por André Azenha
colaborou: Tiago Agostini
O Ludov passa por um momento de transição. Depois de ganhar reconhecimento e fazer parte do primeiro time do cenário independente brasileiro, o quinteto formado por Vanessa Krongold (voz e violão), Mauro Motoki (guitarra, teclados e voz), Eduardo Filomeno (baixo), Habacuque Lima (guitarra e voz) e Paulo “Chapolin” Rocha (bateria), chegou a fazer parte do time da Deck Disk, gravadora de médio porte que lançou gente como Pitty e Cachorro Grande, e após um ano de parceria, decidiu voltar às raízes e continuar andando com os próprios pés. “As coisas boas que a gente conseguiu tirar na época do lançamento já passaram, esse ano já estava muito mais morno e então quebramos o contrato”, justifica Habacuque, que enxergou apenas na assessoria de imprensa, o lado positivo da experiência.
Fãs declarados de Mutantes, os músicos participaram de um projeto especial em São Paulo tocando canções de Arnaldo Baptista, Sérgio Dias e Rita Lee, e por contarem com vocal feminino, chegaram a temer a mesma comparação que aconteceu com o Pato Fu, mas foram acalmados por John Ulhoa. “Não tem problema não. Vocês não vão ser estereotipados como novos Mutantes. A gente já é. Esse lugar já é nosso e não vai cair pra vocês”, explica Motoki.
Em um bate-papo com o S&Y, em meio a uma passagem por Santos para uma apresentação no Sesc da cidade junto com os gaúchos da Wonkavision, os rapazes da banda (Vanessa ainda não havia chegado para a passagem do som) analisaram o atual cenário musical independente brasileiro, falaram sobre os preparativos do sucessor do elogiado “O Exercício das Pequenas Coisas” (estréia oficial do grupo, lançado em 2005 pela Deck), mas avisaram: “Não cobrem prazos”. Aliás, o único prazo concedido foi do lançamento do próximo clipe da banda, da música “Dorme em Paz”. Abaixo a entrevista completa.
Vocês começaram de forma independente e tiveram o apoio de uma gravadora média como a Deck por algum tempo. Como foi a experiência de passar por esses dois universos?
Habacuque – Acho que a gente preserva o espírito e a maneira de trabalhar independente e, mesmo tendo o apoio da Deck, nunca deixamos de fazer ou nos permitimos ficar alheios às coisas que gostávamos e nos interessavam. Continuamos trabalhando quase como a gente sempre trabalhou. Claro que no lançamento do disco foi bom contar principalmente com o lance de assessoria de imprensa, que ficaria um pouco trabalhoso pra gente fazer tudo.
Mauro – Ás vezes quando você tem uma facilidade, deixa ela te sobrepor. No caso, ter uma gravadora.
Habacuque – ‘Agora temos uma e vai ser tudo fácil’. Mas a gente acabou passando pela transição inversa, saímos da Deck em fevereiro, acho. Foi legal, foi interessante, ficamos um ano lá dentro e agora rescindimos o contrato…
Qual o motivo da rescisão?
Habacuque – Não tem uma razão específica. Tem a parte deles que é uma necessidade de lucrar por ser uma empresa…
Mauro Motoki – Viajaram um pouco…
Habacuque – Foi legal. Acho que (houve) até uma boa vontade de pegar um elenco bacana, só que o elenco ficou muito maior. Como você falou, (a Deck) é uma gravadora média, menor do que eles conseguiam dar atenção pra cada um. As coisas boas que a gente conseguiu tirar na época do lançamento já passaram, esse ano já estava muito mais morno e então quebramos o contrato…
Mauro Motoki – A saída da Deck foi de comum acordo. Nós não estávamos plenamente satisfeitos em relação a nossas expectativas – divulgação em rádios por exemplo, e eles precisavam conter os custos do elenco numeroso que haviam juntado. O que acontece é que dentro de uma gravadora estávamos sujeitos, obviamente, ao calendário deles. Nem sempre coincidia com a nossa ansiedade. A nova fase independente veio a calhar para sentirmos a liberdade necessária nesse período de composição e arranjos de músicas novas. Trabalhar com uma gravadora como a Deck foi uma experiência ótima, porque alcançamos resultados ótimos juntos (dois novos clipes, shows pelo Brasil, indicações a prêmios), sem perder nossa autonomia. Sempre tomamos as decisões que julgamos as mais certas. Agora, o momento é de liberdade.
Vocês estão tocando músicas novas nos shows?
Habacuque – Não…
O Ludov chegou a tocar Mutantes em um especial em São Paulo. Por que a escolha por essa banda?
Habacuque – Foi um projeto específico que nos desafiaram a fazer. Algo do tipo que era uma bandas tocando repertórios de outros. Então (tinha o) Kid Abelha…
Mauro Motoki – Barão Vermelho…
Habacuque – É. Barão Vermelho tocou Beatles, Cachorro Grande e Relespública tocaram The Who e nós escolhemos Mutantes. Acho que no nosso caso…
Chapolin – Rola uma identidade…
Mauro Motoki – Foram dois meses de muitos ensaios. Fizemos umas fantasias para nos apresentarmos ao vivo, em referência ao hábito deles de fazerem o mesmo.
Quando vocês receberam o premio na MTV, ficaram super felizes de encontrar com o Arnaldo (Baptista)…
Habacuque – Na época da gente escolher Mutantes rolou aquele papo de: “vamos fazer?”. E Mutantes é um negócio meio que não precisa ser muito mexido, né? Tipo, difícil colocar a mão mesmo, mas ao mesmo tempo pensamos assim: “E se alguém pegar e fizer e ao assistirmos o show falarmos: nossa, devíamos ter feito”. Então acho que ao mesmo tempo em que é meio intocável, é muito interessante. Tem muitas camadas musicais no som deles. Pra gente fazia muito sentido. Pensando bem, acho que o lance do repertório dos Mutantes permite também quase qualquer um se acomodar e se alojar dentro deles. Enxergar em parte dos Mutantes a nossa própria cara, o nosso próprio ponto de vista.
