Boteco: da Dinamarca, três cervejas da Mikkeller

por Marcelo Costa

Mais três cervejas da cigana dinamarquesa Mikkeller, que tem mais de 600 rótulos já lançados no currículo, a grande maioria de título experimental. Por este blog já passaram a Mikkeller Grassroots Wheat is the New Hops IPA, Saison Sally e Boogaloo (On Brown Ale Avenue), todas, assim como as três próximas, produzidas na Proef Brouwerij, uma cervejaria de Lochristi, uma cidade próxima a Gent (já que a Mikkeller não tem cervejaria, e precisa alugar maquinário de outras cervejarias para produzir seus rótulos, alguns deles em parceria com nomes como Brewdog, To Øl, Nøgne Ø e Evil Twin, entre outros). Abaixo, três rótulos bastante interessantes da casa dinamarquesa: Mikkeller Sort Gul, uma Black IPA de responsa; a deliciosa Milk Stout; e Monk’s Brew, uma receita devota aos mosteiros de Rochefort e Westvleteren. As três podem ser encontradas com facilidade no Brasil (preço entre R$ 22 e R$ 26, garrafas de 330 ml). Vamos a elas.

A Mikkeller Sort Gul é uma Black IPA, estilo que busca unir o melhor de dois ingredientes: o lúpulo e o malte torrado. Ou seja, espere o amargor, já que o malte torrado, por si só, já garante certo tom amargo que é amplificado aqui pelos lúpulos Amarillo da receita. De coloração preta intensa com creme bege de formação majestosa e alta permanência, a Mikkeller Sort Gul traz ao nariz notas cítricas que podem confundir quem esperava por aromas derivados da torra do malte. Esqueça. O negócio aqui é lúpulo cítrico em notas que remetem a abacaxi e maracujá, mas, conforme o nariz se acostuma, é possível perceber um toque aveludado, quase licoroso, que remete a conhaque (são 7.3% de álcool), alcaçuz e ameixa em calda. Na boca, a textura é suave (distante do licor, que era a expectativa) e aquece a garganta com o amargor intenso de lúpulo cítrico trazendo consigo notas que remetem a café, madeira e açúcar queimado. O final é classudo, com álcool (sem incomodar), café e notas cítricas conquistando a alma. No retrogosto, mais café, chocolate amargo, fumaça e leve cítrico. Demais.

Já a Mikkeller Milk Stout paga tributo a um estilo que une malte torrado com aveia, e, neste caso em especial, lactose. Ou seja, o mais próximo que você irá chegar de um café com leite alcoólico. De coloração preta opaca e creme bege de formação majestosa e alta permanência, a Mikkeller Milk Stout traz no aroma, em primeiro plano, as notas derivadas da torra do malte, que remetem a café intenso e fumaça. Há ainda percepção de chocolate amargo e baunilha. Em segundo plano, as notas derivadas da aveia e da lactose marcam presença criando um conjunto aromático robusto. Na boca, uma doçura encantadora dá às boas vindas, rapidamente, já que o amargor vem na sequencia para equilibrar o conjunto deixando menos percepção de café do que era esperado (embora ele esteja bastante presente), e mais baunilha – em notas adocicadas que remetem, ainda, a chocolate amargo. O café retorna mais intenso no final do trecho, também adocicado, em que o malte torrado risca a garganta deixando para trás leve amargor mais baunilha e leite. No retrogosto, amargor de café, alcaçuz, ameixa e leite. Muito boa.

A terceira Mikkeller deste passeio é uma receita influenciada pela escola belga, principalmente pelas cervejas Quadrupel produzidas pelos mosteiros de Rochefort e Westvleteren: Mikkeller Monk’s Brew. Sua receita une água, maltes (pilsen e pale ale), candy syrup, açúcar mascavo, lúpulos (northern brewer, hallertauer and styrian goldings) e levedura. De coloração marrom escura com creme bege de alta formação e longa permanência, a Mikkeller Monk’s Brew traz ao nariz uma proliferação de aromas que surgem do choque do adocicado do malte, do açúcar e do candy syrup com a potência alcoólica (os lúpulos ficam em segundo plano), resultando em um conjunto aromático adocicado e levemente picante. Na boca, o dulçor é intenso e os 10% de álcool cumprem a função de contrabalanço que, normalmente, é atribuída lúpulo – alguns devem confundir a profundidade alcoólica com amargor. Na memória gustativa há leve remissão a frutas escuras (ameixa e uvas passas) e madeira em meio ao domínio de açúcar mascavo, baunilha e caramelo. O álcool é intenso, perceptível e aconchegante, aquecendo a garganta. O final é intenso, alcóolico e melado, e se junta ao retrogosto, inesquecível. Felicidade.

Balanço.
A Mikkeler Sort Gul é… puro amor, uma cerveja classuda com notas que valorizam o lúpulo cítrico, sem perder a característica do malte torrado, que torna o conjunto algo próximo a conhaque, mas menos licoroso, e mais aconchegante. Apaixonante. O mesmo pode ser dito da Milk Stout, cuja receita une água, malte, aveia, lactose, lúpulo e levedura. A torra do malte confere ao conjunto um aroma intenso, mas a lactose consegue amaciar o amargor torrado num conjunto que remete a um leve café com leite com uma dose de uísque. Uma cerveja bastante aconchegante. Fechando o trio, Monk’s Brew, uma releitura dos dinarmaqueses para o estilo Quadrupel (da Rochefort e Westvleteren): 10% de álcool e muito dulçor aproximam esta Monk’s de uma barley wine. Seu painel aromático e gustativo é excelente, ainda que, talvez, muito adocicado. É daquelas cervejas para serem apreciadas com calma e cuidado. E sorriso no rosto. Há versões dela envelhecida em barris de vinho tinto, com cranberries e bourboun. Eu quero.

Mikkeller Sort Gul
– Produto: Black IPA
– Nacionalidade: Dinamarca
– Graduação alcoólica: 7,3%
– Nota: 4,07/5

Mikkeller Milk Stout
– Produto: Milk Stout
– Nacionalidade: Dinamarca
– Graduação alcoólica: 6%
– Nota: 3,70/5

Mikkeller Monk’s Brew
– Produto: Belgian Quadrupel
– Nacionalidade: Dinamarca
– Graduação alcoólica: 10%
– Nota: 3,94/5

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