por Renan Guerra
Lembra quando, há uns 15 ou 20 anos atrás, você ligava o rádio e ouvia muito rock nacional, do tipo que todo mundo sabia cantar pelo menos o refrão? Então, se esse mundo ainda existisse hoje, você ligaria o rádio e poderia ouvir facilmente o Selvagens à Procura de Lei.
A banda cearense, atualmente radicada em São Paulo, tem todos os elementos para ficar ecoando em sua cabeça: um rock bem brasileiro, que mescla reggae, ritmos regionais e outras coisitas no meio aliadas a letras interessantes, com refrãos pegajosos, que funcionam de forma inteligente, seja em seus momentos mais românticos ou mais politizados.
Com o epíteto de “principal banda de rock de Fortaleza da atualidade”, a Selvagens já tem uma carreira sólida, com três discos lançados, passagens por grandes festivais nacionais e um público bastante fiel. Seu terceiro disco, “Praieiro” (2016), foi produzido através de crowdfunding e é a certificação da qualidade dos caras, que visam agora encontrar novos públicos e levar seu som para espaços ainda maiores.
Para saber mais sobre a produção do novo disco, a mudança para SP e a cena cearense, o guitarrista e vocalista Gabriel Aragão bateu um papo com o Scream & Yell. Confira!
A banda agora está toda radicada em São Paulo. Como isso influenciou na produção desse novo disco? Vocês estão todos morando juntos por aqui?
Na época em que escrevemos o “Praieiro” (2016), sim, estávamos todos morando juntos na casa da banda em Sampa, o que influenciou bastante o processo de composição do disco. Hoje, as coisas mudaram, eu me mudei, o Rafa também. Estamos entrando em mais uma nova fase.
A decisão de mudar-se para São Paulo chegou em que momento? Vocês ainda acreditam que é muito difícil fazer rock em estados afastados do eixo Rio-São Paulo?
Na verdade, o rock está muito bem e muito vivo no Nordeste! Basta observar a quantidade (e qualidade) das bandas que têm surgido nas capitais nordestinas nos últimos 6 anos. A questão da mudança para o eixo Rio-SP é tanto de logística quanto de contatos. É preciso respirar São Paulo. É preciso estar em contato com pessoas do meio. Aliás, o fato de uma banda nordestina ter que sair da sua terra natal torna o artista mais forte e dá mais garra.
Mesmo estando em São Paulo, como anda a relação de vocês com a cena musical de Fortaleza? Há bandas de lá que vocês têm ouvido bastante e trocam influências?
A cena de Fortaleza tem crescido muito nos últimos anos. Houve um boom por lá. Muitos artistas vieram morar em São Paulo. Os próprios Selvagens, Otto Gris, Soledad Brandão, Jonathan Doll… Isso sem falar na galera que veio antes da gente como o Cidadão Instigado, Vitoriano, Saulo Duarte e a Unidade, Daniel Peixoto, Daniel Groove… E tem outra turma que tá criando espaço na cidade ainda como o Projeto Rivera, Astronauta Marinho… Enfim, tem uma cena muito foda rolando há alguns anos em Fortaleza.
A sonoridade desse disco obedece um linha roqueira bem definida, porém a cada faixa vocês flertam com outras sonoridades. Como foi esse processo de unir tantas referências? A produção do David Corcos foi fundamental para isso?
A cada disco queremos fazer algo que nunca fizemos no próximo. Não queremos nos repetir. “Praieiro” já nasceu dessa premissa. Queríamos namorar com sons nordestinos, reggae, transmitir calor, fazer dançar, escrever letras leves mas incisivas, bem humoradas mas críticas. As músicas já estavam prontas. O David Corcos, nosso parceiraço desde o segundo álbum da banda, foi fundamental. Ele nos instigou a chamar outros músicos, coisa que até então não tínhamos feito. Por isso o disco está recheado de percussão (gravado pelo incrível Jota Erre), teclados… Foi uma experiência muito rica e plural pra gente.
O álbum foi produzido de forma independente e com auxílio dos fãs, através do financiamento coletivo. Em que momento vocês optaram por essa forma de produção e como isso se refletiu dentro do disco? Falando nos fãs, vocês possuem um público que acompanha a banda de forma bastante fiel, como é essa relação de vocês com eles?
Vivemos num período de transição na música e isso se reflete através das campanhas de financiamento coletivo. “Praieiro” foi feito assim. Dentro do disco, se reflete com músicas pensadas em como soariam ao vivo. Elas ganham uma força enorme. Nossa relação com os fãs sempre foi muito próxima, desde o início. A Mucambada, como eles se chamam, é apaixonante e está espalhada por todo o Brasil, mas muito unida nas redes. Já teve fã de SP que veio ver show em Fortaleza e vice-versa, por exemplo. É uma troca de energia muito positiva e que a gente adora fazer parte.
Além do disco “Praieiro”, vocês participaram recentemente da coletânea “Viva Renato Russo 20 Anos”, onde gravaram “Geração Coca-Cola”, uma música muito emblemática do Legião Urbana. Como vocês decidiram por gravar essa faixa? Aliás, ela ganhou um caráter muito próprio dos Selvagens, a ideia era mesmo se afastar da versão original?
A primeira vez que tocamos “Geração Coca-Cola” ao vivo foi no Lollapalooza 2014, logo após Mucambo Cafundó. Deu tão certo que mantivemos isso até na #TourPraieiro. O Giuliano já entrou em contato com a gente falando desse “detalhe” no nosso show. Daí, na mesma época, no aproximamos do Yuri Kalil, um grande produtor (Céu, Cidadão Instigado, Arnaldo Antunes…), e, ao lado dele, quebramos a cabeça de como poderíamos criar uma versão diferente da Legião. Não queríamos repetir a pegada dos caras. É impossível. O melhor que podíamos fazer pelo projeto era dar a nossa cara à música. Mas já tínhamos tanta intimidade com ela que tudo fluiu muito bem e em 2 dias estava tudo pronto. A produção do Yuri foi mágica. Estamos muito gratos com o resultado.
– Renan Guerra é jornalista e colabora com o sites You! Me! Dancing! e Scream & Yell