Um
Grande Garoto
por
Marcelo Costa
Março de 2002
Há
duas maneiras de se ver Um Grande Garoto (About a
Boy – 2002), filme dos irmãos Chris e Paul Weitz,
adaptação do livro homônino
do escritor britânico Nick Hornby. A primeira delas eu
já destaco no parágrafo acima: é tratar
Nick Hornby como um mero escritor e o filme como uma mera adaptação.
Olhando por esse foco que, convenhamos, será o enfoque
que a maioria do público terá, enxergamos um drama
exemplar de como os adultos não estão ou simplesmente
não querem envelhecer (tema básico da literatura
de Hornby).
Hugh
Grant é Will Freeman, um trintão metido a galã
que é viciado em cultura pop, tem alergia à palavra
"relacionamentos" e repete a palavra "cool" como uma criança
pequena diz "mamãe". Will tem a vida que todos nós
pedimos a Deus: o cara não trabalha, ou melhor, nunca
trabalhou, já que sua renda mensal é engordada
pelos direitos autorais de uma canção natalina
que seu falecido pai compôs e se transformou em um símbolo
do natal (mais ou menos como "Feliz Aniversário" é
para os aniversariantes).
Will
passa seu dia preenchendo intervalos de meia hora com jogos
de bilhar, massagens faciais, compras de cds e namorando e dispensando
mulheres. Tudo muito... "cool" até que um moleque de
13 anos invade sua vida. Nicholas
Hoult é Marcus, tem 13 anos e é totalmente o oposto
de Will. Vive uma vida de hippie educado por uma mãe
que tenta fazer do garoto um exemplo de atitude, mas não
sabe que, na escola, uma pessoa de atitude (ainda mais um moleque
de 13 anos) é muitas vezes confundida com um ser de outro
planeta. Will e Marcus acabam se conhecendo, se envolvendo e
descobrindo coisas em comum que, claro, irão mudar o
jeito de cada um deles olhar o mundo.
Como
literatura, Um Grande Garoto é exemplar. A maneira
como Hornby vasculha os sentimentos alheios é sublime,
retratando de forma genial esse tipo todo estranho que é
o homem de trinta e poucos anos da virada de século.
Como cinema, complica um pouco. Parte da complicação
vem da produção que optou por não detalhar
a obra pegando o supra sumo do livro. A opção
pelo não detalhismo acaba transformando Um Grande
Garoto em um filme comum, sem muitos atrativos. Se por um
lado o transforma em um filme comum, também facilita
seu entendimento ao público médio. Uma faca de
dois gumes, sempre, mas em se tratando de um mero escritor e
de uma mera adaptação, o resultado é até
ok. É ok porque Hornby é cool até não
poder mais e nem mesmo uma adaptação morna apaga
isso.
Outro
ponto a favor é a escolha de Grant para o papel principal.
Hugh encara a perfeição o papel de canalha assumido
(depois de dois papeis de canalha assumido no currículo
- Trapaceiros,
de Woody Allen, e o Alta
Fidelidade para mulheres, Diário
de Bridget Jones) e é responsável por
várias passagens excelentes.
Mas,
todos esses pontos a favor caem por água abaixo em uma
visão mais cuidada do filme. Para todos aqueles que conhecem
bem Nick Hornby, Um Grande Garoto é uma adaptaçãozinha.
Ao limar os detalhes, a direção do filme limou
também as excentricidades de Hornby (música, cinema,
literatura, isso que chamam cultura pop). Mais. Ao deixar de
fora o episódio Nirvana (talvez, a grande sacada do livro
já que o prórpio livro remete a uma canção
de Kurt Cobain), a versão cinemão de Um Grande
Garoto perde um dos ganchos principais que talvez fisgassem
jovens nas filas em frente à tela: a relação
do mito com seu mistificador.
O
grande sinal dessa falta de cuidado (apesar que flâmulas
do Arsenal
pousam aqui e ali) fica evidente quando na primeira e última
frase do filme surgem uma citação de Jon Bon Jovi.
Quem usa camisetas do Teenage
Fanclub em entrevistas, escreve resenhas sensacionais sobre
discos diversos (de Steve Earle a Aimee Man, passando por Nick
Cave) e é fã confesso de Elvis Costelo, não
faria uma citação que Rob Fleming desaprovaria.
Assim,
trafegando entre o pop e o popularesco, Um Grande Garoto
surge poético em algumas partes e patético em
outras. Deve agradar ao público médio tanto quanto
deve decepcionar fãs de Hornby já que as principais
partes patéticas são exatamente no começo
e no final do filme, como se fossemos comer um doce que na primeira
mordida é ruim, melhora no meio, mas é detestável
no final. Qual gosto fica na boca, caro leitor? Para mim, o
de que Nick Hornby merecia mais. E nós também,
e nós também.
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