Entrevista: Curumin

por Bruno Leonel

Uma percussão cheia de ‘ginga’ aliada a instrumentos de corda, junto de várias camadas eletrônicas (Cortesia dos 3 samples MPC usados no palco) que até deixam dúvidas sobre o número de pessoas que está tocando… O resultado é uma verdadeira parede de sons. Ao vivo, a banda tem poucos, mas é impossível não ficar em dúvida se o que estamos ouvindo não é obra de uma fanfarra inteira.

Assim é o som do músico paulistano Luciano Nakata Albuquerque, o Curumin, que mistura elementos de reggae, dub, rap e outras vertentes. Possuidor de uma veia eclética, o cantor – que também é baterista e ‘sampleador’ durante o show – chama a atenção, desde 2005, tanto pela originalidade mostrada em seus discos autorais, como também pela colaboração como músico de apoio de outros artistas (Paula Lima, Arnaldo Antunes, Vanessa da Matta e outros).

Divulgando o quarto disco de inéditas de sua carreira, “Arrocha” (2012), Curumin esteve em Londrina no mês de março, onde se apresentou durante o aniversário de 6 anos da festa Barbada, no Bar Valentino, e conversou com o RubroSom, parceiro do Scream & Yell, sobre o processo de criação, suas influências, além das vantagens de ser um artista independente.

Um aspecto do teu trabalho que é muito marcante é a forma como você mistura ritmos musicais diferentes; Dub, reggae, música eletrônica…. Desde sempre você se interessou por diferentes estilos musicais?
Não sempre. Quando era moleque, já teve época de gostar de Gretchen, Sidney Magal (risos). Passei por muitas fases, mas acho que agora, apesar das várias vertentes, tem uma coisa que é mais específica pra mim que é a música negra e as coisas que vem dela… Então como baterista gosto das coisas com ritmo, do ‘swingado’ dançante, tudo isso me interessa. Esses estilos que você falou, reggae, soul, rap, boa parte da música eletrônica, isso vem tudo dessa área…

Você falou em uma entrevista que o seu irmão, desde pequeno, foi um cara que te influenciou muito, ele sempre te mostrava discos… O que você ouviu na época que te fez querer tocar e fazer sua própria música?
Foi ele quem me apresentou Stevie Wonder! Foi meio que um clique. Comecei a ouvir muito e saquei o caminho que eu queria seguir. Ele foi o artista principal. Lembro até hoje quando meu irmão chegou em casa com o “Innervisions” (1973). Eu conhecia (Stevie Wonder) porque ele fez muito sucesso com “I Just Called To Say I Love You” (1984), mas não tinha uma excelente impressão dele. Apesar de ser boa, “I Just Called To Say I Love You” era muito pop, tocou muito no rádio, eu nem gostava tanto. Mas quando conheci o “Innervisions”, pô, achei louca a capa e quando ouvi deu uma mudança de chaves na cabeça… (risos). Na escola eu já fazia algumas músicas de brincadeira, sempre brinquei com isso.

Você é formado em psicologia, mora em São Paulo (onde nasceu)… Como isso tudo influencia seu trabalho?
Tudo na vida está ali no trabalho. As coisas que aprendi, que vi na faculdade, aparecem ali no meu trabalho.

O que tem rolado no seu som…
Tem uma onda interessante vindo desse pessoal trans, gays, lésbicas… Tem um frescor. Além disso… Ava Rocha, gosto muito do rapper Kendrick Lammar… Cada vez aparece mais música boa…

Você é um músico que se destacou tanto no trabalho autoral como também tocando com outros músicos. Essa coisa de circular nos dois meios acrescenta mais ao trabalho?
Acrescenta muito. Principalmente porque nessa estrada da vida eu sempre toquei com gente muito legal. Ir pra outros lugares, tentar entender outras ideias é sempre muito importante.

