texto por Marcelo Costa
fotos por Liliane Callegari
Muitos, incluindo uma grande maioria de arquitetos, julgam o Memorial da América Latina, em São Paulo, um dos maiores erros da carreira do grande Oscar Niemeyer. Monumento à integração cultural, política, econômica e social da América Latina, situado em um terreno de 84.482 metros quadrados no bairro da Barra Funda, o complexo, um oceano de asfalto com raríssimos pontos verdes, divide opiniões, mas é um ótimo local para festivais de médio porte, sensação novamente confirmada na segunda edição do Coala Festival, no sábado, 14/03.
Organizado pela primeira vez em 2014 por um grupo de amigos que decidiu criar um festival de seus sonhos (que, na ocasião, reuniu os festejados Tom Zé e Criolo com as boas promessas 5 a Seco, O Terno, Trupe Chá de Boldo e Charlie e os Marretas), a segunda edição do festival recebeu um público de 6 mil pessoas e seguiu o padrão caprichado de line-up da estreia com Marcelo D2 de headliner, Bixiga 70 e Otto como grandes atrações e o setor de novidades sendo composto por Saulo Duarte e a Unidade, Mustache e os Apaches e Selton.
Além da parte musical (que ainda incluiu grupos de DJs entre os shows, ótima solução para manter o público ligado), o festival contou com exposições de graffiti, fotografia, estande da Ben & Jerry distribuindo sorvete de graça durante todo o dia e a presença de diversos food trucks resultando numa área de entretenimento bem interessante, com muitas atividades para distrair o público durante a maratona que começou às 14h com muito sol e terminou próximo das 23h com pouca chuva (com a estação de metrô ainda aberta, felizmente).
Abaixo, três shows que o Scream & Yell destaca da programação.
No provavelmente último show no Brasil da turnê “Saudade”, os gaúchos (que moram em Milão) da Selton foram prejudicados pela escalação equivocada, que os colocou como banda de abertura do festival. Com três discos na costas, uma estrada longa de shows e prêmios e presença em listas de melhores do ano (no Brasil e na Itália), a Selton merecia uma posição melhor no line-up, mas, erros a parte da organização, o grupo não decepcionou em um show musicalmente impecável que contou com os melhores números do álbum “Saudade” (“Qui Nem Jiló”, “Across The Sea”, “Ghost Song”, “Drunken Sunshine”) mais a impagável versão de “Eu Quero Mudar”, com o baterista Daniel assumindo a guitarra e causando. O destaque do show foi a primeira execução de “Cemitério de Elefantes”, ótima música inédita que estará no quarto disco da banda, e que mostra que vem coisa boa por ai.
Com cerca de uma hora de atraso (devido a problemas nos shows anteriores), Otto subiu ao palco com “Exu Parade”, do disco “Moon 1111” (2012), e novamente fez um baita show. Sempre acompanhado de um time luxuoso (desta vez com Junior Boca e Guri Assis Brasil nas guitarras, Rian Batista no baixo e Bacteria no teclado – com canja de Ganjaman), Otto fez todo mundo dançar ao som de “Ciranda de Maluco” (de seu álbum de estreia) e “Cuba” (do disco “Condom Black”, de 2001), que trouxe ao cabo um medley festejado da Nação Zumbi (“Da Lama ao Caos” e “A Praieira”). O repertório privilegiou o intenso “Certa Manhã Acordei de Sonhos Intranquilos” (2009), mostrando grandes versões de “Janaina”, “Crua” (bem mais cadenciada) e “Saudade” (“É tão bom cantar uma parceria com Julieta Venegas no Memorial da América Latina”) culminando numa versão poderosa de “Seis Minutos”. Grande show.
Também acompanhado de um timaço, Saulo Duarte mostrou as canções dançantes de seus dois grandes discos, a impecável estreia com “Saulo Duarte e a Unidade” (2012) e o mais variado “Quente” (2014), ambos disponíveis para download gratuito em seu próprio site. A suingante “Na Companhia dos Seus” abriu os trabalhos colocando todo mundo para dançar seguindo o pedido de Saulo: “Vamos fazer um Carnaval”. O chameguinho contagiante de “Manda Ela Comprar Um Iglu”, um dos destaques de seu álbum de estreia, o toque reggae de “Me Dei Conta”, com dois músicos cubanos na metaleira mandando muito bem, e a excelente “Dos Olhos em Diante” colocaram sorrisos no rosto do povo, que dançou cumbia (“Zonzon”) e carimbo (“Um Mistério no Olhar”). Ainda vale destacar a ótima “Cavalo Velho” num show que pode ser resumido numa frase sincera de Saulo Duarte: “A vibe é do amor”.
– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne
– Liliane Callegari (@licallegari) é fotógrafa e arquiteta. Veja mais fotos do Coala Festival aqui
Memorial da América Latina merecia um festival com bandas … latinas. O momento está perfeito. Integração pela ARTE!
Alguém?