por Marcelo Costa
Caio Bosco chamou a atenção do meio musical em 2005, quando a Radiola Santa Rosa, duo que integrava ao lado de DJ Beto, lançou um belíssimo trabalho, “Disqueria”, album cujo nome era uma homenagem a um sebo da cidade de Santos onde compravam os vinis de R$ 1 que samplearam para usar no álbum. A Radiola Santa Rosa lançou ainda um segundo disco, “Duberia” (2006), antes de encerrar as atividades, e Caio partir para a carreira solo.
O primeiro trabalho solo foi o EP “Diamante”, lançado em 2009, exibia uma veia praieira com reminiscências de reggae e dub unida a scratches, rock e psicodelia. A faixa título cita Vashti Bunyan, uma das artistas mais influentes do free folk britânico dos anos 60. Três anos depois veio o primeiro álbum, “Caio Bosco” (2012), que marca o início de sua parceria de produção com Jim Waters, que tem trabalhos com Jon Spencer Blues Explosion, Sonic Youth e Calexico.
Após outro EP (“Fårö”, de 2013), Caio Bosco chega com seu segundo disco, “Cerebral” (2015), gravado em casa com um Portastudio Tascam 424 de quatro canais e mixado analogicamente por Jim Waters no Waterworks Recording, em Tucson, Arizona. “Cerebral” afina ainda mais a busca de Caio por uma sonoridade própria, com riffs fortes de guitarra embalando influências de reggae, rock, hip hop, psicodelia, surf music e dub. Abaixo, Caio fala sobre o disco.
Conheci seu trabalho ainda com o Radiola Santa Rosa, em 2005, e de lá pra cá você lançou dois EPs (“Faro” e “Diamante”) e dois álbuns solo (“Caio Bosco” e “Cerebral”). O que mudou na sua música daquele tempo pra hoje?
Parece que tudo mudou pra mim daquela época do Radiola Santa Rosa. O jeito que vejo e ouço música, o jeito que crio, componho, escrevo, arranjo, produzo e toco, sofreram uma drástica mudança lá pelo final de 2007 (quando optei por um novo começo com a carreira solo). Não me via mais produzindo rap/ hip hop de maneira nenhuma e, de lá pra cá, canalizei minhas energias para me desenvolver como cantor, compositor e guitarrista. No processo de produção dos meus álbuns e EP’s, fui desenvolvendo e estudando esses fundamentos, e, com esse novo álbum, acredito que estou no processo de construir enfim a minha própria assinatura.
O que você busca musicalmente?
Busco justamente a assinatura, meu próprio estilo e jeito de fazer, a síntese do meu universo musical que gira basicamente em torno de Jazz-Funk, Rare Grooves e Dub Reggae, além de Rock, Soul e Funk Psicodélicos. A minha música depende também de outros universos de pesquisa como artes visuais, arquitetura e cinema, principalmente os de vanguardas e experimentais. Juntar tudo isso em um caldeirão para fazer música popular, mas com sofisticação, é o meu objetivo! Outro objetivo é ser um artista completo dentro da música, arquitetar e ter consciência de todas as etapas dos meus álbuns, dos shows e da minha carreira, para chegar cada vez mais em um patamar mais alto.
“Cerebral” é co-produzido pelo Jim Waters, que tem trabalhos com Jon Spencer Blues Explosion, Sonic Youth e Calexico, e já havia trabalhado com você no disco de estreia, em 2012. Como rolou a aproximação de vocês e o que ele acrescentou à sua música?
sse foi sem duvida um dos encontros mais maravilhosos que tive na vida! Quando estava produzindo o meu álbum homônimo de 2012 e estava pensando em como seria a mixagem, tive o insight de pegar os discos que mais marcaram a minha formação na adolescência e entrar em contato com os engenheiros de mixagens que eu lia escrito nos encartes (olha que maravilha os álbuns em formato físico), e dentre os vários que mandei, o que respondeu e tocou na alma foi o Jim Waters. Ele pediu pra que eu enviasse algumas músicas por e-mail, mandei o Diamante EP e por uma grata surpresa ele adorou! A partir daí surgiu uma parceria com uma admiração mutua. Eu sou fã declarado dele e é uma das pessoas mais generosas da minha vida! Nos meus álbuns a contribuição do Jim é essencial! Ele mixou em sistema analógico, com fitas de duas polegadas, dando peso e profundidade surpreendentes, definindo como será a sonoridade final dos discos. No meu álbum de 2012, o Jim conseguiu transformar o som eletrônico e digital dos beats em MIDI, amalgamado com os instrumentos gravados ao vivo em um álbum muito mais artístico e bonito. No “Cerebral”, que foi gravado analogicamente, senti que o Jim pode explorar e mostrar mais os seus experimentos, os efeitos sonoros foram produzidos com muito bom gosto e sensibilidade. Com certeza, se depender de mim, essa parceria renderá muitos outros trabalhos.
Todas as bases do “Cerebral” foram gravadas na sala da sua casa, e o som é cheio, encorpado. Como é para você gravar o disco em casa?
Sempre preferi gravar e produzir em casa! Uso estúdios quando preciso de coisas específicas, mas sempre procuro deixar as coisas em um ambiente caseiro, talvez por conta da cultura lo-fi dos anos 90 que me influencia muito, além das míticas histórias dos artistas que foram para uma casa, no campo, ou na praia e produziram um trabalho em retiro, parecido com um escritor que se isola pra escrever, isso sempre me fascinou e me pareceu poético. As bases do “Cerebral” foram gravadas inteiramente ao vivo, com os músicos se olhando, em um Portastudio Tascam 424 de quatro canais em uma sala grande em formato L na casa da minha mãe em Guarujá! No corredor maior e estreito, colocamos a bateria e gravamos com um microfone apenas, no corredor menor, microfonei um amplificador valvulado e pluguei uma guitarra “Framus 1965” maravilhosa, o baixo “Fender Musicmaster 1977” foi gravado em linha, mas passando por um cabeçote Ampeg, enquanto o também maravilhoso Suette (um piano elétrico brasileiro dos anos 70) ocupou o quarto canal do gravador. Depois de gravadas as bases, poucas correções e edições foram feitas. A partir disso foram feitos overdubs de guitarras, de sintetizador analógico, vocal e vocais de apoio.
E como é passar toda essa sonoridade conseguida em casa para os shows?
O “Cerebral” foi concebido e planejado para ser tocado ao vivo! Diferentemente dos meus outros trabalhos que a ponte entre os recursos usados em gravações e ao vivo era visível, esse disco novo é levado para o palco mantendo a mesma atmosfera das gravações. Ao vivo me apresento com os músicos que gravaram o disco e que já tocam comigo há muitos anos (formando a banda Caio Bosco Cerebral) e hoje, gosto que a minha música seja feita de maneira orgânica (até mesmo as experiências eletrônicas), com toda a expressão do músico e a interação com o instrumento, com toda gestualidade registrada, de uma maneira mais humana!
– Marcelo Costa (@screamyell) edita o Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne.
Tenho escutado a musica ” O Astro Rei”, uma das minhas favoritas!!!