por Rafael Monteiro
Em 2015 o músico português Salvador Menezes estava frustrado. A rotina profissional e pessoal fazia com que o artista, fundador e baixista do You Can’t Win Charlie Brown questionasse sua trajetória. Foi nesse período de reavaliação, durante uma semana de férias, que começou a nascer o alter ego Tipo. As canções registradas no álbum “Novas Ocupações” (lançado em 2018) são uma viagem pelo cotidiano do compositor, permeando aspectos da vida adulta como casamento, emprego e paternidade.
No caso da banda carioca Terceiro Mundo Bom, que lançou seu primeiro EP em 2019, o cantor e compositor Diogo Brandão, encara o sempre desafiador processo da criação coletiva: “Sempre gostei de compor em conjunto. Com o Terceiro Mundo Bom queremos deixar o som cada vez mais universal e ao mesmo tempo mais regional”. O músico é fundador de bandas importantes do cenário independente do Rio de Janeiro como Benflos e Rockz.
Apesar dos dois projetos terem a lírica entre os pontos fortes (muito embora os temas sejam bem diferentes), ao ser apresentado ao som do Tipo, Brandão foi fisgado primeiramente mais pela musicalidade das palavras do que pelo seu significado. “Em alguns momentos, pela sonoridade das vogais, soava quase como outra língua, mas melodicamente chama bastante atenção. Dá uma sonoridade muito interessante”.
Os novos caminhos da carreira, além do atual momento do cenário de música independente em Portugal e a dificuldade de tocar em outros países da Europa, foram alguns assuntos que Salvador Menezes abordou ao ser entrevistado por Diogo Brandão neste primeiro capítulo de Projeto Tanto Mar no Scream & Yell, que sempre trará um ping pong entre brasileiros e portugueses reforçando a nossa vontade de diminuir a distância entre os países (apesar de… tanto mar). Confira o bate papo:
DIOGO BRANDÃO: Ao contrário do You Can’t Win, Charlie Brown, que tem letras em inglês, em “Novas Ocupações” você optou por cantar em nossa língua. Quais as vantagens de cada uma das opções, sendo um artista português?
TIPO: A vantagem de escrever em inglês é o fato de se poder usar uma “máscara”. Quando se canta na língua materna somos nós próprios e é muito mais difícil fingir ser outra pessoa. A maneira como pronunciamos certas palavras, por exemplo, estamos mais expostos. A vantagem de cantar em português é a facilidade em criar uma ligação mais direta com o ouvinte (que fale a nossa língua, claro).
DIOGO BRANDÃO: Como é o cenário musical atual em Portugal para artistas independentes? Há espaços interessantes para tocar?
TIPO: O cenário de música portuguesa independente está no seu melhor momento e continua a melhorar de dia para dia. Nunca tivemos tantos projetos com tanta qualidade na nossa cultura. Infelizmente há demasiada oferta para tão pouca procura. Há espaços interessantes, mas Portugal é um país pequeno e muito centralizado. Se tirarmos os festivais da equação, fora das grandes cidades há muito pouco. Por exemplo, a sul da grande Lisboa, principalmente o Alentejo, há muito pouca oferta. Mas também se deve ao fato de não haver assim tanto público para os projetos independentes.
DIOGO BRANDÃO: Você sente uma abertura para tocar em outros países da Europa, ou é uma dificuldade?
TIPO: Há abertura, mas será sempre com alguns sacrifícios e sem ganhar dinheiro. O único intuito é dar a conhecer a música. Com base na minha experiência, para a internacionalização funcionar é preciso ir regularmente (pelo menos uma vez por mês) a um país da Europa de maneira a conseguir criar uma base sólida de seguidores. Ou seja, fora de Portugal, é sempre preciso trabalhar do zero.
DIOGO BRANDÃO: Como é a receptividade do público português com novos artistas de outros países? Músicos brasileiros, por exemplo, costumam ser bem recebidos?
TIPO: Os portugueses gostam muito de bandas estrangeiras, mas os novos artistas têm de já ter algum nome, senão dificilmente haverá público nos concertos. Mas isso é com qualquer nacionalidade, sejam estrangeiros ou portugueses. Acho que o público português ainda não tem o hábito de ir ver concertos de bandas que não conhece. Os portugueses ouvem muita música brasileira, mas é a mais mainstream.
DIOGO BRANDÃO: Você conhece algum artista independente do Brasil?
TIPO: Não sei se são independentes, mas conheço muito bem O Terno (e o Tim Bernardes solo), Gui Amabis, Rodrigo Amarante, Mallu Magalhães e Boogarins.
– Rafael Monteiro (fb/rafael.monteiro.7902) é professor, músico e responsável pelo Projeto Tanto Mar.