Na rota dos vinhos na Argentina (parte 7)
Iniciando o processo de retorno, deixamos Mendoza para trás numa quarta-feira pós almoço e partimos de ônibus para San Rafael, onde na sexta-feira teríamos um voo para Buenos Aires. A ideia era conhecer um pouco mais essa pequena cidade de 170 mil habitantes que me remeteu bastante a uma Campos do Jordão um tiquinho mais modesta, mas ainda assim bastante elegante e charmosa. Casualmente há pouco de vinho nesse último trecho do passeio.
Após o tour Alta Montanha, que nos encantou em Mendoza, decidimos encarar outro, desta vez em San Rafael, esperando repetir a paixão pela experiência, mas foi o contrário. Entre as opções possíveis de tour escolhemos uma que passava pelo Cânion de Atuel, com paredões de rocha separados por uma estradinha de terra e um rio, que nestes dias estava quase seco, mas com o degelo torna toda a região uma atração para esportes de canoagem.
O problema do tour é que apenas o Cânion renderia um tour de pouco mais de duas horas, então a agência outras “paradas” que além de soarem meio forçadas, acabaram por fim tornando o que seria um passeio pelo Cânion de Atuel no passeio pelas comportas da hidrelétrica Nihuil (“Aqui vocês podem descer para ver uma das turbinas da Hidrelétrica”, disse em certo momento a guia, que não exibia a mesma simpatia da guia do tour Alta Montanha).
Antes de adentrar o cânion, porém, paramos para almoçar na pequena vila de El Nihuil (que rendeu o pior vinho da viagem) e, depois, para fotos no primeiro grande dique, que leva o nome da vila. Paisagem bonita, muito vento, alguns kioskos e segue o jogo. A descida para o cânion, de van, é interessante, mas não há paradas no meio do trajeto, o que tira um pouco da graça de fotos: ou é no topo, ou é no fundo. Ainda assim, paisagem bem bonita.
Dai, então, começa a peregrinação pelas comportas da hidrelétrica (são quatro no total), que me deixaram com tanto tédio que numa passagem que renderia um foto lindíssima, fiquei tão atônito que esqueci de pedir ao motorista para parar – na verdade, eu achava que ele iria parar após ver aquela paisagem. Seguimos em frente, entediados, até uma área em que, na época do rio cheio, deve ser bem disputada com diversos modelos de esportes de ação, mas que neste dia só serviu para me fazer experimentar a Patagonia 247, uma Session IPA refrescante.
Antes de pegarmos o caminho para San Rafael ainda paramos no último grande dique da região, o do Valle Grande, que rende uma bela paisagem, e no único local que me deixou sem fôlego, a visão de todo o vale e da formação rochosa que os locais chamam de Submarino (na foto acima). Absolutamente lindo! Teve mais: na entrada da cidade conhecemos uma fazenda que produz vinho de mesa (mediano) e uma extensa variedade de frutas secas e em compotas além de uma bela sala de maturação de carne (o bacon estava bastante aromático). Foi mais um item de visita incluso pela agência que não acrescentou nada ao pacote do passeio. Uma pena.
Na sexta-feira voltamos para Buenos Aires, e no sábado teríamos um voo à noite para São Paulo, e, enfim, home, sweet home. Mesmo assim não desperdicei esse pouco tempo na capital federal. Na sexta á noite sai decidido a conhecer mais bares de cerveja artesanal argentina, e o passeio, que rendeu caminhadas produtivas até San Telmo, permitiu escrever o post especial 11 points de cerveja artesanal em Buenos Aires.
No sábado, último dia da viagem, uma nova surpresa: lembra que eu escrevi uns posts atrás que ainda iria falar da melhor carne da viagem? Então, no sábado rolou almoço com o casal de amigos André e Giovana em um dos meus, desde então, lugares favoritos para se comer carne na cidade: La Carniceria, em Palermo, e me apaixonei pelos cortes da casa. Pegamos um corte de parrila e um corte defumado, e bateu a carne que comi no 1884. Não é pouco. Com essa despedida caprichada deixamos Buenos Aires em direção à São Paulo, mas já penso que preciso voltar logo.
Turismo: Na rota das vinícolas argentinas (aqui)
julho 19, 2017 No Comments
Na rota dos vinhos na Argentina (parte 6)
Na segunda semana do tour 2017 por Mendoza, deixamos o bom Wine Aparts, hospedagem mais simples no centro da cidade, após quatro dias práticos e partimos para dois dias de Club Tapiz Hotel Restô, que fica em Maipú, dentro de uma das vinícolas da Tapiz – eu havia visitado o local no tour de 2014 e me apaixonado. Era segunda-feira, 01 de maio, e a grande maioria das vinícolas estaria fechada devido ao feriado do dia do trabalho, então relaxamos e fizemos o check-in tranquilamente, desfizemos as malas, comemos algumas empanadas da cozinha do restaurante e descansamos antes de visitar a única vinícola que conseguimos agendar no dia, a Trapiche.
