por Adriano Costa
Tony Bellotto é um cara talentoso. Quer você goste, quer você não goste, não há como negar isso. Seja como guitarrista e compositor dos Titãs na produtiva primeira parte da carreira – que durou até o álbum “Domingo”, de 1995 – ou em boa parte da vida de escritor iniciada com “Bellini e A Esfinge”, também do mesmo ano de 1995. Pode-se até afirmar que uma atuação profissional substituiu a outra, se formos analisar mais severamente. E enquanto a carreira da banda murcha sofrivelmente, a de escritor ia, na verdade, ganhando mais corpo.
Ia, isso mesmo, ia. Seu novo livro, intitulado “Machu Picchu”, joga contra essa evolução, que alcançou seu ápice em “No Buraco”, de 2010, que apresentava um Bellotto mais leve e divertido na narrativa, usando os recursos da literatura pop das últimas décadas junto a reminiscências da própria vida, onde causos interessantes não faltaram. Essa temática pode ser estendida ao novo livro, mas com a mudança do foco principal para uma família normal do Rio de Janeiro nos dias atuais.
Em “Machu Picchu” somos apresentados ao casal Zé Roberto e Chica, que se conheceram durante os eventos da Eco-92 (para saber mais, clique aqui: http://pt.wikipedia.org/wiki/ECO-92) e daí partiram para um duradouro casamento que completa 18 anos no dia em que o livro se desenvolve. Nesse dia, a cidade do Rio de Janeiro presencia um engarrafamento descomunal e os dois ficam presos separadamente no trânsito, onde aproveitam para passar a limpo o status da vida naquele exato momento.
Acomodação, insatisfação e arrependimentos são as molas propulsoras para esses pensamentos em meio à imensidão de carros parados. É quando vemos que o casamento de Zé e Chica já não anda tão bem das pernas, e a traição dupla é apenas o ponto principal disso. No meio dessa crise – ainda ocultada pelo “bem maior”, Bellotto adiciona dois filhos, uma enteada, dois amantes e mais uma ex-mulher. E assim cria uma sitcom para contar de maneira divertida os dramas e agruras que expõe.
Porém, nesse sétimo romance (e oitavo livro a ser publicado), Tony Bellotto não consegue agradar. Além da trama estereotipada, com um lado bonachão que não fisga o leitor, há um sério problema na obrigação de soar pop, usando referências mil da cultura em geral. Rapidamente dá para contar mais de setenta em um livro curtinho, de apenas 120 páginas. De Dead Kennedys a Zé do Caixão. De Agepê a Henry Miller. Um uso demasiado que ao invés de satisfazer, só consegue incomodar e atrapalhar.
“Machu Picchu” tem novamente como casa a Companhia das Letras e significa para a carreira de escritor de Tony Bellotto exatamente o que o álbum “Sacos Plásticos” significou para os Titãs. Absolutamente nada.
– Adriano Mello Costa (siga @coisapop no Twitter) e assina o blog de cultura Coisa Pop
Leia também:
– “No Buraco” exibe um Tony Belotto espirituoso e bem humorado, por Adriano Costa (aqui)
– “Sacos Plásticos”, Titãs: nem o fã mais ardoroso estará pronto para tamanha decepção (aqui)
– “Cabeça Dinossauro” 25 anos depois: um dos clássicos do rock nacional (aqui)