Vocês continuaram tocando músicas deles depois desse evento?
Habacuque – É, deu um bocado de trabalho refazer os arranjos e tirar os originais, então quando dá na telha, a gente re-aproveita o trabalho e toca. E esse projeto deve voltar ainda esse ano.
E vocês não têm receio de que aconteça como aconteceu com o Pato Fu, de ser uma banda com vocal feminino que ficou estereotipada por um bom tempo como “os novos Mutantes”?
Mauro Motoki – Existe essa possibilidade. O John ia participar com a gente desse projeto. Ele ia cantar duas músicas, tocar. A gente convidou, e no primeiro contato com ele falei que tínhamos o medo de correr esse risco das pessoas acharem que a gente é (um novo) Mutantes, mesmo achando que formamos uma personalidade no cenário. Ai ele falou: “Não tem problema não. Vocês não vão ser estereotipados como novos Mutantes. A gente já é. Esse lugar já é nosso e não vai cair pra vocês”. Falou isso exatamente como você disse. Não tem nada a ver. A banda não vai descaracterizar.
Habacuque – Não tenho esse receio por dois motivos. Um é que a banda é boa e a gente continua admirando. Então comparações com eles, particularmente não gosto de nenhuma comparação, mas já que comparam, que te comparem com alguém que você gosta. Outro motivo é questão de tempo também. Enquanto somos desconhecidos pra grande parte do público, ainda é necessário comparar com alguém…
Quando sai o próximo CD?
Habacuque – Estamos trabalhando nas músicas novas. Por enquanto são poucas, uma meia dúzia. Não colocamos prazo pra lançar qualquer tipo de obra. Nosso plano é produzir bastante esse ano. Não estamos preocupados em fazer quarenta musicas e tirar dez dessas. A gente vai fazendo e vai curtindo. Hoje em dia com a facilidade, estúdios caseiros, fica mais fácil ir produzindo e gravando.
O Ludov é uma banda muito conhecida no meio independente. Vocês estariam preparados pra fazer parte do mainstrean?
Habacuque – Quando a gente faz música, estamos preocupados com o próprio umbigo na verdade. Preocupados com o trabalho, com um negocio bem feito. Esse negócio de almejar coisas fora do universo da banda felizmente não acontece com a gente. O objetivo tem que ser muito mais interno. Mas estamos preparados pra tocar. Já tivemos oportunidades de tocar para grandes públicos.
Como está a freqüência de shows?
Habacuque – Está boa. No começo do ano foi um pouco devagar. Praticamente todo fim de semana tocamos.
Apenas no eixo Rio-São Paulo?
Habacuque – Ano passado fomos pro Nordeste duas vezes e fomos de novo agora. Tocamos no Sul também.
Vocês fazem muitos shows convidando bandas menores para tocar. Qual a intenção de vocês?
Mauro – A intenção é incentivar uma certa união, e também retribuir a ajuda que nos dão em outros Estados. Nem sempre as bandas são menores. Tocamos com Autoramas, por ex., e não se pode dizer que uma é maior que a outra. Trata-se de solidariedade, de irmandade. Estamos fazendo o que podemos fazer.
Como vocês enxergam o cenário independente brasileiro?
Mauro Motoki – Fácil não está e nem vai estar nunca. A gravação facilitou. Talvez a Internet tenha facilitado pra atingir o público. Mas a qualidade e a verdade nas músicas são difíceis e vão ser sempre. Então a dica é trabalhar.
Habacuque – É muito difícil mesmo. Se você parar pra pensar em quantas pessoas estão tocando, fazendo música boa, e gravando direito, é muito difícil mesmo. Então tem que ter muita perseverança, acreditar no que faz e continuar fazendo. Talvez o mundo impossibilite algumas coisas, mas tem que tentar até o fim, continuar fazendo, mas sem pirar na idéia de ser a sua vida. O foco principal tem que ser você fazer direitinho e procurar não desviar a atenção. Não acordo pensando: “quero ser o Chico Buarque”. Aí já trava. Você não consegue trabalhar porque está se comparando ou com gente que não tem nada a ver com você ou que de repente está muito no alto mesmo. “Ah, quero ser o novo Tom Jobim, o novo John Lennon”.
Vocês sentem que o público de vocês mudou dos tempos de Maybees pra cá?
Mauro Motoki – Insisto que Maybees era outra banda, que acabou no final de 2001. Paramos, e recomeçamos com outro repertório. O que isso provocou foi uma renovação natural da nossa base de fãs. Digo base mesmo, porque a grande maioria dos fãs do Ludov não conheciam Maybees, e conheceram depois do Ludov. Maybees é uma curiosidade para eles, é um algo mais. Temos a felicidade de vermos sempre novos fãs a cada vez que voltamos a alguma cidade. Isso é importante, e é sinal de que temos muito a trabalhar, e muita estrada pela frente ainda.
Querem deixar algum recado?
Habacuque – Podem aguardar coisas boas do Ludov esse ano. Estamos num ritmo bacana, mas não cobrem prazos. Tem um prazo que pode ser dado que é o próximo clipe, de “Dorme em Paz”, deve estar estreando…
Quem dirigiu?
Habacuque – Mauricio Gaudieri e Gabriel Barros. O Mauricio já fez dois clipes do Ludov e o Gabriel é novidade pra gente. No segundo semestre queremos voltar pro Nordeste. Em breve vamos pra Brasília e outras surpresinhas…