Por Murilo Basso
Fotos: Vinicius Salvino

Humberto Gessinger passou grande parte de sua carreira massacrado pela crítica e adorado pelo público. E sempre foi complicado entender essa relação, tanto o culto como seus detratores. É provável que hoje sua música soe um pouco (ou muito) ultrapassada. Mas o fato é que não se trata de um músico perfeito – aliás, longe disso – tampouco descartável.

Trata-se de uma pessoa que teve capacidade para encontrar seu espaço, construir de maneira inteligente uma carreira sólida e teve sim, sua importância, em determinada época. Mais de 20 anos depois de lançar seu primeiro álbum (“Longe Demais das Capitais”, com os Engenheiros do Hawaii) se torna uma pouco incompreensível perceber que Humberto ainda é objeto daquele clichê enjoado “ame ou deixe”. Enfim, de qualquer forma, é muito mais cômodo sair por aí atirando pedras.

Com quase 1h e 30min de apresentação, Gessinger pára, olha diretamente para o público e diz: “Nunca consegui entender essa paranóia toda com o tal ‘entender’. Na verdade, ‘entender’, além de um tremendo desperdício de tempo é uma grande bobagem”. Os bons tempos de “Ouça o Que eu Digo, Não Ouça Ninguém” parecem ter voltado pelo menos por alguns minutos.

Novo projeto de Humberto em parceria com Duca Leindecker (Cidadão Quem), o Pouca Vogal existe no palco e na internet (a dupla já liberou oito músicas para download no site oficial, mas não tem nenhum registro oficial lançado). O show vai muito além de uma apresentação acústica. Dois músicos competentes se desdobram enquanto “passeiam” pelos mais diversos instrumentos.

Humberto aciona um Mid Pedalboard, se arrisca na viola caipira, canta… Duca toca bombo legüeiro, pandeiro, sola na guitarra e prova que é um dos melhores músicos gaúchos. Não é nada tão pequeno, e nem poderia ser, mas ao mesmo tempo não tem nenhuma falsa pretensão em criar ou determinar novas tendências musicais. Acaba estacionando confortavelmente no meio termo.

As novas canções seguem aquela fórmula que todos já conhecem, com uma ou outra mudança quase imperceptível. Perfeitas para integrar o set de qualquer FM por aí. Algumas letras continuam sem muito sentido como: “Quem não sabe finge saber / quando vê o ouro brilhar / quando vê o couro comer / e o besouro voar”, mas ele já não lhe disse que entender é uma grande bobagem? Modas vêm e vão e Humberto continua o mesmo.

Os melhores momentos ficam a cargo de “Além da Máscara”, sedutora a voz e violão, e “Tententender”, com sua boa levada pop e suavidade capaz de despertar sensibilidade e ser agradável aos ouvidos. Além, é claro, de releituras como em “Refrão de Bolero”, “3×4” e “Terra de Gigantes”; o lado mais pop e acessível é exposto, rearranjando e reconstruindo canções.

O que se vê no palco são dois músicos intensamente ligados pelas mesmas convicções musicais e, acima de tudo, felizes. Estão lá porque aquele é seu lugar. Conversam com a platéia, tocando e cantando com prazer. Dividem composições, vocais, instrumentos e produção. Tudo é equivalente, e não há sobreposição de importância. Relevante? Talvez tão relevante como o Engenheiros conseguiu ser em seu contexto. Vai saber. Mas tudo bem parece questão de tempo para que eles também cheguem ao território do “ame ou odeie”. O que importa é que, para os dois, o Pouca Vogal simboliza uma reinvenção. Parece ser viver o agora, sem esquecer o passado. Apenas o deixando um pouco de lado.

Fotos: http://www.flickr.com/photos/vinicius_salvino/

Leia também:
– “Acústico II – Novos Horizontes”, Engenheiros do Hawaii, por Marcelo Costa (aqui)