Maior exportadora de vinho argentino, a Bodega Trapiche está localizada em Maipú em um prédio antigo, datado de 1912. Pedimos um taxi e duas retas e 13 quilômetros depois, ei-la. O tour foi agradável e, ao final, provamos um Trapiche Fond de Cave Sauvingnon Blanc 2016, um Costa & Pampa Pinot Noir 2014 e, mais interessante do trio, um Medalla Blend 2013. Foi legal conhecer o prédio e a história da vinícola, mas a sensação é de que a gente ainda não tinha enfiado o pé na jaca… ou melhor, nas uvas, não havia sentido a verdadeira Mendoza, e, já de volta ao Club Tapiz, fomos surpreendidos com o aviso de que toda noite há uma degustação orientada dos vinhos da casa para os hospedes. Partiu.
No bonito salão do hotel, o sommelier Alejandro conduziu uma degustação que mais pareceu um agradável bate papo. Éramos dois brasileiros (eu e Lili), dois holandeses e dois argentinos (de Buenos Aires), e Alejandro ficava alternando o foco buscando saber um pouco sobre cada um na mesa enquanto nos alternávamos entre um agradável Tapiz Torrontes e um ótimo Tapiz Malbec 2013 (o maravilhoso Tapiz Black Tears, uma das minhas paixões na última viagem, ficou de fora e, na correria de ir pra cá e pra lá, acabamos não bebendo-o. Uma pena). Dali partimos para mais vinho no restaurante da casa, que infelizmente não nos surpreendeu e ficou abaixo da nossa expectativa. Tudo bem, nada como um dia (e um vinho) após o outro…
Planejamos curtir viagem de maneira econômica com alguns trechos de bike, outros de ônibus e, os mais distantes, de BusVitivinicola (que nem é tão barato e vale mais para conhecer o Valle do Uco) e taxi. Nossos únicos “exageros financeiros” seriam esses dois dias no Club Tapiz e o jantar no restaurante 1884, mas acabamos cedendo a mais um “gasto extra”: no segundo dia de Tapiz (por indicação certeira da atenciosa Monica), contratamos um motorista para ficar conosco entre 9h30 e 17h30 levando-nos a quatro vinícolas (sendo que três delas eu já havia reservado antecipadamente). Foi das melhores decisões da viagem e um dos melhores dias.
Na terça-feira então, no horário combinado, o motorista Claudio Moreno nos pegou para o nosso dia de beber vinho. Meu plano inicial era passar na lendária bodega de Carmelo Patti e beber um vinho com o próprio Carmelo, um enólogo por vocação e, mais do que isso, um grande personagem da cena vinícola local. Ele não pede reserva antecipada nem nada, é só chegar chegando, mas, na manhã seguinte a um feriado, demos com a cara na porta. E como tínhamos horário marcado nas vinícolas seguintes, achamos por bem deixar para encontrar Carmelo na próxima vez que voltarmos.
Esperamos cerca de 30 minutos, que passaram voando com as histórias que Claudio, um excelente guia, nos contava sobre Mendoza. Por exemplo: olhando o mapa da cidade nos dias anteriores, percebemos a quantidade de praças no centro, e Claudio nos explicou que elas foram construídas após o terremoto de 1861, que deixou mais de 4 mil mortos na cidade, visando ser uma área de escape para um possível terremoto futuro (o último marcante foi em 1985). Não só isso: a cidade é toda baixa (há poucos arranha-céus) visando a segurança da população. Claudio também nos contou curiosidades sobre os plátanos que embelezam a cidade no outono e da divisão de água em Mendoza, um bem raro e muito importante numa cidade que, dizem, tem mais de 1000 bodegas, entre outras coisas.
Nossa segunda (primeira na verdade) foi na bela Bodega Alta Vista. Se você fez um tour de vinho, os outros vão ser todos bem parecidos, com pequenas aulas sobre processos e barricas. A diferença é a parte histórica e, claro, os vinhos, que aqui surpreenderam: abrimos com um refrescante Alta Vista Premium Torrontes 2015, seguimos com um Alta Vista Atemporal Blend 2013 (um dos favoritos da viagem) e com um Alta Vista Terroir Selection Malbec 2014. Para fechar, o badalado Alta Vista Alto 2010 (75% Malbec 25% Cabernet Sauvignon), a estrela da casa, excelente.
Dali partimos para, segundo Mônica, da Tapiz, a bodega mais procurada por brasileiros no momento: El Enemigo, projeto pessoal de Alejandro Vigil (apelidado em uma reportagem do jornal Clarin como “O Messi dos vinhos”), enólogo chefe da renomada Catena Zapata, e de Adrianna Catena, filha mais nova do lendário Nicolás Catena (“Na época da crise, quando o país quebrou no final dos ano 90, e todo mundo teve que vender suas bodegas para os estrangeiros, Nicólas era o único que não vendia, mas sim comprava. Dizem que ele fez um pacto”, brincou o motorista). O plano era fazer o tour, degustar os vinhos e almoçar, mas acabamos (com a fome e com a sede) fazendo apenas as duas últimas, que foram a grande surpresa da viagem.
