introdução e resenha por Marcelo Costa
auto-entrevista por Courtney Taylor-Taylor
Antes de entrar no bate papo “eu comigo mesmo” que o vocalista sex-symbol Courtney Taylor-Taylor distribuiu como release para o disco novo de sua banda, o The Dandy Warhols, algumas coisas precisam ser ditas. A primeira, e infame, é de que Courtney é homem, apesar de ter o mesmo nome que a musa de Kurt Cobain. A semelhança enganou os pobres tradutores da gravadora brasileira: “fiz uma entrevista sobre mim mesma”.
Segundo: a banda saltou de um culto indie nos dois primeiros álbuns para um sucesso relativo com o terceiro, “Thirteen Tales From Urban Bohemia“, o que não catapultou o grupo para o mega-estrelato, mas lhe rendeu elogios de pessoas ilustres como David Bowie, Robert Smith e Joe Strummer.
Terceiro: finalmente a EMI brasileira não comeu barriga e lançou, simultaneamente a EUA e Inglaterra, “Welcome To The Monkey House” no país. O anterior, só importado, não tem choro.
Quarto: discaço.
Quinto: com a palavra, Courtney Taylor Taylor
Rock.
A última fronteira.
Essas são as jornadas dos Dandy Warhols. Levar novas vidas desconhecidas, buscar novas situações, ir aonde nenhuma banda jamais foi…
Mas não sabíamos que grande parte de nossas fantasias de rock and roll seria gasta trancados em quartos de hotéis do mundo todo respondendo às mesmas questões repetidamente. Bem, enquanto os meses, anos passaram percebemos que essas perguntas diferiam mais no sotaque que no conteúdo. “Como pode ser”, você pode perguntar. Bem, deixe eu lhe contar, a biografia.
Sim, tudo que você disser em sua biografia voltará para te assombrar em uma infinita barreira de densos e coloridos sotaques mundo afora, repetidamente. Então, na tentativa de poupar a todos um pouco do sofrimento (motivo pelo qual os The Dandy Warhols fazem tudo que fazem), eu, Courtney Taylor Taylor, fiz uma entrevista sobre mim mesmo e foi assim que saiu:
Então você diz em sua biografia que o rock é a fronteira final. Isso ainda é verdade?
Bem, é, sim, eu acho. Quer dizer, eu realmente não, é… não sei. Qualquer coisa pode ser…… quer dizer, ah, sei lá. É simplesmente uma besteira dita em uma biografia. Acho que é a última fronteira se você achar que sim.
Ok, vamos em frente. Este é seu quarto disco. O terceiro pela Capitol Records. Houve um álbum que a Capitol rejeitou por ser muito “surreal”?
Não, na verdade nunca finalizamos nosso primeiro álbum da Capitol. Os mixes crus foram compilados no que geralmente se chama de “The Black Album”. De vez em quando está disponível na internet, mas na maior parte do tempo é difícil de encontrar. Eu, por exemplo, procurei pelo meu há duas semanas, mas acho que o perdi.
Ok, entendo. Então da onde veio o nome?
Você fala sobre “The Black Album”?
Não, “The Dandy Warhols.”
Ah, isso é fácil. Tinha esse pintor nos anos 60, e fica bem claro se você pegar esse nome e…
Sim, sim, Andy Warhol, eu sei. Ok, pergunta estúpida. Não há um maior significado, então?
Só se você for o tipo de pessoa que precisa de maior significado, mas por mim basta. Próximo assunto.
Ok, então como e quando vocês se conheceram?
Todos crescemos na área de Portland. Pete e eu éramos amigos desde a escola, Zia trabalhava em um café local com algumas de outras amigas minhas e Brent é meu primo. Acho que a banda foi idéia do Pete. Ele havia voltado de Nova York e considerou que seria uma forma fácil de conhecer gente com melhor gosto para música que acompanhasse bebidas que as pessoas com que estávamos bebendo na época.
Você disse “música para acompanhar bebidas”?
Sim, as pessoas precisam de boa música para beber, mas antes que você leve isso para um lado ruim, deixe-me dizer que toda música boa é boa em todas as horas.
Entendo. Bem, correm rumores de que estrelas como David Bowie, Robert Smith, o falecido Joe Strummer e Trent Reznor todos foram fãs dos Warhols. Isso significa que você faz música boa? Para acompanhar bebidas ou outra coisa?
