O Arctic Monkeys continua o mesmo

Você aperta o play e é sumariamente atropelado por… barulho. Uma batida de bumbo aceleradíssima clama por atenção. Uma guitarrinha sacana risca um dos lados do fone até se transformar em quase riff. O baixo de marcação forte, no meio, poderia derrubar um prédio. Confusão. Tudo isso junto causa um estranhamento que exige atenção: “o que está acontecendo”, pensa o ouvinte, enquanto o massacre continua. Essa violência dura pouco mais de vinte segundos, e serve para apresentar “Favourite Worst Nightmare”, segundo álbum do Arctic Monkeys. Trata-se de “Brianstorm”, canção que abre o disco, e o representa como primeiro single. Sem meias palavras: é o single com abertura mais violenta de um álbum de “rock” desde que o Nirvana colocou “Smells Like a Teen Spirit” nas lojas, quinze anos atrás.

Quando a poeira baixa, após os vinte e três segundos de barulho que abrem a música (e o álbum), “Brianstorm” se transforma em uma canção dançante carregada por um baixo marcante, guitarras quadradinhas entupidas de eco, um tecladinho no fundo, e o vocal de Alex Turner bem à frente. O arranjo é esperto e variado. Os riffs de guitarra se repetem, mas a bateria faz vários caminhos diferentes, incluindo o comando de breaks que servem para se olhar para os lados e perceber os destroços deixados pelo chão. “Brianstorm” (não confundir com Brainstorm) conta a história do tal Brian, um anti-herói moderno, amado por uns e odiado por outros. “Alguns querem te beijar, outros querem te chutar”, canta Alex. A tempestade no formato de dois bumbos retorna no final da canção.

Após vender 360 mil cópias de seu álbum de estréia na primeira semana de lançamento, o Arctic Monkeys decidiu não facilitar neste retorno. Em sua primeira audição, “Brianstorm” assusta. O ouvinte só consegue digerir a música ali pela terceira audição, quando ela já entrou em algum lugar do cérebro e irá clamar por repetição. E escolher uma música difícil como “Brianstorm” para primeiro single diz muito sobre a banda. Porque qualquer uma das quatro excelentes faixas seguintes poderia ter aberto o caminho para o disco com mais ‘facilidade’. Porém, o quarteto de Sheffield optou pela via contrária, e jogou no colo do público a canção mais esporrenta e complicada do álbum, o que pode funcionar para delimitar o domínio da banda sobre seu futuro, tanto quanto para testar os limites de aceitação de seu repertório. Especulações a parte, “Brianstorm” é um dos hits do ano.

“Favourite Worst Nightmare” não é só feito de “Brianstorm”. Embora nenhuma das outras onze canções tenha a mesma obsessão pelo barulho – e a mesma qualidade deste primeiro single – ao menos mais cinco canções duelam guitarra a guitarra por sua atenção. São elas: “Teddy Picker”, “D Is For Dangerous”, “Balaclava”, “Fluorescent Adolescent” e “If You Were There, Beware”. Nestas cinco canções o ouvinte poderá observar as principais influências do Arctic Monkeys muito mais lapidadas nesta segunda investida. O rap quase discursivo ganha espaço no som da banda envolvido por batidas funkeadas, mas a melodia vocal também marca presença num interessante duelo. E numa audição cuidadosa será possível perceber ecos de Strokes, Smiths e White Stripes perdidos pelo álbum, quase que na mesma dose. E Queens On The Stone Age, mas bem rápido.

“Teddy Picker” parece saída dos anos oitenta com sua linha de baixo saltitante. “D Is For Dangerous” tem um começo Strokes que é logo esquecido pelo vocal em dueto suingado de Alex Turner com o baterista Matt Helders. É a canção que traz o título do álbum na letra, e uma das que lembram White Stripes (no refrão). “Balaclava”, a próxima, é acachapante. Começa com Alex cantando sobre uma linha de baixo até entrarem os outros instrumentos, em uma freqüência alucinada. Difícil decidir se acompanhamos o vocal ou prestamos atenção na cama instrumental feita por baixo dele, completamente ensandecida. “Fluorescent Adolescent” é outra em que a introdução exala audições de Strokes numa primeira ouvida, mas cujas raízes remontam aos Smiths fase final. Baixo, vocal e guitarra fazem linhas melódicas diferentes que se encontram no refrão pop.