O local é um charme, o almoço foi absolutamente excelente (um costela divina – e enorme) e os vinhos, os melhores das duas semanas: escolhi uma sequencia mais simples e Lili ficou com a sequencia Premium (e, claro, depois alternamos). Experimentamos o El Enemigo Chardonnay, Malbec, Bonarda e os sensacionais Gran Blend, Gran Agrelo e Gran Gualtallary. Lili percebeu que o Gualtallary e o Agrelo têm a mesma composição de 85% Cabernet Franc e 15% de Malbec, mas são bem diferentes. Como o “O Messi dos vinhos” estava por ali, questionamos e, gentilmente, ele puxou uma cadeira e nos deu uma pequena aula sobre rabiscando no papel toalha:
A) A diferença de altitude das vinhas de cada garrafa: a plantação de Agrelo está a 930 metros acima do nível do mar e a de Tupungato, onde é produzida a uva do Gualtallary, 1470 metros. “A cada 100 metros diminui um 1 grau de temperatura”, explicou. Ou seja, as vinhas de Tupungato estão em uma região quase seis graus mais fria.
B) O solo de Agrelo é rico em cascalho, com um pouco de argila e de areia do fundo do mar (você sabia que boa parte dessa região estava encoberta pelo oceano? Assim que a Cordilheira se forma, parte da região de Maipú surge e, por isso, em algumas calicatas no lado de cá da Cordilheira é possível encontrar conchinhas do mar enterradas a bilhões de anos) enquanto o solo de Tupungato tem bastante cascalho e pedras.
C) A posição de cada uma das vinhas em relação ao sol.
Conclusão da aula: “Basicamente o que vocês sentem de diferença é sol, solo e temperatura”. E brincou: “Um amigo meu, enólogo em Bordeaux, me disse certa vez: se você plantar Malbec aqui, o resultado será Merlot. Porque o solo é mais importante que a varietal”. É o famoso Terroir…
Ps. Ao ir para o caixa pagar a conta, com Alejandro próximo, presenciamos a cena de um fã pedindo para o enólogo autografar a garrafa: “Você é um artista”, ele disse, e Alejandro, que deve estar acostumado com os elogios, minimizou o gracejo com gentileza (e eu e Lili nos arrependemos de não ter pegado uma garrafa e feito o mesmo)…
A equipe e o próprio Alejandro haviam nos servido de vinho mais duas ou três vezes e esse delicioso exagero prejudicou a terceira vinícola do dia: satisfeitos com o belo almoço e com a aula de vinhos, partimos para a renomada Lagarde. Lili já havia entregado os pontos, mas lá fomos nós para mais seis vinhos e um espumante: Lagarde Extra Brut, Guarda Chardonnay 2015, Primeiras Viñas 2013 Cabernet Sauvignon, Altas Cumbres Torrontes 2015 (<3 Torrontes), Merlot 2014, Collection Cabernet Franc 2013, um dos meus favoritos da sessão ao lado da estrela da casa, Henry 1 2012. Ufa! O tour foi interessante, mas já estávamos mais pra lá do que pra cá, então hora de voltar pra casa, feliz e vinhamente bêbado.
Após a extensa oferta de vinhos do dia, cabulamos a degustação do hotel à noite (eu só torço para que não tenha entrado um Black Tears na roda justamente nesse dia – ou melhor, torço para a felicidade dos presentes) e fomos arrumar as malas, pois no dia seguinte partiríamos para o trecho final da viagem: dois dias em San Rafael com direito a tour por canyons e mais vinho, e mais dois dias em Buenos Aires (ok, um e meio), que rendera os bares que completam os 11 locais para se beber cerveja artesanal na cidade, assim como a melhor carne de todo o passeio. Fica para o próximo post.
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maio 29, 2017 No Comments
Na rota dos vinhos na Argentina (parte 5)
Dois anos e meio depois de um tour por vinícolas argentinas acompanhado de uma turma de sommeliers de vinho, cá e estou de volta com Lili de companhia visando beber muito vinho e desbravar Mendoza. A primeira parada foi em Buenos Aires, onde tive a oportunidade de matar saudade e observar minha Vênus favorita se banhando (La Toilette De Venus, de 1873, de William Adolphe Bouguereau, em exposição no Museu de Bellas Artes de Buenos Aires) e, ciceroneado por Túlio Bragança, do renomado Aires Buenos (simplesmente tudo sobre Buenos Aires), conhecer o Chori (onde se come um excelente choripam gourmet) e iniciar um tour por pubs de cerveja artesanal argentina.
De Buenos Aires, voo para San Rafael e, de lá, um bus para Mendoza – o das 13h estava lotado (quem manda não comprar a passagem antes) e tivemos que esperar o das 14h30. Nenhum problema: o kiosko em frente a rodoviária nos abasteceu com internet, milanesa (daquelas que saem para fora do prato) com batatas e cerveja (mainstream, mas argentina). Por volta das 18h já estávamos em Mendoza. Escolhemos um hostel simples para essa primeira parte da viagem, e ficamos no Wine Aparts, que está próximo do centro nervoso de Mendoza (uma pequena grande cidade de 115 mil habitantes e cerca de mil bodegas). O lance era procurar algumas empanadas para driblar a fome e se preparar para a maratona do dia seguinte…
Acordamos por volta das 8h, tomamos o café no hotel e partimos de ônibus de linha para Maipú, um das regiões vinícolas de Mendoza que é possível acessar de ônibus (Luján de Cuyo também é acessível de ônibus de linha, mas é mais complicado; já o Valle de Uco merece uma maior dedicação via Bus Vitivinicola ou remis – motoristas contratados que fazem esses trechos). O plano era descer num local determinado, alugar uma bike e pedalar entre as vinícolas. Porém, para variar, perdemos o ponto, e fomos parar quase em frente á Bodega Lopez. Aproveitamos e descemos e começamos nossa maratona de vinhos com um bom Casona Lopez 2014 (e um doce demais Dulce Natural Lopez 2016 Torrentes e Moscatel).
