Boteco: Cinco latões de cerveja nacionais

por Marcelo Costa

Abrindo uma série de latões nacionais com a novíssima cervejaria paulistana Central, fundada no bairro de Santa Cecília, no centro da capital, em dezembro de 2017. A casa oferece tap vários estilos clássicos para beber in loco ou levar em growler para casa, mas, alguns meses depois, a turma surgiu com sua primeira cerveja enlatada (na fábrica da Mea Culpa), a Central #1, uma New England IPA de excelente custo benefício: R$ 21 a lata de 473 ml. De coloração amarela turva, juicy como manda o figurino do estilo, a Central #1 apresenta um creme branco de boa formação e média retenção. No nariz, percepção caprichada de frutado cítrico (abacaxi, manga, um pouco de pêssego e de casca de laranja) e leve aridez de levedura. Na boca, maciez e frutas cítricas deliciosas no primeiro toque seguido de um amargor bem levezinho. A textura é levemente efervescente na primeira vez que a cerveja pousa sobre a língua, mas, depois, fica cremosa. Dai pra frente segue um conjunto delicioso, total NE IPA, ainda que pudesse ter mais corpo, mas, do jeito que está, está deliciosa. No final, doçura, cítrico e aconchego. No retrogosto, mais frutado cítrico. Uma delícia.

De São Paulo para Porto Alegre com mais uma Perro Libre marcando presença por aqui, desta vez a nova American Pale Lager da casa, lançada no começo de 2018, e cuja a receita une os maltes Pilsen, Carapils e Crystal com os lúpulos Citra, Galaxy e Magnun. De coloração dourada levemente opaca com creme bege clarinho praticamente branco de boa formação e retenção, a Perro Libre American Pale Lager exibe um aroma com notas cítricas transbordando e valorizando, principalmente, o lúpulo Galaxy (Austrália), que acrescenta sugestão de maracujá, deliciosa. Há, ainda, um nota amanteigada, que soava mais intensa no começo da lata, e depois foi diminuindo a intensidade. Na boca, maciez frutada cítrica no primeiro toque seguida de mais cítrico (e ainda mais agradável) e amargor bem leve (28 IBUs). A textura é suave, mas traz um picância bem leve (de lúpulo). Dai pra frente segue-se uma American Pale Lager agradável, ainda que o off-flavour de amanteigado atrapalhe um pouco o percurso. No final, cítrico. No retrogosto, doçura, maracujá e refrescância.

Voltando para São Paulo com uma colaborativa entre duas cervejarias bacanas do Estado, Dádiva e Tito Bier, que fizeram juntas a Hildegarda Imperial Pilsner, produzida (na fábrica da Dádiva) em homenagem à Santa Hildegarda de Bingen, monja beneditina alemã que viveu no século 12 e, conforme relatos, citou pela primeira vez os efeitos aromatizantes e conservantes do lúpulo. De coloração amarela meio dourada turva com creme branco de boa formação e retenção, a Hildegarda exibe um aroma adocicado (mel) e frutado cítrico (abacaxi e pêssego) com leve aceno floral. Na boca, a doçura do malte e o cítrico dos lúpulos chegam juntos, deliciosamente equilibrados no primeiro toque, e na sequencia se alternam numa percepção deliciosa para o bebedor. A textura é suave, quase cremosa. Dai pra frente, uma receita que esconde bem os 8.1% de álcool em meio a frutado cítrico e doçura melada agradáveis. No final, doçura, cítrico e um amarguinho leve, mesmas sugestões que retornam no retrogosto. Boa.

