por Marcos Paulino
A Pompéia, onde cresceu o sambista Dani Turcheto, emendou com outro tradicional bairro paulistano, a Lapa. Foi essa constatação que batizou, de forma literal, seu novo disco, “LapaemendoucomaPompéia” (2015), produzido por Pipo Pegoraro (que assume guitarras e violões) com mixagem de Gustavo Lenza e participação de Zé Nigro (baixo e sintetizadores), Samuel Fraga (bateria), Edy Trombone (trombone) e Daniel Grawej (Fender Rhodes e Teclado)
“LapaemendoucomaPompéia” (download gratuito) retrata o sentimento de quem retorna ao lar e já não o reconhece mais. Na parte sonora aparece a mistura de pop, rock e outros ritmos ao samba, já tão característica na obra de Dani. Trata-se de seu terceiro disco, depois da estreia com “Sobremesa”, em 2009, e “Madeira Torta”, de 2012, este gravado em Nova York. O novo álbum, com caprichada edição gráfica, foi finalizado após duas excursões para a Europa.
“A gente tem que explorar as várias vertentes do samba”, conta Dani Turcheto em conversa com o PLUG, parceiro do Scream & Yell. “Meu show tem muita guitarra com distorção, de rock’n’roll, de metal. Essas intersecções são o que transformam, que não deixam a coisa morrer”, avisa. Na conversa, Dani fala mais sobre o disco, sobre suas experiências no exterior além de, claro, Lapa e Pompeia. Confira.
Você lançou o disco novo no Minhocão, após passar uma boa temporada na Europa. Você acha que aqui falta aproveitar os espaços públicos como lá?
É fato que na Europa eles usam os espaços públicos de uma forma muito melhor e mais abrangente que a gente. Primeiro, que lá eles demoliram muito menos, então há coisas de 500, mil anos. Aqui, temos dificuldade de manter construções de 100 anos atrás. Lá eles têm muito mais oferta de espaços. E o legal de fazer na rua é que não se determina o público que vai entrar, alcança qualquer pessoa. No meu caso, me senti lançando o disco realmente pro mundo, porque tinha muita gente que chamei, mas também muita gente passando, que ia parando.
Nestas suas viagens à Europa, você sentiu interesse das pessoas de lá pela sua música ou os shows atraíam basicamente brasileiros?
Estive lá duas vezes, uma só com shows do meu disco e outra com um projeto de samba, o Samba de Bolso, que eu e outra cantora criamos pra viajar. Tocamos em Lisboa, Barcelona, Paris e Londres. O meu disco anterior toquei só na Inglaterra. Há diferenças entre os países. Em Portugal, os caras adoram música brasileira, o samba. Em Barcelona, não senti muito interesse, até gostavam, mas sem muita curiosidade. Os franceses se interessam pela música brasileira de qualidade, querem saber o que está rolando aqui. Eles têm um ouvido mais pronto pra nossa música. Na Inglaterra, já toquei nos lugares típicos de música brasileira.
Você já tem como característica trazer elementos de outros ritmos pro samba. Essas experiências internacionais te motivaram a investir ainda mais nisso?
Metade do segundo disco, gravei em Nova York, porque o produtor João Erbetta, que é meu amigo, estava morando lá. No sentido do que você está falando, de influência, foi legal, porque ele chamou pra gravar pessoas que amam música brasileira, mas não são brasileiros. O tecladista, por exemplo, toca aquele órgão Hammond, uma coisa meio da música negra americana, e ele gravou isso nos meus sambas, o que foi super louco. Isso realmente mudou minha música, porque comecei a achar que a gente tem que usar elementos pra fazer a intersecção com o samba. A gente tem que explorar as várias vertentes do samba. No meu disco novo, não tenho o Hammond, mas tenho as guitarras do Pipo Pegoraro, que é quem produziu. Meu show tem muita guitarra com distorção, de rock’n’roll, de metal. Essas intersecções são o que transformam, que não deixam a coisa morrer.
Você não chegou a morar no exterior, mas o novo disco parece ter a ver com visão de quem está voltando e constata sua cidade transformada. Foi essa sua intenção?
Cresci na Pompéia, que acabou emendando com a Lapa. A volta tem a ver com a minha perspectiva de criança, com os barracões que existiam entre os dois bairros, que eu via como muito grandes. Pra mim, os bairros eram muito longe, era uma aventura ir de um pro outro. Depois de velho, a gente vê as coisas com o tamanho que realmente têm e constata que está tudo emendado, os barracões onde funcionavam as fábricas viraram prédios, condomínios. O disco fala de como é difícil reconhecer meu bairro quando volto pra ele.
É perceptível o capricho gráfico que você teve no novo disco, com um encarte que lembra os dos antigos vinis. Só assim pra poder concorrer com as tantas outras formas em que se pode consumir música hoje?
Não sei se a palavra é concorrer, mas fazer uma arte que acrescente àquilo que você está fazendo na música completa o trabalho. Quis fazer o encarte como um HQ porque era apaixonado por isso quando criança. Quis levar pra esse universo multicolorido dos sonhos. O encarte traz uma frase de cada música dentro de um balão, e elas formam uma história. Não acho que o CD físico vai acabar. Sinto isso pelo meu show, quando alguém já estava gostando da música, compra um CD e fica empolgado com o encarte.
– Marcos Paulino é editor do caderno Plug (www.mundoplug.com), da Gazeta de Limeira.