por Adriano Costa
A pedofilia é uma perversão sexual que resulta em crime na maioria dos países. E é sempre um crime de ação pública: ou seja, sua prática independe da vontade dos pais ou responsáveis pelo menor. A manutenção de relações com crianças que ainda não chegaram à puberdade é uma dor de cabeça constante para a polícia, um comércio que se alastra não só fisicamente, mas que se amplificou através da pornografia pela internet. É baseado nesse assunto e nas suas correlações que o escritor escocês Irvine Welsh (de “Trainspotting”) ambienta “Crime”, seu mais recente romance.
O livro ganhou edição na Grã Bretanha em 2008 e só agora chega ao Brasil pelas mãos da Editora Rocco. Com 416 páginas e tradução conjunta de Paulo Reis e Sergio Moraes Rego, “Crime” mostra um escritor novamente demonstrando relevância após algumas obras medianas como “Se Você Gostou da Escola, Vai Adorar Trabalhar”. Irvine Welsh sai da sua zona de conforto e viaja para Miami na Flórida, nos Estados Unidos, para contar uma suja história policial.
Ray Lennox é um detetive da divisão de crimes hediondos em Edimburgo, Escócia (e já havia aparecido em um livro anterior do autor). Fanático torcedor do Hearts, Lennox está completamente estafado depois de solucionar um caso de um serial killer que seqüestrava jovens crianças, as estuprava, gravava e matava. O caso o levou até o último nível de um esgotamento total e o deixou agressivo e mais dependente de drogas como a cocaína e o álcool.
Vendo o seu estado deplorável, o chefe da divisão lhe manda sair de férias com a noiva Trudi – para descansar e retomar a linha. A noiva escolhe a ensolarada Miami para uma viagem que visa também traçar os planos do futuro casório. Mas Lennox ainda está perturbado mentalmente e dependente de pílulas, e acaba por fim se envolvendo em mais um caso de pedofilia, dessa vez em uma rede que atua usando crianças de três estados distintos.
No universo de “Crime”, Irvine Welsh continua tratando da rede de miseráveis que sempre lhe foi familiar e não deixa de forçar a barra com drogas, álcool e outros vícios e fraquezas do ser humano. Porém, o escritor dá uma certa aliviada e opta por deixar as coisas mais perturbadoras utilizando o lado psicológico dos personagens, variando constantemente entre medo e paranóia, o que deixa tudo cinza, sem saber ao certo o que esses personagens procuram.
Ray Lennox é o típico anti-herói, só que carrega consigo tantos segredos e dúvidas que até para tentar salvar a pátria passa por uma jornada em que não deixa de afogar-se em suas próprias falhas. O tema (bastante) espinhoso escolhido pelo autor é sabiamente explorado e envolve o leitor em uma trama policial que traz surpresas e pessoas completamente vulneráveis em meio a um sol forte e desgastante. Um sol que serviu também para revigorar a literatura de um ótimo escritor.
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– Texto: Adriano Mello Costa (siga @coisapop) assina o blog Coisa Pop