“Band Of Joy”, Robert Plant
“Que ninguém se engane, só se consegue a simplicidade através de muito trabalho”, Clarice Lispector disse certa vez. Quando “Band Of Joy”, o novo disco do Robert Plant acaba de tocar é mais ou menos a sensação da frase de Clarice Lispector que toma conta. Por mais que o disco exiba produção caprichada e arranjos bem elaborados, no fundo está a simplicidade de folk, do bluegrass, do country americano, além é claro de toda a experiência desse ícone do rock aos 62 anos.
Depois de aparecer com um belíssimo disco em 2007 em parceria com a cantora Alison Krauss (“Raising Sand” a saber), Robert Plant ressuscita o nome da velha banda que tinha com o baterista John Bonham nos anos 60 antes de alçar vôos com o Led Zeppelin, para continuar a vida. Olha para o passado com extremo carinho e monta um disco somente de covers obscuros de bandas como Los Lobos e Low e compositores como Richard Thompson e o grande Townes Van Zandt.
O time contratado para a nova encarnação da Band Of Joy reside em Buddy Miller (guitarrista e co-produtor do álbum), com o qual já havia trabalhado na turnê de “Raising Sand”, Patty Griffin (vocal), Darrell Scott (guitarra acústica, banjo e bandolim), Byron House (baixista) e Marco Giovino (bateria e percussão). A formação esbanja competência para criar a paisagem sonora perfeita para que Robert Plant possa cantar, sussurrar ou até mesmo declamar as canções do trabalho.
“Angel Dance”, canção dos californianos Los Lobos abre o registro em versão poderosa e surpreendentemente diferente, para que os bons momentos não parem de se suceder. “House Of Cards” traz ótimas guitarras, “Silver River” é densa com seus mais de seis minutos, “You Can’t Buy My Love” é um rock encharcado de country, ‘I’m Falling In Love Again” volta o olhar para os anos 50, “The Only Sound That Matters” é um belo folk e “Harms Swift Way” é feita para encantar.
Utilizando boa parte da temática explorada em “Raising Sand”, mas indo além dela, Robert Plant está distante do estereótipo do roqueiro velho que vira uma caricatura de si mesmo e recebe alcunhas nada lisonjeiras. Seus recentes trabalhos indicam não mais uma vontade de conquistar o mundo (apesar de continuar vendendo muito bem) e sim de cantar canções que gosta. Para Plant, a frase de Mário Quintana: “Nada jamais continua. Tudo vai recomeçar!”, parece viva e presente.
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“100 Miles From Memphis”, Sheryl Crow
Sheryl Crow nasceu perto de Memphis, Tennessee, tendo sua infância e adolescência envolvida pela música de gravadoras como a Stax e a Hi Records. Desde que iniciou a carreira como vocal de apoio de nomes como Michael Jackson, costumava citar esse detalhe. Quando iniciou o trabalho solo e emplacou hits como “Al I Wanna Do”, “If It Makes You Happy” e “My Favorite Mistake”, suas canções indicavam que esse envolvimento ficara para trás.
Anos depois, perto de chegar aos 50 de idade, a artista finalmente fez um disco inteiramente dedicado para essa época sonora. “100 Miles From Memphis” (alusão a distância da cidade citada com a que nasceu) é resultado desse, podemos dizer, amor. Sheryl Crow se uniu com os competentes produtores Doyle Bramhall II e Justin Stanley para fazer um disco que remete completamente para os anos 60 e 70, sem esquecer as suas características próprias.
O álbum é recheado de R&B e soul por todos os lados. Longe de parecer oportunista, pois quem conhece sua história sabe do relacionamento com esses estilos, Sheryl Crow talvez tenha criado o melhor trabalho da sua carreira artística. Em “100 Miles From Memphis” encontramos pedaços de Sam & Dave, Otis Redding e The MG’s junto com outros de Aretha Franklin, Al Green e até mesmo de Eric Clapton da fase de “461 Ocean Boulevard”, lançado em 1974.
Começando com o soul de “Our Love Is Fading” onde os metais entram e ditam o ritmo saborosamente, o álbum se estende por mais 10 canções. Em “Eye To Eye” que ostenta um groove reggueiro já visto antes no seu trabalho, conta com Keith Richards incluindo seus riffs a malemolência. Em “Sign Your Name” recria um sucesso de Terence Trent D’arby (lembra dele?) com a ajuda de um pouco afetado e surpreendente Justin Timberlake nos vocais de apoio.
Em “Summer Day” cria aquele pop perfeito sessentista, cheio de “na-na-na-na”, para em “Long Road Home” convidar ainda que timidamente o velho amigo country para a festa. Sheryl Crow levou tão a sério a concepção do disco que lutou por deixar até as letras adequadas para a atmosfera, elas são leves, alegres e sensuais, bem longe do nível crítico e pessoal de “Detours” de 2008. Ela faz de tudo para que o clima soul consiga invadir o espaço que cabe nas músicas.
“100 Miles From Memphis” tem vários outros bons momentos como “Peaceful Felling”, “Stop” e “Roses And Moonlight”. Para finalizar tudo com o clima lá em cima, ainda aparece um bônus com “I Want You Back” do Jackson Five, aqui recriada longe da canalhice e mais perto da homenagem sincera. Mais um registro desse ano que acerta a mão em cheio ao mirar no passado, mostrando que a música americana se veste melhor com roupas mais antigas.
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Adriano Mello Costa assina o blog Coisa Pop
Sorry, mas eu não aguento, tenho que avisar: o nome da Sheryl Crow ta escrito errado no título. Corre lá!
🙂