Texto e fotos por Andye Iore
A sexta edição do festival Intervenção Underground Cultural foi realizada no interior de São Paulo, mais propriamente em Rancharia, cidade com menos de 30 mil habitantes (quase na divisa com o Paraná) que fica a 520 quilômetros de São Paulo e 57 km de Presidente Prudente. No sábado (22/05), o evento reuniu 12 bandas de São Paulo e do Paraná no Balneário Prefeito Manoel Severo Lins Neto, no km 50, da rodovia SP-351, a aproximadamente 15 km da cidade.
O município de Rancharia é cortado pelo rio Capivari e suas águas são represadas formando o Parque Balneário. São mais de três mil metros quadrados com um grande lago usado pelos visitantes de ecoturismo, como passeios de lancha, jet ski e parapente. Há ainda quiosques e pista de motocross. Há três anos o espaço recebe o festival roqueiro como ocupação durante o Inverno, quando a frequência turística na cidade é reduzida.
Neste ano foram quase 10 horas de muito barulho e consciência social e política nos discursos nos microfones. O festival é bancado pela prefeitura e tem entrada gratuita numa rara parceria bem sucedida entre promotor independente e poder público, que serve de exemplo até para os grandes centros no Brasil. Até o prefeito da cidade foi conferir o noise das bandas ao vivo. “O festival agradou mais que o esperado. Foi um festival que caiu no gosto da galera e vem atraindo mais gente a cada edição”, avaliou o organizador Fernando Shi, 39 anos.
Além da entrada grátis, o evento contou com um som de qualidade para as bandas, bar com preços justos (por exemplo, havia promoção de três refrigerantes por apenas R$ 10) e espaço coberto com uma grande tenda de circo com capacidade para receber o triplo da media de 600 pessoas que circularam durante o evento, segundo estimativa da organização. O que acaba atraindo excursões de diferentes estados, com pessoas ficando acampadas em barracas ao lado da tenda.
Mas as atrações principais são mesmo as bandas. E o line up escolhido a dedo apresenta uma mostra variada do cenário underground, com hardcore, grind, crust, metal e surf music, indo desde grupos já consagrados no segmento com quase 25 anos de estrada até bandas novas: Feces on Display (goregrind de São José do Rio Preto), Surra (crossover anti-fascista de Santos), Desalmado (grindcore da capital paulista), Subcut (que faz grindcore em Presidente Prudente desde 1995!), Chaoslave (death metal de São Bernardo do Campo), Academic Worms (noise punk de Mirassol com mais de 20 anos de estrada), Bufalos d´Agua (surf music de Londrina) e Deu B.O. (hc de Tupã), entre outras.
E dá-lhe muito barulho nas caixas de som, com distorção, peso e muitos vocais ininteligíveis, até grunhidos. As formações também eram as mais variadas indo desde o clássico trio bateria-guitarra-baixo, passando por banda sem baixo, outra com dois vocalistas, outra com saxofone até uma onemanband. Destaque para as duas bandas de Maringá que agradaram em cheio. A novata Turbulence foi a sexta banda no palco e ganhou muitos fãs com seu metal punk. Tanto é que o trio vendeu todas as camisetas que levou. Já a tradicional Desgraceria foi a penúltima e esquentou o frio de quem ficou até o final com seu grindcore.
Entre as atividades paralelas houve uma coleta de produtos para uma entidade assistencial e 15 bancas com expositores de camisetas, vinil, CDs, DVDs, fitas K7, livros, bottons, fanzines, artesanato, entre outros. Uma ótima oportunidade de ficar atualizado com o que é produzido entre selos e bandas independentes brasileiras.
Entre tantas coisas bacanas, a imbecilidade de alguns em jogarem bombinhas num espaço fechado foi um ponto negativo. O evento rolando na maior camaradagem e algumas pessoas jogando bombinhas incomodaram o ambiente, e até mesmo depois de pessoas que se assustaram reclamarem, a idiotice continuou, contrastando com constantes discursos de conscientização falados pelas bandas no palco. Houve também uma blitz policial de transito próxima ao evento (lembre-se: o balneário fica a 15 km da cidade), que multou e apreendeu CNHs. A fiscalização é extremamente importante, mas também é necessário um trabalho conjunto entre produção, Secretária de Cultura e polícia a fim de orientar o público e oferecer alternativas para que todos aproveitem o evento e também a cidade.
Reunindo bandas barulhentas de várias cidades paulistas e do Paraná num line-up atento e variado, no geral, a sexta edição do Intervenção Underground Cultural se mostrou um evento exemplar e que merece todos os parabéns. Desde o produtor Fernando Shi, que fez as primeiras edições cobrando ingresso num bar da cidade, até a prefeitura que teve a visão de valorizar a cultura como instrumento social. E, claro, as bandas que mantém viva a ideologia underground como maneira de melhorar a sociedade. Quem quiser entrar em contato com a organização, acesse a página do festival no Facebook. Que venha a 7ª edição. Fique atento a Rancharia!
– Andye Iore (@andyeiore) é jornalista em Maringá e Cianorte (PR), fã de Cramps desde 1986 quando ouviu “Surfin’ Dead” no filme “A Volta dos Mortos Vivos”. Apresenta o Cinema na Música na rádio Música FM de Cianorte (89,9 FM) e o Zombilly no Rádio na UEM FM (106,9) e na Alma Londrina (www.almalondrina.com.br) além de ser responsável pelo site Zombilly.