“Arrocha”, seu disco mais recente, foi produzido em casa, sem um estúdio enorme que era preciso ser pago por hora. Como foi experimentar a gravação desta forma?
Foi bem gostoso. Isso ocorreu bem na época que minha esposa estava grávida, a casa estava num clima bem legal e havia uma paz mesmo em fazer ali. Tinha uma atmosfera de se sentir bem, havia um clima de trabalho ótimo, todo mundo fazendo o que gostava, feliz em estar fazendo, empolgado em estar experimentando sons. Estar em casa dá muito mais margem para testar coisas também. No estúdio é sempre mais ‘certeiro’, você não tem muito espaço para elucubrar e nem tentar e errar, tem que acertar mais. Em casa eu podia errar (risos).

O “Arrocha” soa mais eletrônico em comparação aos discos anteriores, tem mais samplers… Foi também um resultado da forma de gravação?
Foi sim. Uma coisa puxou a outra. Havia também o interesse pessoal pela programação e, na época, também pelo hip-hop, todo o hip-hop experimental que vinha ocorrendo. Foi o casamento de tentar pesquisar e fazer em baixo custo. A gravação foi rápida, menos de três meses, o que demorou foi mais o processo de arte final, fechar a capa e o resto.

Qual a maior vantagem e a desvantagem em ser um artista independente no Brasil hoje?
A primeira vantagem é você não responder sua música para ninguém. Quando tinha gravadora você precisava responder para o dono do investimento, ele precisava replicar aquele dinheiro que entrou, não tinha uma visão muito musical, a visão era muito “isso vai vender ou isso não vai”. (Agora) a gente não tem essa preocupação. Essa conquista é maravilhosa! Por outro lado, tem todo o trabalho que é ser você mesmo S/A. Você tem que estar presente em todas as etapas do processo, não dá para ficar focado só criando. Quer dizer, para alguns dá. Para os gênios, rola (risos), mas para mim… ainda tenho que ralar um pouco e correr atrás.

O selo Quannum Projects (EUA) ajudou o seu trabalho a ter uma projeção fora do Brasil e você teve contato com o Chief Xcel, do Blackalicious. Como foi a recepção do seu trabalho lá fora? Pessoal viu seu som como algo muito exótico?
Eles têm um mercado que se auto consome, principalmente em relação à cultura norte-americana, onde fui mais com o Blackalicious. A cultura nos EUA sempre foi muito mais de exportar do que de importar coisas. O que eles importavam era com essa ideia de música exótica e (a música brasileira) acabou entrando um pouco nessa categoria, mas acho que hoje mudou um pouco. Por volta de 2005 era mais restrito, mas foi bom do mesmo jeito. A gente percorreu um trilho legal, passaram pra gente muita coisa do hip-hop, fizemos vários shows, foi uma fase muito importante pra gente. Por enquanto não temos projetos de ir pra fora. Ser independente tem isso, de ser mais difícil…

E o próximo disco? Já estão trabalhando em algum material?
Estamos pensando sim, temos já algumas músicas novas feitas. Acho que entre abril e junho devemos nos reunir para trabalhar em mais algumas, talvez com alguma previsão de lançamento para o ano que vem. Esse ano ainda tem Olimpíadas, eleições e tudo mais, mas não precisamos correr. Iremos fazer no prazo que for para fazer bem feito.

Qual sua opinião sobre o download gratuito, o compartilhamento? Isso ajuda a circular mais ou prejudica o artista?
É meio inevitável e é uma mudança da economia do mercado de música. Acho que é importante o artista receber pela execução do trabalho dele. Mas hoje em dia a tecnologia permitiu tanta velocidade de informação que se você burocratizar o acesso para as pessoas você sai perdendo, então não tem muito para onde ir. O MP3 é um formato ótimo, me possibilitou conhecer muita coisa que eu tinha dificuldade de pesquisar, mas como artista eu sei que o problema é esse, de gastar dinheiro pra gravar algo, tem todo um custo emocional para produzir… mas a gente não deixa de trabalhar, isso ajuda as pessoas a conhecerem mais e, de repente, circular mais com o show.

– Bruno Leonel (https://www.facebook.com/silva.leonel.900) edita o site RubroSom

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