Visando corrigir os planos traçados em casa (e guiados pelo Maps, que funciona realmente como mapa via satélite mesmo sem wi-fi), pegamos um ônibus e descemos na Calle Urquiza, onde deveríamos ter descido antes, para alugar duas bikes no Maipu Bikes. Recomendamos: Mario nos atendeu muito bem, corrigiu os horários dos tours que faríamos e ainda fez uma reserva em uma bodega. De posse das bikes (100 pesos a diária) partimos para desbravar as vinícolas da região e, para pânico da Lili, escolhi como primeira a Viña El Cerno, uma bodega de vinhos orgânicos a cerca de seis quilômetros, sendo que tivemos que atravessar uma rodovia (na ciclofaixa) e um pequeno trecho repleto de plátanos sem ciclofaixa.
Bodega pequena e charmosa, a Viña El Cerno, todos os vinhos são orgânicos (ou seja, dispensam pesticidas, fungicidas ou qualquer outro agrotóxico – todo o adubo é natural) e eu e Lili ficamos num embate entre o Malbec 2010 (muito mais macio) e o Malbec 2014 (mais rebelde). Curti. Dali seguimos para almoçar, em meio ao vinhedo, na Tempus Alba, questão de dois minutos de pedalada. Encarei um bom ojo de bife e adorei os vinhos da casa: optei na degustação por Merlot, Tempranillo (meu favorito) e Syrah, uvas mais incomuns na terra do Malbec. O pânico de Lili em pedalar na autoestrada sumiu na volta (viva o vinho), e até paramos para provar azeites na Entre Olivos (gostamos tanto que trouxemos uma garrafa de azeite com alho, que estamos consumindo como se fosse café de tão bom).
A tarde especial consumiu todo o nosso tempo, e perdemos a visita na última vinícola, Lagarde, mas o Mario, da Maipú Bikes, tratou de transferir a reserva para a semana seguinte, nos fazendo evitar de perder 200 pesos. Na volta para casa, um empecilho: em Mendoza não há cobradores de ônibus, e todos os usuários tem um cartão (tipo Bilhete Único) com créditos para pagar a passagem. Bem, eu já tinha providenciado o meu cartão, já tinha colocado créditos, mas não contava com o trecho extra (após perder o ponto) que fizemos de ônibus, então não tinha créditos no cartão para pagar a passagem: “Peça para algum passageiro pagar para você”, orientou o motorista. E lá fomos nós, com 7 pesos nas mãos, pedindo para alguém pagar a nossa viagem. Pelo jeito é comum, pois o processo foi rápido e indolor. Agora… casa.
O sábado teria novamente um tour de vinhos, mas acordamos tarde e decidimos curtir a cidade. Demos um pulo na Plaza Independência e Lili teve a excelente ideia: “Por que não compramos vinhos na Sol y Vino – “a” loja de vinhos em Mendoza – e fazemos um piquenique no Parque San Martin?”. Baita ideia! Pegamos nosso vinho na Sol y Vino (um bom Tupun Bonarda 2014), passamos no supermercado e compramos queijo e salame e torradas e azeite com alho pra acompanhar e partimos de ônibus para o parque, que é belíssimo – eu não o havia visitado na vez anterior, e me apaixonei). Estendemos a toalha e criamos nosso pequeno reino particular, que se encaixou maravilhosamente na tarde outonal de Mendoza. Um dia leve e de descanso para seguirmos para o jantar no badalado 1884, de Francis Mallman.
Eu havia feito a reserva duas semanas antes, e dias antes escreveram pedindo para confirmar, já que a procura estava grande. Reserva confirmada, partimos. Primeira surpresa: o 1884 fica dentro de uma velha bodega na área central de Mendoza (precisamos de ajuda para encontrar o restaurante). Chegamos 10 minutos antes, e logo nos ofereceram uma mesa, que poderia ser na área fechada ou no jardim. Optamos pelo segundo, e a enorme churrasqueira que Mallman mantém no local aromatizou de fumaça todas as roupas na minha mala (risos), um brinde especial pelo jantar caprichado: Lili foi de coelho (ela adora) e encarei um belo ojo de bife, que não foi o melhor da viagem (falarei dele no próximo post), mas estava absolutamente perfeito fechando um sábado simplesmente especial.
Se deixasse por mim, iríamos em 30 vinícolas em seis dias, mas Lili, apaixonada por natureza, queria fazer o tour de Alta Montanha, que segue na estrada que liga Mendoza a Santiago, para em pontos onde se pode observar o Pico do Aconcágua, o mais alto das Américas. Fizemos o passeio via agência El Cristo Redentor (obrigado, Tomaz Alvarenga), e foi um longo dia: nos pegaram 7h30 no hotel e voltamos quase às 18h30. Nesse intervalo, a Madalena, excelente guia local, nos levou pela rota internacional 7 e depois pela 40. Paramos na estação de esqui Penitentes (encaramos o teleférico para encontrar a melhor vista de toda a viagem) e, depois, na ponte Inca. Nos apaixonamos por Uspallata e almoçamos (encarei mais uma milanesa) em Las Cuevas, último vilarejo antes da fronteira com o Chile. Recomendamos fortemente o passeio. Descansamos felizes para encarar a segunda parte do tour Mendoza.
