por Adriano Mello Costa
Ano: 1983. Local: Hawkins, uma pacata cidade dos Estados Unidos sem muita coisa diferente de tantas outras iguais espalhadas pelo país. Hormônios em ebulição nos adolescentes, crianças brincando de RPG e lendo quadrinhos, pais querendo ter o mínimo possível de mudança na vida, nada muito longe do comum e rotineiro. A única situação distinta é que nos arredores da cidade, perto de uma grande floresta, há uma instalação governamental que supostamente tem como foco o trabalho com energia. Supostamente.
Com essa rápida premissa, estreou dia 15 de julho no Netflix a série “Stranger Things”, idealizada e concebida pelos irmãos Ross e Matt Duffer, os Duffer Brothers. Os oito episódios dessa primeira temporada (ainda não há confirmação de uma segunda, mas provavelmente acontecerá) caíram no gosto de milhares de espectadores e o boca a boca em cima da produção fez só crescer ainda mais o interesse. Ou seja, “Stranger Things” virou hype de uma hora para outra. Os criadores, apaixonados pelos anos 80, fizeram um trabalho alinhado com o que acontecia na época não só do lado cultural, mas do lado político e social também.
Olhar para os anos 80 com nostalgia não é algo intrínseco somente aos irmãos Duffer. Tanto no cinema quanto em outras searas, vez ou outra aparece alguma obra que se inspire na época. Exemplos recentes são o ótimo filme “Super 8” (2011), de J.J. Abrams, ou o livro “Jogador No. 1”, de Ernest Cline (também de 2011). A trama de “Stranger Things” tem início quando o jovem Will Byers (Noah Schnapp) some misteriosamente a caminho de casa depois de uma partida de RPG com os amigos e, enquanto a cidade inteira se posiciona na busca, pequenos mistérios vão pingando aqui e ali, dando a deixa para os criadores usarem vastas referências.
A lista de referências é tão extensa que algumas não se consegue pescar logo de saída. Lá estão desde filmes leves como “Os Goonies”, “E.T – o Extraterrestre” e “Conta Comigo” a outros de terror e ficção científica como “Alien, o 8º Passageiro” e “Poltergeist”. A trilha sonora é outra grande sacada. Mesmo tendo uma baba ou outra no meio como Toto e Foreigner, enfileira sons de Joy Division, The Smiths, Echo And The Bunnymen, The Clash e David Bowie. Inclusive, uma das boas falas (que viraram meme nas redes sociais) é quando Jonathan Byers (Charlie Helton) fala para o irmão pequeno que essas músicas podem mudar a vida dele (lembrou de “Hora de Voltar”?).
Pelo hype em cima da série engana-se quem pensa que ela seja somente um pastiche saudosista e prazeroso, ou ainda resida somente na homenagen dos criadores a obras que tenham afinco. “Stranger Things” se sustenta acima disso. Claro que essas correlações são importantes e geram discussões pela internet, aumentando o interesse, contudo mesmo se deixarmos essas questões de lado temos uma série muito superior à média nessa primeira temporada, mesclando humor, terror, fantasia, aventura e suspense de modo singular.
Os blocos separados funcionam sozinhos ou em função do todo. Temos o trio de garotos que acha a garota especial; temos os irmãos mais velhos passando pela adolescência e o que tudo que isso acarreta; temos o xerife angustiado que vê o passado lhe assombrar; temos a mãe a flor da pele que vê o mundo ruir ainda mais do que imaginava, além de outros focos menores. Todos, sem exceção, não apresentam excessos que deixe a trama insossa, ainda mais com as exuberantes interpretações para Joyce Byers (Winona Ryder), Eleven (Millie Bobby Brown) e Dustin Henderson (Gaten Matarazzo).
Na sequência de acertos que o Netflix vem enfileirando, talvez “Stranger Things” seja o maior (e a concorrência é bastante digna). Um dos pontos positivos é que a série é razoavelmente curta, e, talvez por isso, não tem episódios para encher linguiça ou passagens demasiadamente arrastadas, mas o ponto principal é “Stranger Things” tem potencial para agradar todo e qualquer tipo de público. De criança a idosos, passando por adolescentes e jovens adultos, homem ou mulher, alienado ou crítico, moderninho ou velho nerd, “Stranger Things” crava a Netflix como a grande casa das boas séries atuais e, mais importante que isso, mostra que qualidade e aceitação pública podem sim andar de mãos dadas.
– Adriano Mello Costa (siga @coisapop no Twitter) e assina o blog de cultura Coisa Pop
Fazia muito tempo que não via três episódios seguidos de série. A melhor coisa que vi na tv esse ano. Não tenho visto muita rv, mas ok, hahahahaha
Bem bacaninha msm! Diversão garantida.