críticas por Marcelo Costa
“O Círculo”, de James Ponsoldt (2017)
Lançado em 2013, o romance ficcional “The Circle”, de Dave Eggers, fez fama criticando e, em alguns momentos, demonizando com veemência os grandes conglomerados da web (Apple e Google em primeiro plano, mas sobra farpas para o Facebook também no livro) numa trama simplista que utilizava a narrativa com o intuito de alertar o público sobre algumas questões realmente importantes do mundo moderno como superexposição nas redes sociais e controle midiático através de dados liberados sem cerimônia por internautas como você e eu. Trazido para o cinema com direção de James Ponsoldt e um elenco de respeito (a nova querida de Hollywood, Emma Watson, o duas vezes vencedor do Oscar Tom Hanks e Bill Paxton, em seu último filme, e até Beck faz uma ponta), “O Círculo”, porém, tropeça na incompetência de um roteiro péssimo (que não tem foco certo e recheia a trama de obviedades absolutamente dispensáveis), de uma direção de atores vergonhosamente ineficaz (Emma Watson já provou ser uma ótima atriz, mas não consegue dar brilho a um personagem que teria tudo para ser interessante, mas foi desenhado de forma tão confusa que nem mesmo a atriz parece entendê-lo) e de uma trama tão banal que chega a constranger o público. James Ponsoldt, que divide o roteiro junto com o autor Dave Eggers, tinha temas importantes em mãos, e conseguiu fazer deles péssimo entretenimento, péssimo cinema e péssima crítica. Sério concorrente ao Framboesa de Ouro 2017, “O Círculo” é tão ruim que Apple, Google e Facebook devem estar gargalhando de Hollywood.
Nota: 1
“John From”, de João Nicolau (2015)
Rita (a ótima Júlia Palha) é uma adolescente portuguesa entediada. Ela tem 15 anos, é verão, e sua maior diversão após o fim de um namoro e uma ressaca pós balada é fazer um laguinho na varanda do apartamento e ficar tomando sol enquanto refresca os pés. Na rotina de seu dia a dia estão as refeições com a família, conversas com uma amiga muito próxima com quem ela troca bilhetes escondidos em um local secreto do elevador do prédio e aulas de piano, mas tudo muda na vida da garota quando ela acompanha uma exposição que um novo vizinho, um fotógrafo galante pai de uma garotinha aparentemente separado da esposa, monta no centro comunitário do bairro. “Tudo muda” é exagero, porque a vida tediosa da adolescente seguirá tediosa, ainda que a partir de então ela tenha um príncipe encantado para sonhar e chamar de seu (no sonho e para a amiga). O roteiro foca na inocência dos 15 anos, e se há beleza no tratamento que dá ao personagem, também há tédio, monotonia e bocejos. Os dois primeiros terços do filme, então, passam com certa dificuldade, ainda que a jovem atriz Júlia Palha, um dos trunfos do filme, consiga entregar carisma a um personagem nada carismático. Já no último trecho, o roteiro embarca na inocência do personagem, sai do plano real (e tedioso) do cotidiano da moça, e embarca numa viagem de fantasia em que tudo é possível para Rita, que enfim descobriu o amor, e a inocência do sexo (e da própria personagem) é simbolizada por uma partida de tênis na praia com seu amado num filme independente português interessante… ainda que monótono.
Nota: 4
“Perdidos em Paris”, de Fiona Gordon e Dominique Abel (2015)
Típica comédia pastelão francesa, “Paris Pieds Nus” (algo como “Descalço em Paris”) mostra a predileção dos diretores pelo cinema mudo de Charles Chaplin, o que, claro, oferece bastante comicidade visual a um roteiro que, inicialmente, soa bobinho, mas mostra potencial para surpreender o público. Um dos trunfos da trama é o divertido elenco, encabeçado pela dupla de diretores ao lado da maravilhosa Emmanuelle Riva, estrela de clássicos do cinema como “Hiroshima Mon Amour” (1959), de Alain Resnais, e “Amour” (2012), de Michael Haneke, aqui em uma de suas últimas aparições na tela (ela faleceu em janeiro de 2017 aos 89 anos, e ainda há um filme seu, “La Sainte Famille”, de Marion Sarraut, para estrear). Na trama, Fiona é uma bibliotecária que trabalha em uma pequena cidade canadense. Ela recebe uma carta de sua tia Martha (Emmanuelle Riva), que se mudou muitos anos atrás para Paris, e agora, bastante idosa, pede ajuda da sobrinha, pois médicos do departamento de saúde parisiense querem coloca-la em um asilo. Fiona então parte para Paris, falando pouco francês e se envolvendo em diversas confusões. Numa delas conhece o mendigo Dom (Dominique Abel), e juntos saem a procurar por Martha, que está vagando pelas ruas de Paris fugindo dos médicos. “Perdidos em Paris” soa excessivamente teatral em alguns momentos, mas pode fazer sorrir quem estiver procurando uma comédia leve e descompromissada, que não promove gargalhadas nem soa o filme do ano, mas diverte com poesia, dança e inocência.
Nota: 5
Leia também:
– “Amour” é mais um exemplo focado do caminho tortuoso escolhido por Haneke
– Resnais debate tempo, memória e esquecimento em “Hiroshima Mon Amour”
– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne.