), mas logo é dominado pela sensação de mel. A textura é cremosinha com discreta picância. Dai pra frente, uma American IPA que parece mais do que realmente é, com frutado cítrico distante, amargor alto, floral e pinho. A textura é cremosinha e, dai pra frente, uma American IPA que, mesmo sendo produzida em uma cervejaria, soa de panela, com leve desequilíbrio entre amargor, doçura e frutado. No final, mel, limão e amargor, sugestões que retornam ao retrogosto, fraco.
A segunda dos cariocas da Farra Bier é a Tomorrowland Double IPA, uma cerveja de coloração âmbar caramelada com creme bege claro de ótima formação e retenção. No nariz, aroma de Caramel IPA, com doçura intensa querendo saltar pra fora da taça e agarrar o nariz do bebedor. Há, além de mel e açúcar, ainda leve frutado, que remete a tangerina. Na boca, caramelo e açúcar de confeiteiro no primeiro toque abrindo levemente para frutas amarelas e seguindo com casca de pão doce com muito açúcar. Os 65 IBUs soam 35 num amargor equilibrado em meio a tanta doçura. A textura é meladinha, sedosa. Dai pra frente, uma Caramel IPA beeeem doce, açucarada, e com leve frutado que se perde em meio a tanta doçura (o mesmo acontece com os 8.5% de álcool, escondidos debaixo de uma avalanche de açúcar). O final é incrivelmente amarguinho. No retrogosto, caramelo e casca de pão doce açucarada.
Do Rio de Janeiro para Várzea Paulista, casa da Cervejaria Dádiva, que se juntou a nove cervejarias de seu próprio portfolio de distribuição (Augustinus, Cathedral, Japas, Mafiosa, MinduBier, Orchid, Quatro Graus, 4 Islands e Treze) para criar a Espelho D’Agua, uma Hoppy Pale Ale com dry-hopping de lúpulo Sabro cuja venda de cada lata terá R$ 1 revertido para a cooperativa de pescadores Repescar, da comunidade de Baiacu, na Ilha de Itaparica, que fica no município de Vera Cruz, na Bahia, e está desamparada devido a queda do turismo no período de pandemia. Causa nobre, bastante nobre. De coloração amarela mais para o palha do que para o dourado e creme branco de média formação e boa retenção, a Espelho D’Agua apresenta um aroma intensamente frutado com notas remetendo a lichia, pêssego, tangerina e abacaxi. Na boca, tangerina deliciosa no primeiro toque abrindo para um conjunto que, misteriosamente, remete a sensação (refrescante) de um espelho d’agua, com mais notas cítricas e amargor bastante comportado para os seus 50 IBUs. A textura é leve e, dai pra frente, uma baita APA levemente lupulada e bastante saborosa. No final, leve herbal mentolado e picância. No retrogosto, menta, pimenta branca e refrescancia.
A segunda da Cervejaria Dádiva é a Brain Waves, uma New England IPA cuja receita utiliza os lúpulos Galaxy e Mosaic no dry hopping e, na fervura, Mosaic em flor. De coloração amarela turva, juicy tal qual um suco de caju, e creme branco de ótima formação e retenção, a Dádiva Brain Waves apresenta um aroma com notas frutadíssimas sugerindo abacaxi, melão, maracujá e jaca – é possível perceber ainda discreta condimentação. Na boca, doçura frutada no primeiro toque com leve presença de amargor bastante sutil na sequencia, e mais abacaxi, maracujá e jaca. A textura é cremosa com leve picância e, dai pra frente, mais uma bela NE da Dádiva, que não costuma errar no estilo, cujo destaque no conjunto é a sugestão interessante de jaca, perceptível com facilidade até no final, acompanhada de amargor leve. No retrogosto, abacaxi, jaca, picancia e refrescancia.
