por Marcelo Costa
Você já viu esse filme: um fotógrafo bate na porta da casa de uma fazenda e é atendido por uma bela mulher, casada, embora seu marido esteja viajando. O fotógrafo e a dona de casa se aproximam, vivem um romance, mas há muita coisa em jogo, vidas de outras pessoas, e eles precisam lidar com isso. Bem, esse é um trecho recortado de “Real Beleza” (2015), novo filme do cineasta Jorge Furtado, e também do romance “The Bridges of Madison County”, de Robert James Waller, que inspirou o filme homônimo de Clint Eastwood, de 1995. Coincidência?
Um dos grandes cineastas brasileiros em atividade, Jorge Furtado envereda para o drama em “Real Beleza”, e o resultado final infelizmente não alcança o alto nível de sua filmografia, ficando muito abaixo do magnifico “Saneamento Básico, o Filme” (2007) e dos ótimos “Houve uma Vez Dois Verões” (2002), “O Homem que Copiava” (2003) e “Meu Tio Matou um Cara” (2004), filmes em que um delicado acento cômico era usado de forma inteligente e crítica, dois adjetivos que ficaram de fora em “Real Beleza”.
O tal fotógrafo atende pelo nome de João (Vladimir Brichta) e a abertura do filme funciona como um prólogo que tenta mostrar (forçadamente) que o rapaz está numa crise profissional e pessoal. Corte brusco e João está acompanhado de seu assistente rodando a Serra Gaúcha em busca de um novo rosto, uma nova modelo. Não há ligação emocional entre o prólogo e o começo do filme, e essa ruptura é a primeira de uma série de decepções estilísticas que “Real Beleza” exibirá em seus 124 minutos de projeção.
O filme segue, e João encontra o rosto de Maria (a estreante Vitória Strada), e a convida para seguir a carreira de modelo. Maria, no entanto, é menor de idade, e precisa da autorização dos pais para viajar, trabalhar e abandonar os estudos. Entra em cena a dona de casa lá do primeiro paragrafo, Anita (Adriana Esteves), mãe de Maria, um personagem inseguro, vacilante e quase sem vida. Pedro (Francisco Cuoco), o pai, completa o núcleo narrativa enquanto a trama óbvia se arrasta, sem emoção e intensidade.
O maior problema de “Real Beleza” parece ter sido a escalação de Vladimir Brichta e Adriana Esteves, que colocam um enorme muro entre si. Ainda que casados na vida real, Brichta e Esteves não conseguem transmitir química muito menos paixão em cena, e as atuações soam terrivelmente forçadas. Essa sensação é ampliada com a entrada de Francisco Cuoco, que parece preencher toda a sala de projeção com sua interpretação. Não à toa, os raros momentos interessantes do filme estão ligados a sua presença em cena, e é muito pouco.
Se as atuações do casal principal deixam a desejar, o roteiro (ponto alto nos filmes anteriores de Furtado) é ainda mais enfadonho, optando por não aprofundar discussões que poderiam render momentos interessantes (sobre moda, artes, educação, machismo, estudo, fotografia) e se resguardando na tola busca pelo final feliz. Se fosse o filme de estreia de um jovem cineasta, “Real Beleza” seria considerado apenas ruim. Colocado ao lado da filmografia pregressa de Jorge Furtado, “Real Beleza” é mais do que ruim, é uma enorme decepção. Nem belo, muito menos real, um desastre.
– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne.
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