Séries: “Touch”

por Herbert Moura

Quando se fala em Tim Krig é impossível não recordar de “Heroes”, série que fez grande sucesso em 2006, mas foi cancelada sem ter propriamente um fim. No entanto, em 2013, o criador tentou se redimir com “Touch”, que traz Kiefer Sutherland (“24 Horas”) como protagonista e conta com participação de Maria Belo (“E.R.”). A série foi transmitida pela FOX na época e ficou disponível ano passado no Netflix.

“Touch” traz a narrativa de Martin Bohm, um ex jornalista cuja esposa faleceu durante o atentado do 11/9, e que tenta criar um filho diagnosticado com autismo sozinho. Jake (David Mazouz) tem 11 anos e nunca proferiu uma palavra, tornando a comunicação um pouco complicada para Martin, que desistiu de sua carreira promissora no New York Herald para focar nos cuidados com o filho. A dificuldade de lidar com o menino é ainda elevada, pois Jake não permite que o toquem.

Apesar do drama, a trama não foca apenas na relação complicada entre pai e filho, o propósito vai além, incluindo discussões matemáticas e até metafísicas. Isso porque Jake, apesar de não falar, tem uma maneira bem peculiar de se expressar: pelos números. Jake aparenta uma certa obsessão com sequências e padrões, o que não parece ser algo surpreendente, tendo em vista a associação do autismo com desempenhos matemáticos elevados. Mas isso atinge outros níveis a partir do momento que Martin consegue compreender o garoto através de uma série de números recorrentes ao seu redor, que coincidem com os que Jake escreve repetida incansavelmente em seu caderno. O pai se vê levado a seguir “pistas” incertas que o levam a diversas descobertas e a resolução de problemas que foram relatados ao longo do episódio, envolvendo pessoas localizadas ao redor do mundo.

Diversas locações figuram em “Touch”, então vemos afegãos, japoneses, italianos, franceses, espanhóis e até brasileiros! Ao longo de cada episódio, o espectador descobre as relações entre plots que foram colocados e a princípio não tinham uma ligação sequer, e cujos personagens não compartilhariam nem do mesmo território nacional ou língua. Por exemplo, o fato de um inglês ter perdido o celular no aeroporto acabar por salvar a vida de um menino obrigado a vestir um traje explosivo no Afeganistão não é uma pura coincidência.

Uma das teorias que sustenta a série remete àquela de que uma ação, por menor que seja, pode culminar em eventos catastróficos, ou fortunos, no outro lado do mundo, e alterar o destino de desconhecidos. Esses preceitos são recorrentemente remetidos ao Efeito Borboleta, o que já é algo conhecido do público, e que vira e mexe recebe releituras por meio da indústria do entretenimento, como o filme de mesmo nome. No caso de “Touch”, como o menino consegue ver as conexões, ele tem um certo controle sobre o desdobramento dos fatos, mas precisa da ação do pai para que tenham um desenrolar positivo.

Além de usar esses conceitos relacionados à teoria do Caos, as ciências exatas lideram o roteiro, mas questões religiosas e mitológicas também são inseridas posteriormente para explicar as “habilidades” do menino. Os diferentes números e sequências colocados a cada episódio estão presentes em diversas cenas e elementos ao longo dos 45 minutos, e acabam por ser usados para guiar o caminho do protagonista, tanto figurando como conceitos mais palpáveis e conhecidos como probabilidade e a matemática por trás dos jogos de cartas, até os mais quase sobrenaturais, em que Jake parece prever o que está por acontecer, mas supostamente apenas porque ele enxerga os padrões que estão ali na natureza, os quais pessoas comuns não conseguem identificar, e os codifica em símbolos, seja numéricos ou formas geométricas.

Realmente alguns matemáticos conseguem identificar esses padrões, como o famoso descritor da sequência que leva seu nome, Fibonacci, bem explorada na série, e cujo padrão está ligado à proporção áurea, uma constante algébrica que pode ser encontrada em diversos elementos da natureza, como em uma concha, nas pétalas de uma flor, e no corpo humano.

A partir do momento que Martin entende essa forma de comunicação do filho, ele se sente mais conectado e disposto a fazer de tudo para seguir e resolver o “enigma” dos números da vez. No entanto, há um elemento que dificulta a sua vida, a intervenção de uma assistente social que faz de tudo para tirar a guarda de Jake dele – mais pra frente descobriremos a verdadeira intenção por trás de suas atitudes, o que eleva o drama a algo muito maior e mais perigoso, e que ele não é a única criança especial de quem estão atrás.

Algumas conexões podem parecer forçadas a um primeiro olhar, mas fazem sentido no universo da série de que tudo faz parte de uma grande trama, que pode se embaralhar, dar nós, mas sempre dá um jeito de se manter consistente, e de que a vida de alguns indivíduos está interligada inevitavelmente. Apesar de levantar questões interessantes e ser um bom entretenimento, por ter apresentado um déficit de audiência na segunda temporada, foi cancelada. Entretanto é uma produção que vale a pena conferir, pois uma vez engajado na história, provavelmente vai querer acompanhar a busca por respostas e saber em que todas aquelas ligações vão culminar.

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