por Adriano Costa
Três documentários disponíveis no Netflix.
“Fontanarrosa – Vida, Pasíon Y Humor”, de Matías Gueilburt (2008)
Roberto Fontanarrosa foi um cartunista e quadrinista argentino que também se aventurou com sucesso em contos e romances. Chamado carinhosamente de “Negro” pelos amigos e familiares, Fontanarrosa era um cara apaixonado pelo que fazia e também pelo time do Rosário Central, oriundo da cidade natal que ele nunca abandonou, mesmo que a carreira lhe suplicasse ir para Buenos Aires. Falecido em 2007, o cartunista criou personagens famosos no seu país como “Boogie, El Aceitoso”, uma forte sátira contra os EUA e contra os preconceitos em geral que convidava o leitor a rir a partir do excesso, e “Dom Inodoro Pereyra”, um típico gaúcho dos pampas argentinos. Na época da ditatura argentina foi um dos que combateram com papel e lápis em revistas clássicas como “Hortênsia” e “Satirícon”, participando depois também da conceituada “Fierro”. Dirigido pelo experiente Matías Gueilburt, “Fontanarrosa – Vida, Pasíon Y Humor” (2008) conta um pouco da trajetória de Roberto Fontanarrosa através de depoimentos de pessoas ligadas a ele. É uma narrativa simples, com acréscimo de outras linguagens visuais, que cumpre o objetivo primário sem se aprofundar muito ou buscar coisas negativas, caso elas existissem. Influenciado pelos quadrinhos argentinos dos anos 50 e pelo italiano Hugo Pratt (de “Corto Maltese”), Fontanarrosa foi um caso raro de sucesso de público e crítica, e até hoje é adorado em seu país por nomes importantes como o impecável Liniers e o premiado diretor José Juan Campanella, que adaptou um texto dele para compor o filme de animação “Metegol” (aqui chamado de “Um Time Show de Bola”, assista ao trailer no fim do texto), sem esquecer nunca também da intensa torcida do Rosário Central.
Nota: 6,5
“Supermensch: The Legend Of Shep Gordon”, de Mike Myers e Beth Aala (2013)
Shep Gordon iniciou a carreira de empresário meio por acaso depois de levar um soco em um motel de Hollywood logo em sua chegada na cidade. O primeiro cliente foi o desconhecido Alice Cooper que teve toda a carreira moldada pelo empresário tendo como ápice discos como “School’s Out” (1972) e “Billion Dollar Babies” (1973). Gordon não sabia muito bem o que estava fazendo, mas foi decisivo para esse sucesso na promoção de atos feitos para chocar e principalmente na teatralidade do espetáculo de Alice Cooper. “Supermensch: The Legend Of Shep Gordon” (2013) é um documentário que trata da vida desse judeu afeito a mulheres, farras, mas honesto e bom de coração. Dirigido pelo ator Mike Myers e por Beth Aala, o filme diverte com histórias bizarras e quase impossíveis, além de expor as armações feitas para alcançar o sucesso, como no caso de um show da cantora folk canadense Anne Murray no lendário Troubadour. A trama ainda passa rapidamente pela vida pessoal de Shep, sua incursão no cinema e pela invenção do chef de cozinha como uma celebridade, mas seu foco mais interessante é dentro do meio musical. Em quase uma hora e meia, “Supermensch: The Legend Of Shep Gordon” conta com depoimentos de Steven Tyler, Sammy Hagar, Sylvester Stallone, Willie Nelson e Michael Douglas, entre outros, numa divertida homenagem de Mike Myers para uma figura bem especial (e que, entre outras coisas, namorou Sharon Stone, o que por si só já vale uma vida).
Nota: 7,5
“Dear Mr. Watterson”, de Joel Allen Schroeder (2013)
Mesmo que você não goste de tirinhas de quadrinhos e ache isso algo sem valor algum, a chance de já ter se deparado (e se divertido) com alguma coisa de “Calvin and Hobbes” (Calvin e Haroldo, no Brasil) por aí é enorme. E olha que, ao contrário de outros ícones como os “Peanuts” de Charles M. Schulz ou o “Garfield” de Jim Davis, o seu criador Bill Watterson nunca liberou os produtos para licenciamento em outras mídias. O documentário “Dear Mr. Watterson” (2013), dirigido por Joel Allan Schroeder, um fanático pelos personagens, se concentra no legado da obra e suas correspondências dentro do mercado, deixando um pouco de lado a vida pessoal do criador, um recluso de carteirinha que deixou de fazer novas aventuras de Calvin e Haroldo em 31 de dezembro de 1995, e desde então quase não apareceu ou deu entrevistas, ressurgindo somente no final do ano passado com uma nova tirinha aleatória para um festival de quadrinhos. Com um início arrastado e preocupante, quando o diretor começa a contar as próprias experiências tornando o filme quase um diário pessoal, o trabalho ganha muito em fôlego quando aparecem outros cartunistas nos depoimentos. Isso eleva o filme para uma análise consistente da obra, das influências, do mercado, do domínio sobre a criação e da comercialização demasiada que tira a fantasia do trabalho e deixa tudo claro demais. Os 40 minutos que tratam desses pontos fazem de “Dear Mr. Watterson” um documentário interessante, não somente para os milhões de fãs da criança travessa e criativa e do melhor amigo, um tigre de pelúcia racional que serve de contraponto para as travessuras, como também para quem gosta do universo dos quadrinhos em geral.
Nota: 8,0
– Adriano Mello Costa (siga @coisapop no Twitter) e assina o blog de cultura Coisa Pop
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