Ensaios de Amor: Alain de Botton, Mark Webber e Tom Hansen nos ensinam que términos são tão importantes quanto inícios

por Jorge Wagner

Você é uma estudante adolescente que ficou solteira recentemente. Tenta se manter bem saindo com um caso antigo mas, sem motivo aparente, percebe que tudo a sua volta faz lembrar o babaca do seu ex… e chora. Corte. Você é um músico famoso abandonado há pouco tempo por uma das atrizes mais desejadas do país. Como forma de sair da fossa, compõe alguns desabafos e grava o seu melhor disco.

Não há como fugir das desilusões amorosas. Convivemos com elas desde os primeiros anos da adolescência e, se tudo acontecer como normalmente acontece, conviveremos com elas até fecharmos os olhos pela última vez.

São elas, as desilusões, a principal fonte de matéria criativa para toda a cultura pop. Na música, muito antes dos garotos maquiados de hoje fazerem suas lamentações infantilóides do tipo “ela me deixou / quero morrer”, o blues cuidava de falar sobre a mulher que ia embora e sobre a dificuldade de se admitir que um amor foi em vão. A literatura recente é repleta de personagens em maior ou menor grau parecidos com Rob Fleming, do clássico “Alta Fidelidade”, se valendo de momentos dor-de-cotovelo para refletir sobre quem realmente são.

São as idas e vindas do coração que preenchem boa parte dos capítulos das novelas e das séries que vemos na televisão. Em Holywood, dramas e comédias românticas cuidam de oferecer diferentes visões – nem sempre tão diferentes assim – sobre o assunto, engordando a conta bancária de atores como Ashton Kutcher, Drew Barrymore, Ryan Reynolds, Kate Winslet e Cameron Diaz. Aliás, “500 Dias Com Ela”, um dos filmes mais comentados de 2009, tratava exatamente desse tema.

Assim como fez George Lucas em “Guerra nas Estrelas”, demonstrando em filme as teorias sobre a “Jornada do Herói” do mitólogo Joseph Campbell, Mark Webb, diretor de “500”, parece ter feito sua lição de casa, estudando, nesse caso, as teorias do filósofo Alain de Botton apresentadas no livro “Ensaios de Amor”.

cena do filme “500 Dias com Ela”

Nascido em Zurique em 1969 e atualmente radicado em Londres, Alain, uma espécie de Nick Hornby da filosofia (embora rejeite tal comparação), é o que se pode chamar de filósofo pop: querido entre intelectuais e leigos, lido por jovens, convidado para programas de tevês e apontado como um dos principais escritores da Inglaterra. Conta, atualmente, com 10 livros publicados, sete dos quais lançados no Brasil. Entre eles, “Ensaios de Amor” (Editora Rocco, 1993).

Escrito em primeira pessoa, no mais puro tom confessional (daí as comparações com autores como Hornby e Douglas Coupland, por exemplo), “Ensaios” traz mais do que um narrador contando como se apaixonou subitamente por uma desconhecida que sentou ao seu lado num vôo entre Paris e Londres, como esse encontro descambou para um relacionamento e como esse relacionamento seguiu ladeira abaixo, até o inevitável fim. Botton intercala ao romance inicial uma série de questões emprestadas da matemática, da química, da psicologia e da filosofia e citações de Kant, Marx, Nietzsche, Freud e outros, buscando desmistificar as razões pelas quais nos apaixonamos e o conceito de alma gêmea, oferecendo assim alguma esperança para aqueles que acham que tudo perde o sentido quando um relacionamento acaba.

A lição de “Ensaios de Amor” é a de que não devemos confundir o destino de amar com o destino de amar uma determinada pessoa. Que não devemos atribuir um caráter fatalista às coisas que devem ser encaradas como mera obra do acaso. Que não devemos “atribuir um significado cósmico a um simples evento terreno”, para citar o narrador de “500 Dias Com Ela”. “Coincidência. É o que tudo é. Nada mais que coincidência.”

Alain de Botton, assim como Mark Webber e Tom Hansen, nos ensinam que os términos são tão importantes quanto os inícios. Tudo é cíclico, e todos os sofrimentos nos oferecem oportunidades para repensarmos nossos atos, valores, defeitos e atributos. O mundo não acaba. Sempre há um outono depois que o verão se vai.

Enquanto um novo ciclo não se inicia, porém, ao invés de lamentarmos, é sempre bom lembrar da fala do pequeno Gabe Burton, personagem principal de “Little Manhattan”, (no Brasil, “ABC do Amor”): “O amor é um negócio horroroso, é terrível, praticado por tolos. Vai partir seu coração e deixar você na pior. O que sobra para você, no final? Nada além de algumas incríveis lembranças que não se esquecem”. Pois que não esqueçamos!

cena do filme “ABC do Amor”

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Leia também:
– “ABC do Amor” ou um perfeito romântico em inicio de carreira, por Marcelo Costa (aqui)
– “500 Dias com Ela” ou como destrinchar o movimento romântico, por Marcelo Costa (aqui)

5 thoughts on “Ensaios de Amor: Alain de Botton, Mark Webber e Tom Hansen nos ensinam que términos são tão importantes quanto inícios

  1. Se amar fosse tão fácil, ninguém sofreria. Não importa a idade, o sentimento corrói da mesma forma. E dos vários tipos de amor, o platônico me faz mais real, porque por saber ser platônico, esse amor, sofremos à medida que amamos, e sofremos conscientemente!
    JW, parabéms, amigo!
    Muitas publicações virrão….muitas!
    Paula

  2. Perfeito texto!

    Ainda não li esse romance do Botton, mas pensando no queconheço dele penso que é pouco provável que a tremenda semelhança entre os protagonistas de “Ensaios” e “500”seja mero acaso… Hum, sei não! Wells, quero ler o quanto antes, pois “500” foi uma tremenda surpresa. Ultimamente não tenho visto protagonistas românticos tão interessantes como Rob Fleming!

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