De São Paulo para Curitiba com duas cervejas da renomada Bodebrown. A primeira é a Frutti Sour, uma Berliner Weisse que recebe adição de goiaba, maracujá e tangerina. De coloração amarelo palha com creme branco de boa formação e rápida dispersão (típica do estilo), a Bodebrown Frutti Sour apresenta um aroma que adianta tanto acidez quanto uma caprichada salada de frutas, que traz maracujá em destaque, e goiaba em segundo plano. Na boca, doçura frutada no primeiro toque abrindo com leve acidez, bastante maracujá, goiaba, e uma segunda onda de acidez mais intensa do que a primeira, ainda que suave. A textura é levemente frisante e, dai pra frente, surge uma deliciosa keetle sour, um suquinho cítrico incrível com 4.3% de álcool e acidez moderada que não deve assustar incautos – e que deve cair tão bem em dias quentes. No final, adstringência leve e maracujá. No retrogosto, maracujá, adstringência leve e refrescancia. Delicia.
A segunda da Bodebrown é a Fruta a Vapor, uma Pastry Saison inspirada numa geleia belga conhecida pelo nome de Sirop de Liège, que nada mais do que uma redução de fruitas concentradas por arraste de vapor. Para a receita dessa Farmhouse Ale foram adicionadas reduções de maçã, pera e tâmaras. De coloração âmbar e creme branco de boa formação e retenção, a Bodebrown Fruta a Vapor apresenta um aroma intensamente adocicado, com sugestão de mel e caramelo remetendo a casca de pão doce. Há, ainda, percepção de geleia de maçã, de pêssego e de damasco. Na boca, doçura de geleia de maçã e mel no primeiro toque seguida de leve aceno Saison, atropelado completamente pelo mix do Sirop de Liège, que esbanja doçura melada e deixa traços de geleia de maçã pelo caminho. Não há nenhuma nota de amargor e a textura é suave, sedosa. Dai pra frente, uma Pastry Saison com absolutamente nada de Saison, mais puxada para uma interessante Belgian Ale com geleia. No final, mel, maçã e pão doce. No retrogosto, pão doce, mel e maçã.
De Curitiba para Fortaleza, casa da cervejaria cigana Bold, que produziu essas duas latas na fábrica da Dádiva, em Varzea Paulista, interior de São Paulo. A primeira é a Citrus Therapy, uma New England Double IPA com muita aveia e trigo mais duplo dry hopping com os lúpulos Citra, Idaho 7, Amarillo e Centennial. De coloração amarela, turva, juicy tal qual um suco de caju, e creme branco de boa formação e retenção, a Bold Citrus Therapy apresenta um aroma maravilhoso, com muito frutado cítrico (abacaxi) e um herbal bem discreto além de leve doçura. Na boca, doçura no primeiro toque abrindo para um perfil frutado cítrico envolvente e um amargor limpo e suave. A textura é suave e picante. Dai pra frente, uma Imperial NE de corar o rosto, com 7.8% de álcool, muito cítrico, suavidade, doçura e picância. No final, abacaxi e doçura. No retrogosto, abacaxi, doçura e alegria.
A segunda da Bold Brewing é a Maori Joy, uma Oatmeal New England IPA cuja receita valoriza a aveia e os lúpulos neozelandeses Nelson Sauvin, Wai-iti, Rakau e Moutere num duplo dry hopping. De coloração amarela, turva, juicy tal qual um suco de caju, e creme branco de boa formação e retenção, a Bold Maori Joy apresenta um aroma bastante frutado e cítrico (laranja em destaque, mas também lichia e um pouco de toranja), com discreto toque de doçura e percepção de picância (advinda da levedura). Na boca, doçura frutada rápida no primeiro toque abrindo para um conjunto bastante frutado cítrico (há laranja e, muito levemente, toranja, mas há mais) e levemente picante. O amargor é comportado e a textura, suave e delicadamente picante. Dai pra frente, uma NE nível Bold, caprichadíssima e deliciosa. No final, doçura e frutado cítrico. No retrogosto, picância, doçura e mais frutado cítrico.
