Discos do Ano #04
“Shaking the Habitual”: Intrigante
por Tiago Ferreira
Artista – The Knife
Álbum – “Shaking the Habitual”
Lançamento – 05/04/2013
Selo – Rabid
Taí uma coisa que nunca entendi: quando dizem que um disco é coeso. Na avaliação de quem está produzindo a obra talvez haja sentido, já que é o criador que estabelece a linearidade ou não de seu produto – ou arte, entenda como quiser.
A impressão que tenho é que usar o termo ‘coesão’ tem mais a ver com o vício que nós, avaliadores, temos do que tem a ver com o verdadeiro sentido de um produto/arte. Indo por essa linha de raciocínio: o que não é coeso, é ruim? O que foge dos nossos padrões de entendimento de uma obra é, necessariamente, algo a ser descartado?
Bom, se assim for, minha primeira dica é que passe longe do novo disco do The Knife. “Shaking the Habitual”, como o título propõe, já começa quebrando paradigmas na forma em que foi concebido: duas ótimas faixas que abrem o álbum, interlúdios, drones, aflições, mais algumas faixas, alguns respiros e um acabamento questionador. Perdão por entregar o roteiro assim logo cedo, mas uma coisa é certa: o quarto álbum do duo sueco não foi feito para agradar.
E, se não agrada, por que diabos é o disco do ano nesta seção? Ora bolas, que profundidade daremos a uma obra se ela não for, no mínimo, questionadora? Todos sabemos que a música, diferentemente das artes plásticas, está mais presente em nosso cotidiano no sentido de nos proporcionar relaxamento e êxtase do que levantar indagações.
Se intrigar com uma obra é coisa para intelectualoides, diriam alguns. Não é assim, e não tem que ser assim quando o assunto é música. Confesso que já ouvi umas dezenas de vezes ‘Shaking the Habitual” e até agora não tenho uma opinião concreta sobre ele. Ótimo, faixas como “A Tooth For Na Eye” e “Wrap Your Arms Around Me”, apesar de diferentes uma da outra, são regidos por uma linha eletrônica-experimental. “Full of Fire” pode ser a música do ano, fazendo uso de batidas techno como se fossem a manifestação de nossa libido: “Quando você está cheio de fogo / Qual é o seu objeto de desejo”, questiona o refrão, com todos os trocadilhos sexuais possíveis.
Se fosse um apanhado de singles, “Shaking the Habitual” teria falhado em sua missão incômoda. Quem teria a pachorra de baixar uma faixa como a silenciosa “A Cherry On Top”? Ou, sendo mais radical, quem aguentaria esperar o segredo contido nos 19 minutos de “Old Dreams Waiting To Be Realized”?
As referências de “Shaking the Habitual” são tão enigmáticas quanto nossos desejos. O álbum é bem centrado no tema sexualidade que, para o grupo, também está envolvida em nossos afetos, sentimentos e no modo de ver o mundo. Na questão estética, digamos que haja um ponto esquisito entre as ambiências de Steve Roach, passando por Massive Attack (bem perceptível na excelente “Raging Lung”) até se aproximar de alguns elementos do acid-house e do trance.
Geralmente, temos o costume de dizer que um disco pode ou não ficar melhor a cada audição. A exceção de “Shaking the Habitual” é que não há uma assertiva concreta. Até agora, não sei dizer se é bom ou ruim. Mas, se no final, a resposta for negativa, entenda uma coisa: valeu ou não a pena (tentar) desvendá-lo?
– Tiago Ferreira (siga @namiradogroove) é jornalista e assina o blog Na Mira do Groove
Semanalmente teremos um convidado no Scream & Yell escrevendo sobre o disco do ano
Especial Melhores de 2013:
– Disco do Ano #1: “Fade”, do Yo La Tengo, por Cristiano Castilho (aqui)
– Disco do Ano #2: “Random Access Memories”, do Daft Punk, por Rodrigo Levino (aqui)
– Disco do Ano #3: “…Like Clockwork”, do QOTSA, por Mariana Tramontina (aqui)
– Disco do Ano #5: “The Next Day”, de David Bowie, por Carol Nogueira (aqui)
– Disco do Ano #6: “Nocturama”, de Nick Cave & The Bad Seeds, por Gabriel Innocentini (aqui)
– Disco do Ano #7: “Dream River”, de Bill Callahan, por João Vitor Medeiros (aqui)
– Disco do Ano #8: “Foi No Mês Que Vem”, de Vitor Ramil, por Thiago Pereira (aqui)
– Disco do Ano #9: “Tooth & Nail”, de Billy Bragg, por Giancarlo Rufatto (aqui)
– Disco do Ano #10: “13?, do Black Sabbath, por Marcos Bragatto (aqui)
– Disco do Ano #11: “Estado de Nuvem”, de Bruno Souto, por José Flávio Júnior (aqui)
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