por Marcelo Costa
Um evento da grandiosidade da Copa do Mundo abre os olhos de muita gente que, na carona da badalação da competição, sonha faturar “uns trocados” a mais. Porém, a FIFA registrou mais de 1500 nomes no INPE e prometeu acionar judicialmente empresas não patrocinadoras que utilizassem o conteúdo de forma irregular. Desatentos, a turma da Therezópolis ignorou a regra e precisou parar a produção de uma versão especial da cerveja e recolher o material que já havia ido para as lojas a fim de evitar processos (consta que, no total, o prejuízo da cervejaria equivale a 10.800 garrafas). Mesmo assim, outras cervejarias tentaram pegar carona no evento, cada uma a seu modo: a Colorado “reinventou” uma receita, tropeçou no sexismo e viu a polêmica bater à porta com a Cauim Allez Les Bleus. Mais sutil, a Wäls apostou numa homenagem ao Brasil em parceria com a Casa Santa Luzia, de São Paulo. E, bancando a espertinha, a Backer lançou a Brazuca (Brasuca com C era um dos nomes proibidos pela FIFA). Falo de cada uma das três abaixo.
Cercada de polêmica devido a uma propaganda sexista (retirada de circulação), a Colorado também pisa na bola ao querer embarcar na Copa do Mundo mudando o rótulo de uma cerveja – a ICI 01, produzida em 2013 a pedido do restaurante paulistano ICI Brasserie – para entrega-la como novidade exclusiva para o evento futebolístico com novo nome, Colorado Cauim Allez Les Bleus, e novo rótulo, homenagem oportunista à seleção francesa, que escolheu Ribeirão Preto, casa da cervejaria, como estadia no país. O mote são os lúpulos da região da Alsácia, diferencial da receita da ICI 01. De coloração dourada e creme branco de ótima formação e média permanência, a Colorado Cauim Allez Les Bleus destaca um levemente maltado remetendo a pão e trigo. A leveza dos lúpulos franceses se sobressai a adição de mandioca, já diferenciando-a positivamente em relação a Cauim original. Na boca, a entrada é adocicada e a presença do lúpulo francês libera notas florais que equilibram o conjunto. O final traz amargor leve enquanto o retrogosto surge maltado (sugerindo trigo). Bonitinha, mas ordinária.
A mineira Wäls não comete os mesmos erros da Colorado na versão da X-Wäls que produziu a pedido da Casa Santa Luzia, em São Paulo, aproveitando o embalo da Copa do Mundo sem soar oportunista. A turma de Belo Horizonte explica que a “Casa Santa Luzia elaborou com exclusividade um rótulo comemorativo da Wäls em homenagem ao Brasil”, e essa é uma versão menos alcoólica do que a X-Wäls tradicional (4% aqui contra 5% nesta versão), o que de certa forma desvincula uma receita da outra. Como diria outro, tanto deus quando o demônio vivem nos detalhes. No caso desta X-Wäls Casa Santa Luzia, vertida na taça exibe uma coloração dourada e cristalina com creme branco de baixa formação e curta permanência. No nariz, suaves notas florais e herbais surgem em primeiro plano enquanto o malte, discreto, fica na retaguarda sugerindo mel. Na boca, entrada maltada (caramelo) que rapidamente é combatida por um amargor cítrico suave e cativante, que lidera o conjunto sem esconder o malte. O final é seco e suavemente amargo enquanto o retrogosto traz refrescancia e leve cítrico. Muito boa.
Fechando o trio de cervejas brasileiras inspiradas na Copa do Mundo, a Backer Brazuca é uma Bohemian Pilsner que exibe a arte mais voltada ao evento: uma garrafa verde e amarela que traz um mosaico remetendo à bola oficial da Copa de 1970, ano do tricampeonato brasileiro. De coloração dourada e cristalina com creme branco de boa formação e permanência, a Backer Brazuca destaca um aroma suavemente maltado, que é logo prejudicado por oxidação, um off-flavor bastante comum, que lembra papel molhado (neste caso, bastante evidente). A oxidação normalmente é causada pela exposição do mosto da cerveja a temperaturas superiores a 26°C, o que pode prejudicar algum dos itens da receita. O off-flavour também interfere no paladar, que inicialmente sugere doçura de malte, mas logo recebe uma pancada terrosa que pode surpreender quem espera por uma Bohemian Pilsner. O final (deste exemplar) é amargo e terroso. O retrogosto reforça a sensação.
Balanço
A Colorado Cauim Allez Les Bleus nada mais é do que uma receita do ano passado vestida para a Copa do Mundo e lançada como novidade. O golpe baixo – que se estende a peça publicitária equivocada da cerveja – desvaloriza uma receita que consegue a proeza de melhorar a versão original, embora sofra do mesmo defeito: R$ 11 em uma garrafa de 310ml leva cartão vermelho no quesito custo/beneficio. Já a X-Wäls Casa Santa Luzia lembra a X-Wäls tradicional, embora com menos álcool, segundo o rótulo. Refrescante e saborosa, a X-Wals é uma cerveja simples e agradável. Por fim, a Backer (que já há algum tempo não produz uma nova boa cerveja) Brazuca sofreu com o off-flavour de oxidação, que atrapalhou a avaliação do conjunto. Achei melhor deixa-la sem nota. No geral, nenhuma das três cervejas é espetacular, e tanto Wäls quanto Colorado tem cervejas melhores no cardápio. Ainda assim vale a pena um teste comparativo entre a Colorado Cauim e a Colorado Cauim Allez Les Bleus, para notar as diferenças que o lúpulo francês realça no conjunto. De resto, há cervejas melhores para acompanharem (o que resta d)a Copa.
Colorado Cauim Allez Les Bleus
– Produto: Premium American Lager
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 4,5%
– Nota: 2,81/5
– Preço pago: R$ 12 (310 ml)
X-Wals Casa Santa Luzia
– Produto: Standard American Lager
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 4%
– Nota: 2,81/5
– Preço pago: R$ 13 (600 ml)
Backer Brazuca
– Produto: Bohemian Pilsener
– Nacionalidade: Brasil
– Graduação alcoólica: 4,7%
– Nota: —/5
– Preço pago: R$ 16 (600 ml)
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