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maio 20, 2017 No Comments
Dez fotos: Argentina 2014
Bodega Humberto Canale
Bodega Bressia
Churrasco
Carroça
Tierra Malbec
A Cordilheira
Bodega DiamAndes
Colheita
Cabernet Franc
1913
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Veja mais imagens de cidades no link “cinco fotos” (aqui)
dezembro 10, 2014 No Comments
Na rota dos vinhos na Argentina (parte 4)
O trecho final do roteiro foi van na estrada! Pegamos a ruta 40 para sair de Mendoza e seguimos primeiro pela ruta 141 e, depois, pela 38, a caminho de La Rioja, quase sete horas de viagem atrás de bons vinhos… e valeu muito a pena. Antes, porém, uma parada estratégica no meio do caminho para conhecer a produção da Finca Las Moras, em San Juan, a duas horas de Mendoza, uma bodega responsável por uma seleção de vinhos muito interessantes na questão custo / benefício.
Antes de beber, porém, fomos dar um passeio na vinícola e adentrar uma calicata, que nada mais é do que uma enorme escavação no terreno para se estudar a geotécnica do solo, afinal, antes de se investir em uma plantação em um determinado local é bom saber se o tal local tem um solo propício para o plantio. No caso desta calicata da Finca Las Moras, o que mais surpreendeu foi encontrar conchinhas do oceano em meio a terra! Do lado de lá da Cordilheira dos Andes há um oceano, e há alguns milhões de anos atrás tudo isso daqui era… oceano! A formação da Cordilheira dividiu o território, mas o solo não deixa esquecer o passado.
Partiu degustação, e a linha tradicional Dada foi bastante elogiada por seu excelente custo / benefício. O Dada 1 é um blend de Bonarda e Malbec enquanto o Dada 2 nasce da união de Cabernet Sauvignon e Syrah. Já o Dada 3, meu favorito, é 100% Merlot. Da linha PAZ, outro dos sucessos da casa, um Sauvignon Blanc muito bom. Seguiram-se a ainda melhor linha Grand Syrah e os tão ótimos quanto Pedernal (Malbec) e, meu favorito desta parada, o Mora Negra 2011 (Malbec e Bonarda).
Próximo destino, Casa Montes, uma enorme vinícola de San Juán, para provar o Ampakama Dulce Natural Viogneir, um Torrontes fresquissimo e um bom blend tinto 2012 que ainda não está nem rotulado além de um ótimo Don Baltazar Cabernet Franc (estou me apaixonando por essa uva!). Dali direto para a La Riojana, cooperativa de vitivinicultura de La Rioja fundada em 1940, com uma produção absolutamente gigantesca. Eles fazem desde vinhos de caixinha até bons exemplares de Torrontes Riojano e Malbec Rose. Gostei do Ecologica Los Andes Reserva Shiraz Malbec e também dos exemplares da linha Raza (Malbec e Syrah).
Pé na estrada e mais uma parada! Recebidos com empanadas e uma vista de tirar o folego do vinhedo no Valle do Chañarmuyo, nem o cansaço foi páreo para se deslumbrar com a linha de vinhos Keo e, principalmente, Paiman, cujo Tannat da casa se transformou em um dos desejos de consumo da turma da van (se você esbarrar com ele por ai, pega dois: um pra você e um pra mim, ok). Um misto de alegria e dever cumprido marcou o almoço que se seguiu, e a sensação é de que essa viagem por regiões vinícolas da Argentina foi um enorme presente que deve abrir meus olhos não só para os Wines of Argentina, mas de todo mundo. Viagem finita, mas já quero voltar.
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outubro 27, 2014 No Comments
Na rota dos vinhos na Argentina (parte 3)
O quinto dia de viagem começou na estrada, e o ônibus (leito confortável), se não é comparável a uma cama de hotel, serviu bastante para deixar a carcaça descansar enquanto a cabeça pensava mil coisas. No iPod, Tweedy, Pescado Rabioso, Miles Davis, Charme Chulo, Nevilton e Sui Generis se alternavam embalando rápidos cochilos, que terminaram assim que o sol amanheceu meio vermelho, depois dourado. A chegada a Mendoza às 7h e tanto da manhã parecia uma segunda-feira de Marginal Pinheiros: congestionada e ansiosa.
A primeira tarefa do dia foi uma das mais agradáveis da viagem, uma palestra de Roberto de La Mota sobre o vinho argentino além do Malbec. Enólogo-chefe e proprietário da vinícola Mendel, Roberto de La Mota é um dos grandes nomes da história do vinho argentino, e discorreu sobre sete uvas: Mendel Semillón 2013, Doña Paula Estate Sauvignon Blanc 2014, Colomé Torrontés 2013 (um dos meus preferidos), Durigutti Reserva 2010 Bonarda, Rutini Cabernet Sauvignon 2011, Pasionado Cabernet Franc 2010 e Decero Petit Verdot 2011.
Na sequencia, uma visita à bodega familiar Bressia, que tem apenas 10 funcionários (cinco são da família que dá nome a casa). Fomos recebidos por Marita, que nos levou em um rápido tour pela bodega (da área de engarrafamento passando pelas barricas e até o setor de rotulagem, totalmente manual), e depois nos serviu alguns dos destaques da casa (o Bressia Pinot Noir 2010 Piel Negra me agradou, mas o destaque geral foi o Bressia Profundo 2010, um blend com quatro uvas: Malbec, Cabernet Sauvignon, Syrah e Merlot).
Da simplicidade encantadora da Bodega Bressia fomos para o luxuoso complexo da Vistalba, que inclui uma agradável pousada, para conhecer alguns vinhos da casa sob a orientação do enólogo Alejandro (me chamaram a atenção os Tomero Malbec 2011 e Petit Verdot 2012 e o excelente Vistalba Corte A) e participar de uma mini-feira de vinhos com sete vinícolas presentes: Lamadrid Estate Wines, Viñedos Urraca, Kaiken (responsável por um dos vinhos que me trouxe para essa viagem), Lagarde, Casarena, Septima, Clos de Chacras e Argento.
Uma minifeira de vinhos funciona mais ou menos assim: cada vinícola monta sua apresentação em uma mesa com dois até quatro vinhos, que serão degustados pelos participantes, que vão rodando as mesas e fazendo suas anotações. É bem corrido (a viagem toda foi bem corrida), mas permite se deparar com rótulos excelentes. Como novato, fiquei na cola dos amigos experts, que me indicavam coisas imperdíveis (“Não deixe de experimentar o Lagarde”, dizia um; “Prove o Cabernet Franc da Casarena”, dizia outro).
Grande parte das minifeiras termina em almoço ou jantar, uma agradável confraternização entre enólogos, representantes e donos de bodega com os convidados, momento que permite aprofundar a conversa sobre vinhos, a combinação com pratos e tudo mais. Desta forma, a mesa de jantar na Bodega Vistalba (após um belo entardecer) foi uma das mais divertidas, com ótimos vinhos (provei novemente o Torrontês da Kaiken), comida excelente e um azeite (Corte V) delicioso de edição numerada produzido pela própria bodega (ganhei o de número 397).
O sexto dia de viagem (e o segundo em Mendoza) começou com uma visita à Trivento (aqui dois vinhos me chamaram a atenção: Trivento Golden Reserve Cabernet Sauvignon 2012 e Eolo Malbec 2012) e, na sequencia, à Bodega Norton (mais três pra lista: Norton Cosecha Especial Vintage 2010 Extra Brut; Lote L-109 Malbec 2009 e Gernot Langes 2008, um blend de Malbec, Cabernet Sauvignon e Cabernet Franc). Meu humor não estava dos melhores, e decidi não participar da minifeira, um erro duplo que mereceu um digno puxão de orelhas.
O lance das minifeiras é que, bem, o pessoal está ali para vender vinho e a turma de brasileiros para anotar interesses, trocar informações, movimentar o mercado. Não me senti muito à vontade em ficar ocupando tempo dos exibidores, porém eu não contava com a astúcia deles: a lista de profissionais presentes é apresentada quando o convite é feito para uma minifeira, ou seja, eles sabiam que eu estaria lá. E só descobri isso na mesa do almoço, quando comecei um papo animado com um enólogo sobre carnes, vinhos, cerveja e música.
“Você não provou o meu vinho”, foi a primeira coisa que ele me disse antes mesmo da entrada do almoço ser colocada na mesa. Respondi (de bate pronto) que iria provar naquela hora, na mesa, mas o que me surpreendeu foi sua resposta quando comentei que era Sommelier de Cerveja: “Eu sei. Entrei no seu site essa semana. Tem entrevistas bem boas sobre música lá”. Engoli seco e, não bastasse o arrependimento (e a certeza bacana de que a paixão pelo vinho é algo sério), amigos do grupo disseram que essa foi uma das melhores minifeiras da viagem…
Tudo bem, haveria uma segunda chance no mesmo dia, quando partimos para a agradabilíssima Bodega Tapiz, também pousada (e também produtora de um azeite delicioso), em que além de conhecer os vinhos da casa, haveria outra minifeira (haja vinho, amigos, haja vinho). Da Tapiz, um dos destaques do dia foi o Black Tears Malbec 2010. Na minifeira, a linha Revancha, de Roberto De La Mota, foi um dos destaques, mas só tive olhos (e paladar) para o Mascota Opi Malbec 2013, um dos meus preferidos de toda a viagem. No jantar, um dos sucessos foi o espumante Brut Nature Colonia Las Liebres feito 100% com uva Bonarda.
O terceiro e último dia nosso em Mendoza foi especialíssimo pelos extremos: de manhã partimos para a Bodega DiamAndes, um projeto arquitetônico impressionante do escritório Bormida & Yanzon de deixar a gente sem ar aos pés da cordilheira. Na parte da tarde visitamos a Gouguenheim Winery, uma bodega na total contramão tecnológica da DiamAndes, que ainda produz vinho da mesmo forma com que os primeiros donos da casa produziam nos anos 40, uma experiência lúdica que abre horizontes: há bons destaques em ambas as casas.
