por Adriano Costa
J Mascis é um ícone do rock alternativo norte americano. Por mais que chamar alguém de ícone tenha se tornado um imenso lugar comum, isso pode ser plenamente aceitável no caso dele. A frente do Dinosaur Jr. ele distribuiu distorção e melodia como poucos, criando obras primas como “Bug” (1988) e “Where You Been” (1993). Mesmo quando a banda voltou depois de um longo hiato, continuou cunhando ótimos trabalhos como “Beyond” (2007) e “Farm” (2009).
Em 2011 ele resolveu embarcar (mais uma vez) em um disco solo e para tanto chamou alguns amigos para ajudá-lo na missão. Gente como Kevin Drew (Broken Social Scene), Ben Bridwell (Band Of Horses) e Suzanne Thorpe (Ex-Mercury Rev) participam deste “Several Shades of Why”. A produção ficou com o velho amigo John Agnello, que além do Dinosaur Jr. já trabalhou com Patti Smith e The Hold Steady. Até Kim Gordon (baixista do Sonic Youth) ajudou e riscou as letras da capa.
“Several Shades of Why” traz onze canções e por ser essencialmente acústico pode ser confundido com um disco doce e suave, quando é exatamente o oposto. A temática das canções versa sobre amores perdidos, dúvidas sobre o caminho a ser tomado e um cansaço sobre a vida em geral. A tonalidade do instrumental se inspira bastante nos trabalhos acústicos da carreira de Neil Young (de quem J Mascis é fã confesso) e tem um clima triste e melancólico.
Falar sobre os assuntos descritos acima não chega a ser uma novidade para o músico, que já no trabalho da sua banda sempre os incorporou a onipresente camada de guitarras. Em “Bulbs of Passion”, de “Dinosaur” (1985), por exemplo, cantava que “as lágrimas estão fluindo do amor em seus olhos”. Já em “Plans”, do mais recente trabalho de 2009, as dúvidas também estão presentes em versos como: “eu não tenho nada para ser, você tem alguns planos para mim?”.
“Listen To Me” é a responsável para abrir “Several Shades of Why” e enquanto um violão segura o ritmo com pequenas mudanças ao fundo, J Mascis canta que não pode esperar mais por nada, pois é só dor o que consegue produzir. Na canção que dá nome ao trabalho um dedilhado encobre uma vida onde “não há paz, o conforto é pouco e sem ombro de ninguém”. “Not Enough” traz um tom mais forte de voz e uma pequena percussão, além de refrão levado por um coral.
“Very Nervous and Love” traz uma progressão de notas dedilhadas que crescem e acabam sem aviso. O tom é novamente melancólico e trata de um amor quebrado. “Is It Done” é sobre “a alma espancada” com o vocal em busca de paz, enquanto uma guitarra distorce no final e insere uma dramaticiade que se completa com um dos solos característicos de Mascis. Já “Make It Right” é uma das melhores faixas e exibe uma flauta muito bonita tocada por Suzanne Thorpe.
“Where Are You” é simples e traz novas dúvidas, culpas e vergonhas. Vocal dobrado, climão de balada de estrada e mais um bonito solo de guitarra de J Mascis. “Too Deep” é só voz e violão e tem a única dose de esperança do trabalho, mesmo que esta se acabe em “Can I”, canção caótica e densa que traz Mascis cantando: “Novamente eu estou solitário, solitário o tempo todo”. “What Happened” fecha muito bem o álbum e sai um pouco dos temas anteriores para olhar para a família.
“Several Shades of Why” pode ser entendido sobre diversos ângulos, mas nenhum pode ser descrito como leve ou feliz. Seu criador – que tratava suas crises nas letras do Dinosaur Jr. sobre uma base mais suja e pesada – agora se despe para falar sobre isso apoiado em violões. Michelangelo, um dos maiores artistas da história, certa vez escreveu: “A minha alegria é a melancolia”. J Mascis comunga desse pensamento e o usa novamente para fazer um ótimo disco.
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– Texto: Adriano Mello Costa (siga @coisapop) assina o blog Coisa Pop
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