por Marcos Paulino
“Beat it laun, daun daun/Beat it, loom, dap’n daun”. Esse trecho de “Garota Nacional”, música que se tornaria a mais popular de “O Samba Poconé” (1996) , terceiro disco do Skank, foi cantado à exaustão por quem tem mais de 30 anos. E não só no Brasil: a faixa, uma das 11 do álbum, levou a banda mineira a fazer shows em 14 países. Mas “Garota Nacional” não está sozinha no amontoado de hits gerados por esse trabalho. “É uma Partida de Futebol” e “Tão Seu” são algumas provas disso. Juntos, todos esses sucessos fizeram o disco vender 2 milhões de cópias no Brasil e mais de 100 mil no exterior.
Na época, o Skank ainda era uma banda nova no mercado: o primeiro disco, “Skank”, saiu em 1992 (cravando sucessos como “In(dig)Nação” e “O Homem Que Sabia Demais”), e o salto foi dado com o segundo disco, “Calango”, que trazia Dudu Marote na produção e, ancorado no sucesso de várias canções (“Jackie Tequila”, “Te Ver” e a versão de “É Proibido Fumar”, de Roberto e Erasmo, entre várias outras), bateu a marca de 1 milhão e 200 mil cópias vendidas. O que poucos esperavam era que seu sucessor, “O Samba Poconé”, também produzido por Dudu, fosse ainda mais longe.
Para comemorar os 20 anos do lançamento de “O Samba Poconé”, Samuel Rosa (voz e guitarra), Henrique Portugal (teclados), Lelo Zaneti (baixo) e Haroldo Ferretti (bateria) lançaram um álbum triplo, que inclui, além das canções originais, demos, remixes, instrumentais, versões alternativas e faixas descartadas. Trata-se de um item para colecionador. Ou para quem quer entender melhor como foi o processo de gravação de um disco que se tornou um marco no mercado da música brasileira, como explica Henrique nesta entrevista.
Voltando 20 anos no tempo, como você se lembra do cenário da época em que “O Samba Poconé” foi lançado?
A gente estava vindo do “Calango” (1994), com muitas músicas conhecidas, um disco que funcionou muito bem (vendeu 1 milhão e 200 mil cópias), e tínhamos feito uma turnê enorme. Como tínhamos viajado muito pelo Brasil, estávamos com referências fortes e frescas do interior. Estávamos com a faca nos dentes, muito preparados, com uma boa estrutura por conta de um disco que vendeu bastante. O “Samba Poconé” traz coisas que não tem até hoje no Brasil: é um disco de uma banda de pop rock brasileira, que tem uma música em espanhol, outra falando sobre sem terra e um rap em francês.
Vocês esperavam que o “Samba Poconé” fosse alcançar ainda mais sucesso que o “Calango”?
Posso falar em nome de todos do Skank: nem em sonho! A gente jamais imaginou. Se o “Calango” levou a gente pro Brasil inteiro, o “Samba Poconé” levou a gente pro mundo.
O que tinha na amálgama que deu origem ao disco que o fez dar tão certo?
Se a gente soubesse, continuava fazendo do mesmo jeito. [Risos] Na verdade, é uma sincronia de várias coisas. A gente até brinca que se “Garota Nacional” tocou tanto no mundo inteiro sem a internet, imagina agora.
Foram 14 países na turnê do disco, muito em função do carro-chefe, justamente “Garota Nacional”. Na sua visão, por que uma música brasileira fez tanto sucesso em lugares tão diferentes uns dos outros?
Isso é uma coisa interessante. Na Espanha, “Garota Nacional” tocou só em português, mas na América Latina tocou em espanhol. Música é assim. A gente gosta de música anglo-saxônica, mas a minoria da população brasileira entende as letras. Confesso que em muitas não consigo entender o que o cara está cantando, mas a música é legal. Na Europa, principalmente, que está acostumada com a mistureba de idiomas, não faz muita diferença em que língua a letra está sendo cantada. O mais importante é que a música seja boa, e “Garota Nacional” é muito interessante. Naquela coisa do “beat it laun, daun daun”, não interessa a língua.
O Haroldo guardou as demos do “Samba Poconé” nessas duas décadas. Isso é normal, ou ele teve a intuição de que um álbum como este que vocês estão lançando viria a acontecer?
