por Marcelo Costa
A primeira coisa que olho quando coloco o CD no aparelho é seu tempo de duração: 45m38s. Faço isso porque só sete canções compõe “Murray Street” e o receio de viagens inaudíveis toma conta do ambiente. Audição feita, sorriso no rosto. Da bela abertura com “The Empty Page” até a derradeira “Sympathy For The Strawberry”, tudo soa Sonic Youth ao mesmo tempo que soa levemente (mas bem leve mesmo, ok) pop.
“Murray Street” é a segunda parte da trilogia nova-iorquina iniciada com “NYC Ghost & Flowers” (2000) e marca a estreia de Jim O’Rourke como membro fixo da banda assumindo o baixo e guitarras ocasionais. Jim já vinha trabalhando com o Sonic Youth há tempos, na produção dos álbuns (aliás, foi ele que ajudou Jeff Tweedy a desconstruir o alt country no último álbum do Wilco, “Yankee Hotel Foxtrot”). O resultado dessa união é inspirado. Lembra muito, mas muito mesmo, Pavement. Mas também lembra Velvet Underground, R.E.M. e Flaming Lips…
“Murray Street” é o 16º álbum em 21 anos de carreira do Sonic Youth. A trilogia nova-iorquina foi bastante influenciada pelos atentados de 11/09. O nome do álbum denomina a rua onde fica o estúdio da banda, próxima da área atacada. Tão próxima que foi onde um dos motores dos aviões que se chocaram às Torres Gêmeas foi cair. A banda preparava o álbum no período do ataque (Jim O’Rourke dormia no estúdio no momento) e as gravações tiveram que ser suspensas até que a área fosse liberada novamente, já que instrumentos, fitas master e todo o material da banda estava no estúdio.
Se algumas letras citam o incidente, nas músicas a opção foi a melodia. A bateria surge abafada em quase todas as canções, abrindo espaço para longos improvisos em forma de dedilhados lembrando uma pequena ópera rock (se não for).
The Empty Page
Abertura com guitarra dedilhada e bateria abafada. Já na primeira frase do álbum, Thurston Moore despista: “These are the words, but not the truth”. A guitarra segue leve, abafada. O vocal carrega a canção até o solo ensurdecedor. O refrão volta e tudo soa abafado novamente, mas melódico como o Sonic Youth poucas vezes foi. Lembra Velvet e Byrds. O vocal de Thurston é calmo.
Disconnection Notice
Segue na mesma linha de “The Empty Page”, tanto na melodia quanto na letra. Um riff grudento encharcado de microfonia desliza por baixo da voz de Thurston. Mais de seis minutos que alternam um vocal melodioso de Thurston com riffs abafados e viradas guitarreiras.
Rain On Tin
Bateria à frente com riffs raivosos na abertura desembocam em guitarras dedilhadas e bateria cadenciada. É o velho Sonic Youth experimentando levar a melodia até onde ela permitir. Da melodia mais lenta até guitarras que soam como trovões, a canção segue ao infinito, mais precisamente, 7m e 56s.
Karen Revisited
Faixa mais longa do álbum e uma das melhores. As guitarras duelam entre si em busca de atenção. O vocal, agora de Lee Ranaldo, segue na mesma linha das anteriores, assim com a melodia, até o quarto minuto, quando toneladas de microfonia são sobrepostas em ambos os canais. A canção começa a ressurgir da demolição (não a toa, a letra é a a que mais remete aos ataques ao WTC) amparada em dedilhados. Quando tudo parece que voltará ao normal, novo ataque aos tímpanos que levam a canção em longos improvisos e apitos de microfonia até o décimo primeiro minuto.
Radical Adults Lick Godhead Style
Thurston volta a assumir o vocal nesta que é a mais porrada do álbum e a melhor. A letra cita Lou Reed, as belas garotas de Nova York e diz “I dead by the beauty of strangers / In horror my eye-head transforms them into smiling / beatific room mates from dust to dust they create rock and roll” enquanto a atmosfera é preenchida com muita microfonia e deve ensurdecer ao vivo. Traz, ainda, Donald Dietrich e James Sauter no saxophone além de cachorros latindo por baixo da demolição guitarreira.
Plastic Sun
Cantada por Kim Gordon, traz a bateria à frente novamente. As guitarras brincam, por baixo, com microfonias e riffs desconexos. Chega a soar punk quando Kim canta “I hate you and your fishy friends, I hate you and it never ends” com a bateria acelerada acompanhando. A mais curta canção do álbum.
Sympathy For The Strawberry
Outra cantada por Kim, a faixa que encerra “Murray Street” é puro ruído e lembra muito o álbum “Daydream Nation” (1988). A bateria se faz mais presente novamente, as guitarras soam preguiçosas na condução da melodia e o vocal de Kim é um dueto consigo mesma. Perfeita para ouvir e dançar no escuro, como diz a letra.
– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne
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