“If You Were There, Beware” é outra das boas canções do álbum a rivalizar em sandice com “Brianstorm”. Lembra algo de White Stripes (novamente, e para ser mais especifico, é a melodia do refrão de “Seven Nation Army”) e tem potencial de single. “The Bad Thing” é outra das que lembram Smiths, agora fase inicial (na letra, Alex culpa o vinho vermelho pela traição) enquanto “Old Yellow Bricks” também tem algo de White Stripes. Esse é o lado dançante de “Favourite Worst Nightmare”. Mas há também calmaria no disco, representado não a toa pelas canções que fecham o lado A e B da versão em vinil do álbum: “Only One Who Knows” (lado A) é uma baladinha sixtie de voz e duas guitarras que conta sobre um romance verdadeiro que não poderia ser vivido nos dias de hoje. “505” (lado B) narra o amor separado por um vôo de 45 minutos. Começa com a voz sobre teclados climáticos, e depois cresce até virar barulho, e morrer.

Com seu segundo disco, o Arctic Monkeys mostra que continua o mesmo. Como bem disse o baterista em entrevista para a revista Bizz, apenas um ano separa “Favourite Worst Nightmare” de “Whatever People Say I Am, That’s What I’m Not”, a estréia recordista. Não mudou muita coisa na vida destes quatro moleques. Eles ainda estão vivendo os 15 minutos de fama proféticos de Andy Warhol. E é por isso que, mais do que mudanças ou evolução, o que “Favourite Worst Nightmare” revela é a mão de James Ford na produção. Muitos acreditavam que o produtor (de bandas como o Klaxons e Simian Moble Disco) fosse levar os Monkeys para o lado eletrônico da força, mas isso não acontece. O que Ford realçou foi o acento funk/rap do grupo. Ele limpou quase toda a sujeira das guitarras, colocou a voz de Alex à frente dos instrumentos, e ao lado dela o baixo, responsável pelo suingue de canções como “Brianstorm”, “Teddy Picker” e “D Is For Dangerous” (e também “Temptation Greets You Like Your Naughty Friend”, b-side do single “Brianstorm”, que conta com a participação do rapper Dizzee Rascal). Assim, as guitarradas ficaram em segundo plano, mas estão por ali fazendo barulho e charme. Com exceção dos tais vinte e três segundos demolidores do primeiro single, o Arctic Monkeys que conquistou a Inglaterra no ano passado ainda é exatamente o mesmo. E isso é uma boa notícia.

Se você é daqueles que se incomodam com o hype em torno da banda, por alguns minutos, feche os olhos e preste atenção na música. O Arctic Monkeys não tem culpa de ser o queridinho da imprensa britânica, do mesmo jeito que não tínhamos culpa de sermos os queridinhos daquela tia rechonchuda que adorava apertar nossas bochechas (argh!) quando éramos crianças enquanto repetia “que bebê fofo, que bebê fofo” (e que hoje, dezenas de anos depois, nem se lembra do nosso nome – hehe). Tampouco, a banda pode ser culpada por ser apontada como o novo Messias do rock por críticos exagerados que enxergam coisas que não existem (ainda). Em dois anos, estes quatro moleques ingleses lançaram dois álbuns acima da média. Eles estão amadurecendo frente ao público (e a imprensa), e estão se saindo muito bem. “Favourite Worst Nightmare” é prova disso, mas você precisará deixar seus preconceitos de lado. E ouvir a música. Ela vale a pena.

“Favourite Worst Nightmare” será lançado no Japão (em edição especial com duas canções a mais: “Da Frame” e “Matador”) no próximo dia 18, na Inglaterra no dia 23, e nos Estados Unidos no dia 24 de abril. A EMI brasileira promete o lançamento simultâneo ao mercado europeu, dia 23. É esperar para ver.

19 thoughts on “O Arctic Monkeys continua o mesmo

  1. Mal o “Whatever say people…” esfriou, lá vem esse novo CD. Os Monkeys estão se levando a sério ou isso é uma tentativa desesperada de não sumir da mídia ou mesmo das conversinhas de indies do subúrbio do Piauí? O que eu ouvi eu achei mais ou menos, mas “505” mata a pau – ainda que só ganhe punch lá por volta dos dois minutos e meio. Vou ouvir mais do disco.

    Como comentei de brincadeira para um amigo, “Only once who knows” é a música mais “emo” de 2007 até agora, rs.

  2. olá amigo Marcelo!…

    os Monkeis estão com tudo mesmo!… com uma música cheia de energia!…

    sobre os passos do Acidogroove…
    a banda foi indicado ao Prêmio Toddy de Música Independente na categoria Revelação com a música Anti Herói…
    para o pessol que quiser votar:

    http://www.premiotoddy.com.br

    abs

  3. Adorei o lance do “lado eletrônico da força”, eheheh.
    O CD é mesmo muito bom. “Teddy Picker” é ótima. Já conseguistes uma versaõ decente de “Balaclava”? Eu não. =(

  4. Você foi descaradamente um fã assumido do Arctic, um tanto quanto “cego” e parcial nessa resenha. Gosto muito do primeiro disco deles, realmente uma pérola pop, mas esse segundo, convenhamos, é como se eles tivessem adicionado umas dez canções ao disco de estréia. Dez canções que variam entre o mediano e o sem sal. Tudo bem, eles não querem revolucionar o rock nem nada, mas, na minha opinião, não passaram no “teste” do segundo disco. O charme o atrativo principal da estréia foi justamente a vontade, o feeling e a honestidade que transbordava cada música, sem contar os criativos riffs rápidos e dançantes. Ouvindo “Favorite…” dá a impressão que ainda está tudo lá, sim, mas com menos fôlego e cansativo (em outras palavras, falta de criatividade mesmo). Brainstorm parece ter sido o único “grito” de inventatividade e inovação que eles conseguiram dar, e acho que por esse motivo foi escolhido para ser o primeiro single. Se houvesse colodado qualquer outra faixa como single, não chamaria a mínima atenção, porque eles ja fizeram tudo isso, e de forma bem mais satisfatória.

  5. Não curto muito arctic monkeys, mas não deixei de ler a matéria. Pra quem gosta é um prato cheio. Só queria ressaltar o trecho em que você citou: canção que abre o disco, e o representa como primeiro single. Sem meias palavras: é o single com abertura mais violenta de um álbum de “rock” desde que o Nirvana colocou “Smells Like a Teen Spirit” nas lojas, quinze anos atrás”, vale ressaltar a música de abertura do Grandes Infiéis do Violins, “Hans”, que começa com uma paulada ensurdecedora. Vou ouvir esse disco novo pra ver se realmente vale a pena.

    Abraço.

  6. Meu caro MAC, achei o disco bom, mas confesso não partilhar de todo esse seu entusiasmo… 🙂
    2007 tem bastante coisa melhor que esse novo Artick Monkeys na minha opinião…
    Abraços..

  7. pois é…acabei de ler algo que explica esse fenômeno que acontece com toda banda ultimamente: /”mal o 1º cd esfriou…”/ é raro aparecer algo na musica ultimamente que não se enjoe ou esfrie…parece que ninguém está se preocupando em fazer algo que dure como beatles, floyd clapton e outros tantos gênios que apareceram. É pena…

  8. Ótima crítica, realmente esse cd é o melhor de 2007 até agora. Eu dei graças a Deus por elem não terem ido pro lado eletrônico, mostraria que eles não tem personalidade alguma, mas graças a Deus não cometeram esse erro.

    Eu achoque aqui no Brasil muita gente pegou um “ódio” exagerado deles por causa do hype. Eu acho irônico isso acontecer com uma das bandas com integrantes mais “tímidos” dos últimos tempos. Acho que o hype chegou aqui antes da música e isso atrapalhou um pouco a aceitação deles aqui.

  9. um disco imediatista, para uma banda imediatista, para um mundo imediatista. nao esperamos nada de novo. esquecimento…

  10. Eu não identifiquei tanto peso assim em Brianstorm, embora seja, de fato, uma música massa…

    E o BRMC, não vai rolar resenh? Tô esperando pra saber as razões desse primeiro lugar….

    []’s

  11. sério, você escreve muito mal. fazia tempo que eu não lia um texto tão ruim sobre um disco, senti vergonha por você, hehe.

  12. Seu parágrafo final foi fundamental pois, convenhamos, a única música realmente que destoa no “Whatever…” é Fake Tales of San Francisco. O resto é apenas mais do rápido e barulhento rock inglês.

  13. O disco não desceu bem de prima , mas agora uns dias depois aconteceu o mesmo fenêmeno que vc descreveu !!! Estou sentindo falta das músicas … preciso trazer o disco para o trabalho urgentemente !

  14. Me chamo Edu, tenho 23 anos e simplesmente achei o cd de estréia da banda, um dos melhores que ouvi na vida. Sangue novo, descontraído, mal produzido, porém super excitante. Daí tive a infeliz idéia de baixar por completo o novo cd dos caras. Botei no mp3 player e tive uma inflez decepção. Ninguém mais do que eu esperava tanto o sucessor de whatever… Cada música parecia um lado b cuspido e escarrado de whatever. Tive a constatação e o desprazer de ouvir esse cd. Infeliz idéia. Não queria dizer isto, mas infelizmente foi apenas uma brisa de verão. Bandinha de apenas 1(um) álbum.

    Ass.: Eduardo Nakamura, um cara que não é indie, nem hype, mas que gostaria e muito que o 2º cd fosse tão bom ou melhor que o 1º. Abraços pra todos!!!

  15. adorei a sua resenha!
    o arctic monkeys é realmente uma boa banda que veio pra ficar. e %!@$&@#se o hype.

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