De Fortaleza para a Fazenda Santa Terezinha, em Paraisópolis, Minas Gerais, com duas cervejas da sempre surpreendente Zalaz. A primeira é a Amantik Coffea, uma Wild Ale nascida da junção de um “vinho de café maduro” (resultado de um teste de fermentação com microflora de café da fazenda da cervejaria), uma cerveja de fermentação selvagem (também com a microflora local) e, ainda, infusão de café torrado que havia sido fermentado em barricas de madeira. De coloração amarela turva com creme branco de ótima formação e retenção, a Zalaz Amantik Coffea apresenta um aroma incrível que combina café verde, frutas amarelas sutis, guaraná, acidez, azedume e amadeirado discreto. Na boca, doçura frutada rápida que remete a acerola no primeiro toque seguida de café inicialmente sutil, acidez leve, azedume idem, guaraná leve, amadeirado suave e mais café. Não há amargor e a acidez é média. A textura é levemente frisante. Dai pra frente, um chazinho azedinho de café verde amadeirado, guaraná e acerola. No final, azedume leve. No retrogosto, acidez discreta, café, guaraná e acerola.
A segunda da Zalaz é mais uma da linha Ybyrá, série limitada e experimental refermentada em barris de madeira com microflora local, a Guaiá, que blenda diferentes bases com um tempo médio de 6 meses em barris e refermentando desde Junho/19. De coloração âmbar alaranjada amarelada turva com creme branco pujante em formação e retenção, a Zalaz Ybyrá Guaiá apresenta um aroma um pouco mais comportado que outras da série, permitindo com isso que a madeira traga notas de coco, e que um frutado magnifico (abacaxi, pêssego, damasco, kiwi, maracujá) brilhe em meio a notas de acidez, azedume e condimentação suave. Na boca, leve cítrico no primeiro toque, atropelado pela acidez na sequencia, mas que retorna de modo mais aberto e saboroso (com pêssego, kiwi e maracujá) em meio a um funky médio alto. A textura é efervescente, cremosa e frisante. Dai pra frente, uma das melhores cervejas que a Zalaz já produziu, que equilibra com perfeição funky, frutado e madeira. No final, leve guaraná, acidez e secura. No retrogosto, adstringencia leve, damasco, pêssego, coco e muita alegria.
Farra Bier All In IPA
– Produto: American IPA
– Nacionalidade: Rio de Janeiro, RJ
– Graduação alcoólica: 7%
– Nota: 2.92/5
Farra Bier Tomorrowland
– Produto: Double American IPA
– Nacionalidade: Rio de Janeiro, RJ
– Graduação alcoólica: 8.5%
– Nota: 2.99/5
Dádiva Espelho D’Agua
– Produto: American Pale Ale
– Nacionalidade: Varzea Grande, SP
– Graduação alcoólica: 5.2%
– Nota: 4.00/5
Dádiva Brain Waves
– Produto: New England IPA
– Nacionalidade: Varzea Grande, SP
– Graduação alcoólica: 6%
– Nota: 4.01/5
Bodebrown Frutti Sour
– Produto: Keetle Sour / Berliner Weisse
– Nacionalidade: Curitiba, PR
– Graduação alcoólica: 4.3%
– Nota: 3.43/5
Bodebrown Frutas a Vapor
– Produto: Pastry Saison / Farmhouse Ale
– Nacionalidade: Curitiba, PR
– Graduação alcoólica: 6.1%
– Nota: 3.21/5
Bold Citrus Therapy
– Produto: Double New England IPA
– Nacionalidade: Fortaleza, CE
– Graduação alcoólica: 7.8%
– Nota: 4.02/5
Bold Maori Joy
– Produto: Oatmeal New England IPA
– Nacionalidade: Fortaleza, CE
– Graduação alcoólica: 6.3%
– Nota: 3.96/5
Zalaz Amantik Coffea
– Produto: Brazilian Wild Ale
– Nacionalidade: Paraisópolis, MG
– Graduação alcoólica: 4.8%
– Nota: 4.00/5
Zalaz Ybyrá Guaiá
– Produto: Brazilian Wild Ale
– Nacionalidade: Paraisópolis, MG
– Graduação alcoólica: 6.5%
– Nota: 4.60/5
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