por Ana Clara Matta
Todo jovem crítico promete para si que nunca começará um texto com “Um estudo recente…”, mas o tempo passa, envelhecemos e quebramos nossas promessas. Sabia o que acontece também qAuando envelhecemos?
Um estudo recente de um consultor profissional do Spotify, publicado no blog Skynet & Ebert, afirma que a partir dos 33 anos o consumidor padrão de música quase pára de consumir novos artistas. O estudo utiliza dados do aplicativo, que possui acesso a correlações complexas de idade, perfil e audições de diferentes faixas, e a conclusão da análise desses dados é simples: com a idade, seu gosto musical se cristaliza, e com tantas predileções prévias e fios cruzados de influências na cabeça, você busca o conforto da nostalgia e acaba discutindo com seu filho sobre como que “na sua época era melhor”. É uma constatação dura, eu sei, mas pare de chorar, é só sinal dos tempos.
Isso coloca sob uma luz diferente um público que enfrenta, em iguais medidas, o interesse e a rejeição da Indústria Musical: os adolescentes, essas criaturas cujos gostos musicais ainda não foram sedimentados. Muito mais inclinados a testar, se arriscar e conhecer coisas novas, os adolescentes querem que suas identidades sejam diferentes da de seus pais, e por isso estão sempre liderando novas tendências e adotando de maneira antecipada novos ícones e sonoridades. Tudo o que gostamos hoje, um adolescente gostou primeiro. Mesmo assim, emulando a nossa percepção da adolescência como fase da vida, a adolescência na música tem que ser transitória, precisa de uma data de validade.
Quantas vezes você já ouviu um artista dizendo que seu novo trabalho seria mais maduro, apelando para um público adulto, com temas mais profundos ou intensos? Essa mudança é vista como o caminho natural da carreira de qualquer ícone. Agradar os adolescentes pode ter sido o que te deu fama, mas só é desejável por um tempo. Até certo ponto, o que a música faz, década a década, é trair sua geração de adolescentes, negando sua falta de pretensões artísticas, e então se dissolvendo para dar espaço para a tendência que trairá uma nova geração de adolescentes. Se você quiser entender o caminho de um gênero musical na história, estude primeiro o caminho da geração de adolescentes que acompanhou de perto esse gênero.
Os motivos descritos acima tornam a declaração de Harry Styles para a Rolling Stone, elogiando a paixão e inventividade de suas fãs adolescentes, absolutamente especial. Com seu primeiro disco solo, o galã britânico se distancia sonoramente de qualquer som que definiríamos, em nosso pedantismo, como adolescente. O disco de Styles traz para a mesa uma quantidade impressionante de influências, que vão da dicotomia clássica de Beatles e Rolling Stones, passa pelo folk de compositores como Ryan Adams (que deve estar sofrendo por não ter escrito “Ever Since New York” e “Two Ghosts” para o álbum “Gold”), e flerta com glam (“Only Angel”), blue-eyed soul (“Woman”) e até uma vertente bem pop do hard rock (“Kiwi”). Styles poderia muito bem utilizar a oportunidade para dizer que amadureceu, e transcendeu a imagem de ídolo adolescente. Mas ao invés disso, ele ousa perguntar a todos nós: o que há de tão errado em ser um ídolo adolescente, afinal? Não são os adolescentes que ditam o futuro da música? E pelo resultado de seu primeiro esforço solo, Harry Styles pode ser o futuro da música.
Harry Styles não é o ídolo adolescente sedimentado nos anos 50 com Frankie Avalon e Ricky Nelson, mesmo que, em sua imagem atual, faça referências bem atentas ao estilo de ambos, com gel no cabelo e ternos largos. O ex-membro da boyband One Direction não apenas não soa como um jovem rapaz em seu disco – em alguns momentos, ele soa positivamente como um compositor em sua meia-idade. Styles não vende a “commodity’ do ser “cool” em seu disco, sendo confessional em suas letras e traçando melodias que remetem aos anos 70 ou 60. Ou talvez, na verdade, ele esteja redefinindo a “commodity” do ser “cool” para a sua geração.
Três músicas definem o alfa e o ômega do disco de estreia solo do cantor e compositor britânico. A primeira é “Carolina”, a principal candidata do disco a convencer o seu amigo indie a gostar de Harry Styles. Com um contrabaixo estourado que soa como o caminhar estiloso de Travolta pela rua, um vocal preguiçoso que faria inveja a Britt Daniel e seu Spoon, ecos de “Paperback Writer”, e uma espinha dorsal inegavelmente mais Blur do que Oasis, “Carolina” tem o potencial para ser o hit mais peculiar de 2017. “From The Dining Table” é outro destaque, e fecha o disco com uma fragilidade e entrega emocional que brilha até através de uma produção crua e acústica.
“Sign of The Times” fecha a nossa trindade, e de acordo com Harry em diferentes entrevistas, essa faixa pode ter sido escrita sobre uma variedade de temas atuais, como uma releitura da história da cicatriz do Coringa em “O Cavaleiro das Trevas” de Nolan. Quando ouvi essa power ballad pela primeira vez, ela parecia se encaixar perfeitamente no mundo em que vivemos exatamente agora… mas quando, e sobre o que, ela foi realmente escrita? Trump? Brexit? Talvez Harry Styles não saiba o que inspirou sua canção, afinal. Um hino nunca nasce como hino. Talvez o zeitgeist só possa realmente ser capturado, como um relâmpago em uma garrafa, sem consciência do ato. Talvez só a adolescência, em seu som e fúria, seja capaz (e tenha a coragem) de criar o agora.
Caro amigo de 33 anos, te trago uma proposta ousada. Que tal ouvir um artista novo? O nome dele é Harry Styles.
– Ana Clara Matta (@_ana_c) é editora do Rock ‘n’ Beats e do Ovo de Fantasma.
Se essa Sign Of Times fosse do Ashcroft o mundo indie estaria em polvorosa
Verdade! Hehehe
Concordo com o texto e com o comentário do Vinimzo. Vi o vídeo de “Sign of the Times” e a canção me surpreendeu bastante, nem imaginava que fosse de um cara egresso de uma banda adolescente. Foi, ao lado de “Human” do Rag’n’Bone Man, o que de melhor a música pop produziu nesse ano até o momento. Ah, tenho 40 anos, apaixonado por música, mas contra o Spotify!!!!
Discordo completamente. Harry Styles nao passa de um produto da gravadora tentando socar goela abaixo do povao um novo idolo. Adele foi a mesma coisa. Sem sal… seguindo formulas completamente obvias, totalmente pre produzido, zero autenticidade. Moro na Inglaterra e converso demais sobre musica com o pessoal aqui, no geral, todos acham ele bem mediocre mesmo tambem. E existe ate uma certa revolta velada sobre como as grandes produtoras tentam enfiar goela abaixo um produto. Harry Styles foi meticulosamente planejado para agradar a media. E nem vamos falar de conhecer artistas novos pois a lista de coisa boa e nova surgindo e imensa, a musica esta mais viva do que nunca, passa muito bem, e bem longe desse tipo de pseudo artista.
boto fé nos menino desde Little Black Dress, o respiro à Big Star pros tios que iam levar as crianças pra ver 1D