Na DiamAndes me apaixonei pelo DiamAndes de Uco Viognier 2013 e, principalmente, pelo DiamAndes Gran Reserva 2008 (a ponto de compra-lo durante a visita – das 23 garrafas que vieram na mala, apenas mais uma foi comprada diretamente na bodega durante a visita). Da Gouguenheim Winery gostei muito do Syrah Bonarda 2013 e do Red Melosa 2010 (Malbec, Sauvignon, Merlot e Bonarda). Na DiamAntes houve minifeira. Meus destaques: o excelente Pinot Noir da Bodega Laureano Gomez, o Malbec 2012 da Alpasión (com um dos melhores rótulos de toda a viagem) e o trio da Bodega Masi Tupungato, que aproxima a Itália da Argentina (em blends de Corvina e Malbec).
A despedida de Mendoza aconteceu mais à noite, no elogiado restaurante Siete Cocinas da Argentina, com o chef Pablo Del Rio caprichando no menu e a companhia na mesa de representantes das vinícolas Roca, Rutini e Decero. Abrimos a noite com um Rutini Apartado Gran Chardonnay 2013, passamos para um Alfredo Roca Pinot Noir 2010, seguimos com um Alfredo Roca Bonarda 2012, Decero Petit Verdot 2011 e Decero Amano 2011, e fechamos a noite com um Rutini Apartado Gran Malbec 2010 e um indie Cara Sur Bonarda 2013.
Não deu muito para caminhar por Mendoza nos três dias, mas foi possível conhecer um número inimaginável de vinhos da região, o que me faz já ter vontade de fazer planos para uma volta mais calma e sossegada. O trecho final da viagem mapeia a terceira região de vinicultura da Argentina: passaremos por San Juan, onde visitaremos a Bodega Finca Las Moras e Casa Montes e, no dia seguinte, partiremos para La Rioja, para as últimas duas visitas: La Riojana e Paiman. Trecho final de viagem (e já está dando saudades).
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outubro 24, 2014 No Comments
Na rota dos vinhos na Argentina (parte 2)
O terceiro dia começou puxado com um voo de Buenos Aires para Neuquén, na Patagonia, e se ao ler “Patagonia” você imaginou aqueles cenários idílicos de Ushuaia, saiba que um voo de Neuquén pra lá demora cerca de seis horas e que a Terra do Fogo não é lá dos melhores territórios para plantio de uva (e essa viagem que estou fazendo é sobre vinhos argentinos).
Não é a toa que a grande concentração de vinicultura na Argentina acontece em Mendoza, região responsável por 75% da produção anual de vinhos do país. Neuquén responde por 0.82% da produção de toda a Argentina, e, ainda assim, apenas uma das grandes vinícolas da região, a Bodega Del Fin Del Mundo, produz sozinha anualmente 9 milhões de garrafas de vinho.
Nosso passeio começou assim que deixamos o aeroporto. Uma van no esperava para nos levar para a Bodega Humberto Canale, fundada em 1909 no coração do Alto Vale do Rio Negro, na Patagônia, e hoje dirigida pela quarta geração da família, Guillermo Barzi Canale, que nos recebeu junto ao enólogo da casa (desde 2003), Horacio Bibiloni, que nos recebeu para falar sobre a bodega, nos mostrar alguns de seus vinhos e nos presentear com um almoço coordenado pelo chef Walter, um churrasco maravilhoso que se saiu como a melhor refeição (até agora) da viagem.
Entre os vinhos, provamos cerca de 10 garrafas e o Humberto Canale Cabernet Franc 2012 foi bastante elogiado (também foi um dos meus preferidos), mas a linha toda me agradou, com destaque também para o Humberto Canale Gran Reserva Merlot 2011. Para o almoço seguimos com um Humberto Canale Gran Reserva Malbec e, depois, outro dos melhores vinhos da viagem: Humberto Canale Centenium, um blend de Malbec, Merlot e Cabernet Franc (envelhecidos em barris norte-americanos e franceses) com produção iniciada em 2005 para festejar os 100 anos da vinícola.
Após a passagem na Bodega Humberto Canale, e ainda com as malas na van, fomos conhecer a pequena (mas apaixonante) Bodega Del Rio Elorza. Quem nos recebeu foi o jovem enólogo Agustín E. Lombroni, de 29 anos, que cativou a todos com sua sinceridade (italiana) e seus excelentes vinhos, que não levam o selo de orgânicos (“embora sejam”, comentou alguém). A turma toda elogiou bastante o trabalho de Agustín, que me pareceu um sonhador em meio a tanta gente querendo apenas fazer dinheiro com o vinho. Os vinhos da Del Rio Elorza não são fáceis (principalmente para quem está acostumado com vinhos “mainstream”), mas vale muito ir atrás deles (procure pela linha Verum).
À noite, jantar no excelente restaurante La Toscana, em Neuquén (o melhor da viagem até agora – recomendo), na companhia do simpático Julio Viola, diretor da Bodega Del Fin Del Mundo. A essa altura do campeonato, o cansaço de voo e visita a duas vinícolas cobrou seu preço, e a mesa ficou um pouco dispersa – uma pena, porque os vinhos servidos sob coordenação de Viola me pareceram ótimos, com destaque (pessoal) para os excelentes Fin Del Mundo Single Vineyard Cabernet Franc 2010 e Fin Del Mundo Special Blend (Malbec, Sauvignon e Merlot) 2009. Tentarei levar um deles para São Paulo também…
Para recuperar as energias, nada melhor que uma boa noite de sono, e o fato de 19 de outubro ser o Dia das Mães na Argentina tanto nos ajudou a descansar um pouco mais (afinal, com feriado na cidade, as tarefas foram agendadas para o fim da manhã) quanto prejudicou as visitas às bodegas Del Fin Del Mundo e NQN, com a apresentação pendendo para o lado mais turístico (rápido e protocolar) das vinícolas do que aprofundadas. Uma pena.
