por Marcelo Costa
A final do programa de playbacks Superstar definiu Lucas & Orelha como campeões da segunda edição do caça-talentos, relegando ao favorito (nas redes sociais) Scalene o segundo lugar. Apesar de ser uma banda formulesca e ruim, o vice campeonato do Scalene não significa o fim da carreira da banda, e eles tem muita lenha molhada pra queimar – é só seguir os passos de outras bandas ruins que poluíram o mainstream brasileiro no novo século, como a Malta, que está lançando o segundo disco para… que mesmo? Deixa pra lá.
Já a dupla Lucas & Orelha segue como uma versão novo século de Claudinho & Buchecha, e por mais que o (mau) cheiro de fórmula impregne o ar, se eles derem a sorte de cravar hinos com o mesmo potencial de “Quero Te Encontrar” e “Só Love”, sua vitória no programa de playbacks já terá valido a pena. Não confio em nenhuma das canções que eles apresentaram no programa como candidatas a hits do quilate das duas faixas citadas de Claudinho & Buchecha, mas tudo pode acontecer nesse país de muito jabá e pouca memória.
O resultado também não enterra o rock nacional, como muitos afoitos saíram pregando – uma vitória da Scalene poderia ser mais prejudicial, aliás, afinal duas Bandas Malta no mesmo país poderia deflagrar uma nova onda emo, e é melhor não ressuscitá-la. No entanto, nomes como Far From Alaska e Apanhador Só (as duas grandes bandas do país hoje) mais The Baggios, Molho Negro, Lupe de Lupe, Les Pops, Baleia e muitos outras mantém o gênero vivo – basta desligar a TV e procurar bons sons em outros lugares.
Pra não dizer que não falei… ops, gostei de nada, a Versalle já havia me chamado a atenção em 2012. Na época, Vinicius Lemos, responsável pelo Festival Casarão, em Porto Velho, falou: “A Versalle é a nossa banda mais legal, mais pronta, indie rock dos melhores” (leia aqui). Conferi o show depois e escrevi isso: “Prejudicada pelo avançado da hora, a Versalle teve que fazer um show enxuto, de apenas cinco músicas, mas aproveitou cada segundo em uma apresentação empolgante” (escrevi aqui). No ano seguinte os vi de novo e contei aqui. Boa banda.
No meio do programa, uma frase chamou a atenção: “Entre agora e confirme seu voto”, dizia Fernanda Lima, ainda que o playback não tivesse sido solto e a banda ainda não estivesse fingindo estar tocando ao vivo. Essa frase de Fernanda Lima explica o Brasil: é a perpetuação do FlaxFlu. Você não vota porque gosta da música, mas sim pra apoiar determinado artista em detrimento de outro. Não se pensa em projetos, pensa-se em apadrinhamentos. Num momento cada vez mais plural, o programa defende o voto cego. Depois o povo reclama do resultado das urnas.
Outro incomodo da edição foi a nova escancaração do playback. O instrumental de todas as canções do programa são gravados antes e só o vocal é feito ao vivo. Um bando de marmanjo pula pra cá e pra lá fingindo estar tocando para um público que finge que acredita que é ao vivo. Ao assumir isso, de forma inexperiente, dizendo “Galera, a gente precisa do playback” (que foi solto de forma atrasada), Gustavo Bertoni, da Scalene, aceita o cenário como quem diz: “Isso daqui não é real. Nós não somos reais. Divirtam-se”. E tem gente que se diverte.
Sintomático que no final do documentário “Sem Dentes: Banguela Records e a Turma de 94” (2015), de Ricardo Alexandre, que foi exibido no festival In-Edit, o produtor Carlos Eduardo Miranda (que lançou Raimundos), comparando aquela época (início dos anos 90) com o momento atual, diga: “Hoje a gente tem a melhor geração de todos os tempos de nossa música e está cheio de idiota dizendo que não tem nada de bom”. No começo de 2014, em um texto especial para o site português Bodyspace, escrevi algo semelhante (leia aqui).
Ainda assim, a “novidade” da música brasileira permanece refém de um programa de playback de uma rede de televisão, como se tudo que houvesse de mais novo na nossa música precisasse do carimbo de aprovação do programa. Para um público estacionado na zona de conforto (leia aqui), nada mais plausível. E nada mais triste. Scalene não é o futuro do rock nacional. Lucas & Orelha não é o futuro do pop nacional. Eles são apenas uma faceta de um futuro que vem sendo construído por muita gente, felizmente.
De resto, nenhuma surpresa, mas constatações óbvias: o júri formado por Sandy, Thiaguinho e Paulo Ricardo “é simpático, mas incompetente” (usando uma frase do século passado). A música brasileira é muito melhor do que o que aparece no Superstar envelopadinho (e vestido de rock star) num formato de playback para fazer sucesso. No Scream & Yell há uma seção de discos gratuitos para download e 99% do que está ali é melhor do que tudo o que apareceu no Superstar. Se você tiver paciência de descobrir, clique aqui.]