Bem, um não necessariamente segue o outro, de fato fazemos boa música. Para acompanhar bebidas ou outra coisa.
E é claro que temos um egocentrismo sobre isso também.
Claro, qualquer coisa.
Seu último disco “Thirteen Tales From Urban Bohemia” foi uma grande sucesso. Tornou-se ouro e platina na Europa e Austrália. Como você explica isso?
Não explicamos.
E com o novo álbum?
Na realidade ainda não sabemos, mas foi muito divertido. Acho que isso é parcialmente porque nosso disco chama-se “Welcome To The Monkey House” (Bem-vindos à Casa dos Macacos).
Você diz “parcialmente”. Então quais são as outras razões?
Bem eu não sei. Quem se importa? Não pensei muito sobre isso e é apenas um modo de falar. Não é como se fosse um deslize com o qual você vai descobrir uma grande conspiração governamental estilo Richard Belzer ou algo assim. É mais possível que você simplesmente entedie ainda mais muitos leitores e vai parecer que a culpa pelo tédio é minha.
Um pouco temperamental, não? Talvez você tenha uma grande insegurança sobre ser entediante e é isso que estou revelando.
Ou talvez a única coisa que salvaria essa entrevista chata seria se eu me levantasse agora mesmo e te desse um chute no traseiro.
Você não pode. Porque eu sou você.
É, talvez você tenha conseguido toda a informação pertinente de que precisa e agora está me entediando. Essa entrevista acabou.
E então eu saio do quarto.
Então aí está. Nossa nova biografia.
Com carinho,
Courtney Taylor-Taylor
“Welcome To The Monkey House”(The Dandy Warhols)
por Marcelo Costa
Esse tal de Courtney Taylor Taylor é um tremendo cara de pau. Não, não estou falando isso por ele ter usado a artimanha acima de se auto-entrevistar. Digo isso porque o cara parece estar pouco se fodendo para o mundo, para o que os outros vão pensar e para a crítica especializada. Só isso explica um disco tão sensacional como “Welcome To The Monkey House”.
Porque “Welcome” é uma guinada na carreira da banda. Ela, que posava de filhote do britpop dos anos 90 em álbuns como o genial “Come Down” (1997) e o excelente “Thirteen Tales From Urban Bohemia” (2000), voltou uma década para presentear o mundo com o álbum mais anos 1980 desde os anos 1980.
Eu, pessoalmente, tendo a desvalorizar grupos que mudem radicalmente de um disco para o outro, mas, neste caso, é impossível não festejar, tamanha a qualidade do repertório. Também, não dá para dizer que a mudança foi assim tão brusca. Ok, as guitarras, que tanto faziam pelo som da banda, desapareceram ou ficaram beeeem escondidas. Mas o teclado oitentista já marcava presença no álbum anterior, em canções como “Godless”.
Para colaborar na coloração dançante do álbum, Nick Rhodes, membro fundados do Duran Duran, co-produz o disco, toca teclados em muitas faixas e trouxe o amigo Simon Le Bom para fazer backing em “Plan A”. As participações não param por ai: Nile Rodgers, guitarrista do Chic, esmerilha seu instrumento na chicletuda “I Am A Scientist”, faixa assinada por Bowie e Courtney que conta com sampler de “The Fame”, e o ex-Lemonheads (ou o Lemonheads) Evan Dando que também divide a composição de uma música, “You Were The Last Night”, com Courtney, duas únicas parceria presentes no disco (todas as outras músicas são do vocalista/guitarrista).
A ultra-referência não se restringiu às canções. Para a capa, a banda uniu os dois mais famosos trabalhos artísticos de Andy Warhol no rock: a banana do álbum “Velvet Underground & Nico” (1967) com o zíper de “Stick Fingers” dos Rolling Stones (1971) em um resultado bem legal. Não dá para apontar uma canção apenas, talvez o primeiro single, “We Used To Friends”, o que desmerece um álbum que deve ser ouvido na integra. “Welcome To The Monkey House” é um dos poucos discos nos últimos tempos que merece o adjetivo “matador”. Esse tal de Courtney Taylor Taylor é um tremendo cara de pau estiloso.
– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne.