por Marcelo Costa
Uma das cervejarias artesanais mais badaladas da Holanda na atualidade, a novíssima Emelisse Brouwerij, de Zeeland, no sudoeste do país às margens do Mar do Norte (a cerca de duas horas de Amsterdã), já tem um cardápio bastante elogiado, muito pela fama de seu respeitado brewmaster, Kees Bubberman, cuja reputação conta que em todos os torneios de cerveja que ele participava na Holanda, os demais cervejeiros brigavam pelo segundo lugar. Na vanguarda da nova cena cervejeira europeia, e alinhada com a revolução cervejeira norte-americana, Kees vem provocando o mercado com suas cervejas que utilizam, quase sempre, lúpulo norte-americano. Na linha tradicional há cerca de 12 rótulos entre estilos Pilsner, Witbier, Dubbel e Blond além de uma sequencia de IPA (Black IPA, Double IPA, Triple IPA e Smoked Rya IPA). Há também uma linha chamada White Label, de rótulos experimentais. 18 cervejas da casa chegaram ao Brasil em janeiro de 2014 com preços entre R$ 20 e R$ 28 (330 ml). Abaixo, quatro delas.
A Emelisse Smoked Rye IPA integra a linha Innovation da cervejaria holandesa e traz uma receita com base de IPA, mas com 20% de centeio e 10% de malte defumado. No que diz respeito aos lúpulos, os holandeses optaram pela linha norte-americana Simcoe e Cascade, o que já antecipa certa expectativa do bebedor. De coloração âmbar alaranjada e creme de baixa formação e permanência, a Emelisse Smoked Rye IPA provoca o nariz com notas que, num primeiro momento, remetem a lupulagem cítrica (maracuá) para logo na sequencia ceder à pressão do malte defumado, que domina o aroma com sugestão de fumaça e leve percepção de caramelo, resultando em um conjunto estranho. No paladar, o amargor cítrico esperado de uma boa IPA cumpre seu papel brilhantemente (são 55 de IBU), mas a grande sacada da Emelisse Smoked Rye IPA é a sequencia defumada que impressiona deixando um leve gosto de fumo na boca. O final é áspero, quente, cítrico e defumado enquanto o retrogosto traz amargor em uma cerveja difícil e provocante.
A Emelisse Black IPA, avisa o site oficial, “não é uma cerveja fácil”, mas eles julgam o resultado como “desafiador, emocionante e equilibrado”. Com 60 de IBU e lúpulos norte-americanos Chinook e Cascade chocando sua força com o malte torrado, a Emelisse Black IPA é uma cerveja de coloração marrom escura com feixes avermelhados que exibe uma espuma bege de boa formação e média permanência. No aroma, as percepções da torra que eram esperadas não marcam presença, o que sugere que o malte seja tostado até o limite, e não torrado. Com isso, os lúpulos cítricos alcançam mais espaço ao lado do caramelado do malte concedendo ao conjunto uma sensação herbal que remete a chá preto. Ainda assim é possível perceber as notas cítricas que remetem a maracujá e laranja assim como o caramelo do malte. Na boca, a Emelisse Black IPA justifica a sigla com amargor pontual, mas não acumulativo, o que permite administrar as pancadas cítricas com leve toque de frutas escuras (ameixa) a cada dose. O final traz algo de vinho do porto enquanto o retrogosto reforça amargor e leve caramelado. Boa.
A Emelisse Imperial Russian Stout é uma cacetada de 11% de álcool, 96 de IBU, coloração preta intensa e creme bege escuro de boa formação e média permanência. Na receita, malte torrado e os lúpulos norte-americanos Nugget e Amarillo. No nariz, assim que se abre a garrafa é possível sentir um aroma adocicado e inebriante que remete a baunilha, mas não é só: há chocolate (ao leite e amargo), café, açúcar mascavo, caramelo e um leve toque cítrico que se confunde com o calor do álcool, presente, mas não intimidante. Na boca, há reforço de tudo isso, intensificado. Desta forma, o primeiro toque surge adocicado e rapidamente frutado, mas, praticamente na sequencia, se torna intensamente amargo (o amargor vindo mais da torra do que dos lúpulos, embora estes colaborem) e alcoólico (os 11% vão sendo reforçados e ampliados a cada gole, com uma leve adstringência do lado da língua). O final é adocicado, alcoólico e com notas derivadas da torra remetendo a café e chocolate amargo. O retrogosto é sensacional com álcool aquecendo a boca e trazendo consigo baunilha e leve acidez. Uau.
Da linha White Label da Emelisse, reservada apenas para edições especiais da cervejaria, a Imperial Russian Stout Ardbeg Barred Aged é uma versão envelhecida em velhos barris de uísque da destilaria escocesa Ardbeg, datada de 1798 e responsável pelos premiados uísques Jim Murray. De coloração preta intensa, a White Label Ardbeg Barred Aged mantém os de 11% de álcool e 96 de IBU da versão tradicional da Imperial Russian Stout da casa, mas a diferença já pode ser notada no creme bege, que praticamente inexiste (embora seja possível visualizar a carbonatação na taça). No nariz, as notas alcoólicas levam o bebedor para uma valsa e surgem acompanhadas de um forte amadeirado, que traz consigo bourbon e um melaço que lembra muito própolis. Logo atrás estão as notas derivadas do malte torrado (chocolate bem amargo e café) e, ainda, fumaça. Na boca, o álcool dá as cartas e surge acompanhado de amadeirado e melaço de própolis. O álcool aquece o céu da boca e desce riscando a garganta e deixando para trás um rastro de café, chocolate amargo, álcool e calor. O final fica entre o adocicado e o alcóolico enquanto o retrogosto traz fumaça, baunilha, madeira e própolis. Uau.
Balanço
Os holandeses da Emelisse não estavam brincando quando colocaram o nome da série da qual integra a Smoked Rye IPA de Innovation: a mistura de malte de centeio e, principalmente, malte defumado na receita de uma IPA com lúpulos norte-americanos resulta numa cerveja potente, arisca e bastante peculiar. Minha primeira sensação foi de que, apesar de ter apenas 6.2 de álcool, a Emelisse Smoked Rye IPA é daquelas cervejas de drinkability baixo, difíceis de beber em sequencia. Porém, deve combinar maravilhosamente com pratos assados (fiquei imaginando essa cerveja acompanhando um frango de televisão de cachorro – risos) e deve ser experimentada (é pra isso que os caras estão inovando e levando a receita de cerveja a lugares nunca imaginados). Perto da Smoked Rye IPA, a Emelisse Black IPA até soa comportado, e olha que são 60 de IBU em um amargor considerável, ainda que comportado. A união de lúpulos cítricos com malte tostado rende uma bela cerveja, que se inspira nos EUA, mas não soa tão extrema quanto elas. Ainda bem. A Emelisse Imperial Russian Stout é uma… paulada. Difícil definir de outra maneira. Quer ficar feliz com apenas uma cerveja? Vai nela. Podia ser menos alcóolica no paladar (mantendo os 11%), mas ainda assim é uma baita cerveja. Da IRS para a IRS White Label, linha dedicada aos lançamentos especiais dos holandeses, que no caso das Imperial Russian Stouts significa envelhecimento em velhos barris de uísque (incluindo barris de Jack Daniels). No caso desta em especial, o envelhecimento aconteceu em barris da destilaria escocesa Ardbeg, e o resultado modifica bastante a versão anterior: entram em cena notas de madeira, fumaça, própolis e bourbon, intensificando (e melhorando) ainda mais o conjunto da Emelisse Imperial Russian Stout tradicional. Uma daquelas cervejas para momentos especiais.
Emelisse Smoked Rye IPA
– Produto: India Pale Ale
– Nacionalidade: Holanda
– Graduação alcoólica: 6,2%
– Nota: 3,49/5
Emelisse Black IPA
– Produto: Black IPA
– Nacionalidade: Holanda
– Graduação alcoólica: 8%
– Nota: 3,47/5
Emelisse Imperial Russian Stout
– Produto: Imperial Russian Stout
– Nacionalidade: Holanda
– Graduação alcoólica: 11%
– Nota: 3,93/5
Emelisse Imperial Russian Stout Ardbeg Barred Aged
– Produto: Imperial Russian Stout
– Nacionalidade: Holanda
– Graduação alcoólica: 11%
– Nota: 3,97/5
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