De São Paulo para Porto Alegre (novamente) com mais uma Tupiniquim na área, e a segunda da série lupulada “Efeito”: depois da Efeito Simcoe agora é a vez da Efeito Galaxy, lançando luz sobre o personal lúpulo australiano. De coloração amarela turva com creme branco de ótima formação e retenção, a Tupiniquim Efeito Galaxy apresenta um aroma delicioso e fortemente frutado cítrico (manga, maracujá e pêssego) além de leve floral. Na boca, maciez e frutado cítrico com doçura suave, tudo chegando junto no primeiro toque. Na sequencia, o amargor sutil dá um pouco as caras, mas sem chamar tanto a atenção em meio ao cítrico e a doçura. A textura é suave caminhando para o cremosa e, dai pra frente, segue-se um conjunto bastante saboroso com notas cítricas envolventes, um leve floral perceptível e amargor na medida, sem incomodar, mas mostrando que está ali. No final, cítrico, doçura e amargor médio. No retrogosto, um rastrozinho de amargor que ainda deixa perceber cítrico e doçura. Agradável.

De Porto Alegre para São Paulo (de novo – risos), mas agora realmente com um latão, na verdade um crowler de 1 litro da cervejaria Trilha, produzido no tasting room deles no bairro de Perdizes, na capital paulista, com a experimental Sweet Dreams, uma Milkshake IPA com lactose. De coloração amarela turva, juicy, com creme branco de boa formação e permanência, a Trilha Sweet Dreams exibe no aroma uma pancada forte de baunilha, que se sobrepõe aos demais ingredientes e percepções, que ficam em segundo plano (um pouco de cítrico ainda consegue fugir do cerco da baunilha, timidamente). Na boca, porém, a baunilha continua dominando largamente, mas é possível perceber mais cítrico já no primeiro toque do o aroma adianta. Na sequencia, potência de baunilha e cítrico leve são interrompidos por uma barreira suave de amargor. A textura começa suave e picante (percepção de levedura) e vai se tornando cada vez mais sedosa. Dai pra frente, um conjunto sublime, com baunilha ditando as regras, mas, ainda assim, resultando num conjunto arrebatador. No final, condimentação e picância (muito provavelmente de levedura) e até um harsch discreto, sensações que se prolongam até o retrogosto, acrescido de… baunilha. Uou, que cerveja foda.


Balanço
Abrindo essa série de latões com a estreia da Central, uma bela New England IPA num custo benefício excelente. Vale muito ir atrás. Já da Perro Libre American Pale Lager eu esperava mais, e suspeito que essa lata não estivesse em suas melhores condições (há um amanteigado aqui que duvido que esteja na grande maioria das outras latas do rótulo), mas a gente escreve sobre o que a gente tem na taça, e lá o resultado ficou aquém do potencial desta baixa micro-cervejaria gaúcha. A Dádiva Tito Bier Hildergada é uma Imperial Pilsner bem agradável, que esconde o álcool muito bem com doçura e cítrico. A Tupiniquim Efeito Galaxy me soou mais interessante que a Efeito Simcoe (ponto para a Austrália). Já a Trilha Sweet Dreams, é aquela coisa: para mim, se você adiciona algo diferente à receita, esse algo tem que se destacar, senão nem adiciona (ou então, nem destaca que você adicionou). No caso dessa Sweet Dreams, a baunilha é tão destacada que parece que irá prejudicar o drinkability. Ao menos foi isso que achei quando a bebi pela primeira vez no tasting room dos caras. Agora vá dizer isso pra esse crowler vazio de 1 litro, que poderia ser dois ou três. Sensacional! Minha cerveja número 1 da Trilha… hoje – vão que eles lançam um experimento foda amanhã.

Central #1
– Estilo: New England India Pale Ale
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 6.6%
– Nota: 3.48/5

Perro Libre American Pale Lager
– Estilo: Pale Lager
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 4.5%
– Nota: 2.78/5

Dádiva Tito Bier Hildelgarda
– Estilo: Imperial Pilsner
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 8.1%
– Nota: 3.30/5

Tupiniquim Efeito Galaxy
– Estilo: India Pale Ale
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 6.7%
– Nota: 3.76/5

Trilha Sweet Dreams
– Estilo: Milkshake IPA
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 7.2%
– Nota: 4.15/5

Leia também
– Top 2001 Cervejas, por Marcelo Costa (aqui)
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