Acho que são as duas coisas. O Haroldo sempre foi o nosso arquivista, temos material bem interessante de outros álbuns, como músicas que não entraram em discos. Entre elas, a “Minas com Bahia”, que a Daniela Mercury gravou. Temos, por exemplo, uma versão do “Cosmotron” (sexto disco de estúdio, de 2003) em que a mixagem foi feita pelo Tom Capone, não a que foi pro álbum. Nosso primeiro álbum (“Skank”, de 1992) tem duas mixagens e remasterizamos aquela da nossa versão independente. Não estamos na música por uma questão de moda, mas porque gostamos e é o que sabemos fazer. E, consequentemente, vivemos disso. Então temos muito cuidado com tudo o que fazemos. Temos arquivados ensaios, pré-produções. Neste álbum triplo, o primeiro disco traz o original remasterizado, o segundo, a pré-produção, e o terceiro é o desdobramento do êxito do “Samba Poconé”. Neste último, tem, por exemplo, a versão de “É uma Partida de Futebol” que foi pra Copa do Mundo e a versão em espanhol. Esse disco tem várias versões que não estavam na nossa discografia original.
Você acredita que um álbum triplo, sem material inédito, é um documento que vai atrair só quem é muito fã da banda ou pode alcançar também uma galera mais nova, que talvez ainda não conheça esse trabalho?
Nesta época em que tudo é tão rápido, a música mudou em termos de valores pras pessoas. Quando lançamos o álbum, não tinha internet, aplicativos, TV a cabo, essa coisa toda. A música tinha um papel diferente na vida das pessoas. Hoje, pra mim, há duas categorias: as pessoas que buscam os sucessos e as que gostam de música. Este disco foi concebido pras pessoas que gostam de música ou que tenham alguma ligação emocional com ele, afinal ele foi muito significativo pelo poder de alcance que teve. E também serve pra uma banda nova descobrir como o Skank trabalha em estúdio. Por exemplo, a versão de “Garota Nacional” que tem no segundo disco é muito interessante porque o Samuel canta em outra divisão rítmica. Dá pra ver como ele estava preparando pra chegar à versão final, como se fosse o esboço de um pintor ou os traços de um arquiteto na hora de projetar alguma coisa.
Vai ter uma turnê desse disco?
A gente tem feito um set de nove músicas desse álbum no meio do show. O mais legal é ver as pessoas pra quem essas músicas tiveram uma importância emocional na época do lançamento vibrando, se abraçando na plateia. Dá pra ver isso do palco, é muito legal! Já fizemos Belo Horizonte, Rio e São Paulo e os shows estão muito legais, lotados, as pessoas felizes. Você percebe no ar uma leveza, essa coisa de buscar uma memória emocional.
Vocês estão planejando um novo disco de inéditas?
No primeiro semestre do ano que vem, vamos estender a turnê do “Poconé” principalmente pra outras capitais. E devemos fazer um registro ao vivo do álbum, porque não fizemos na época. Isso deve acontecer provavelmente em maio, no Circo Voador, no Rio. E estamos nos preparando pra entrar em estúdio no final de 2017.
CD 1
1. É Uma Partida De Futebol
2. Eu Disse A Ela
3. Zé Trindade
4. Garota Nacional
5. Tão Seu
6. Sem Terra
7. Os Exilados
8. Um Dia Qualquer
9. Los Pretos
10. Sul Da América
11. Poconé
CD 2
1. Zé Trindade (Ensaio)
2. Um Dia Qualquer (Ensaio)
3. Los Pretos (Ensaio)
4. Sem Terra (Ensaio)
5. Eu Disse A Ela (Demo)
6. Zé Trindade (Demo)
7. Garota Nacional (Demo)
8. Sem Terra (Demo)
9. Os Exilados (Demo)
10. Um Dia Qualquer (Demo)
11. Minas Com Bahia (Demo)
12. Los Pretos (Demo 1)
13. Los Pretos (Demo 2)
14. Sul Da América (Demo)
CD 3
1. É Uma Partida De Futebol (Versão 2)
2. É Uma Partida De Futebol (Versão 3)
3. É Uma Partida De Futebol (Versão 3) [Instrumental]
4. Eu Disse A Ela (Mix Alternativa)
5. Eu Disse A Ela (Instrumental)
6. Garota Nacional (Take 1)
7. Chica Nacional (Garota Nacional)
8. Tão Seu (The Horny European)
9. Tão Seu (The Note So Late Jungle Voyage)
10. Tão Seu (A Stroll Trough The Park)
11. Minas Com Bahia
12. Sul Da América (Instrumental)
13. Poconé (Remix)
14. Poconé (Remix) [Instrumental]
15. Poconé (Mix Alternativa)
– Marcos Paulino é editor do caderno Plug (www.mundoplug.com), da Gazeta de Limeira.