Ainda foi interessante comparar a produção artesanal de Agustín na Bodega Del Rio Elorza com a escala industria da Bodega Del Fin Del Mundo, a tal que faz 9 milhões de garrafas por ano. O tour, bastante básico, não me ajudou a aprofundar nos rótulos, mas há coisa interessante aqui. Já na (moderna) NQN, com um prédio de arquitetura caprichada que conversa com seu entorno, a apresentação foi mais agradável e os vinhos soaram melhores, embora o restaurante tenha me decepcionado bastante.
A rápida passagem pela Patagônia (apenas dois dias) me fez ter vontade de aprofundar um pouco mais na região. A próxima parada (após viagem de 10 horas de ônibus leito) é Mendoza, e após quatro dias imerso no mundo do vinho (com todos ao meu redor discutindo animadamente sobre as coisas boas, os problemas e as dificuldades da área), a chegada à região que mais produz vinhos na Argentina me deixa bastante animado. Iremos ficar quatro dias lá (vou tentar dividir o trecho em dois posts) e depois iremos para San Juan e La Rioja. Segue o jogo.
Turismo: Na rota das vinícolas argentinas (aqui)
outubro 19, 2014 No Comments
Na rota dos vinhos na Argentina (parte 1)
Quando a turma da Wines of Argentina me convidou para participar de um desafio para harmonizar duas garrafas de vinhos argentinos com canções de uma playlist especial, encarei o convite de maneira leve: apesar de não ser conhecedor de vinhos, o curso de sommelier de cervejas feito no primeiro semestre de 2013 me daria uma base inicial para, no mínimo, não fazer feio. E tinha a parte das músicas, muito bem selecionada. No fim das contas, gostei do texto e, quem diria, entre diversos sommeliers de vinho, fui escolhido para integrar um tour de 10 dias por vinícolas da Argentina.
Nesse momento bate aquela insegurança de estar em um ambiente que você desconhece completamente, e, depois de muito pensar, decidi assumir o personagem do observador, tentando não influenciar na rotina (opinativa) do grupo (somos oito pessoas viajando juntos, todos conhecedores aprofundados do mundo do vinho com exceção de… um) e ir aprendendo com eles. Quando a gente assume que não sabe nada, o mundo se abre de uma forma interessante. Ou seja, encarei esses 10 dias como uma imersão no mundo do vinho (não só argentino) observando experts no assunto.
A primeira parte da viagem passou pela Capital Federal, Buenos Aires, e o ponto de partida não poderia ter sido melhor. Assim que chegamos ao hotel e fizemos o check-in, e com tempo livre, o grupo decidiu ir caminhando por Pallermo Soho até a vinoteca de Joaquin Alberdi, e a visita foi a melhor abertura de viagem possível: em questão de duas horas (e sem compromisso), o grupo, orientado por Joaquin, fez uma seleção de sete rótulos (malucos) de vinho que, automaticamente, entraram na minha lista de vinhos preferidos sem concorrência com os anteriores (há um concorrente, mas falo sobre no post final daqui alguns dias).
Não tinha como dar errado: um dono de vinoteca apaixonado por vinho (“Nós amamos o vinho e somos embaixadores dele. Abrimos, provamos e contamos sua história. Assim como um dono de bordel, eu vendo prazer”, disse em certo momento) e um grupo de sommeliers buscando pelos vinhos mais “estranhos” e fora da curva que pudessem encontrar. E o primeiro já valeu a viagem: um da bodega Passionate Wine, o Ineditos Torrontes Brutal 2011, que automaticamente me remeteu a cerveja saison, mas sem a carbonatação, e me deixou apaixonado. Na hora separei uma garrafa para levar.
Vieram, em sequencia, um da Bodega Gen del Alma (Otra Piel Gualtallary Suelo Gen Mendoza “Cabernet Franc – Sauvignon – Pinot Noir 2013”), um Buenalma Malbec 2008, um Achaval Ferrer Special Blends 2012 (Cabernet Franc), um espetacular 33 de Dávalos 2013, da Bodega Tacuil (de Salta) e… mais dois que não anotei. Para apaixonados por vinho (ou mesmo apenas interessados), a JÁ! é um local para ser descoberto e apreciado. Merece ser colocado na agenda de viagens (rua Jorge Luis Borges 1772, Pallermo Soho, Buenos Aires). É ali, na mesma rua, há uma ótima loja de discos (vinis, CDs e camisetas!).
O jantar foi no elogiado restaurante PuraTierra, e a entrada (excelente) foi um ceviche aquecido (camarão, peixe branco e lula) com gengibre em conserva, maracujá e manga. No prato principal, coelho com crosta de mostarda em grãos, frutas cítricas, folhas de amêndoa e talos acelga, feijão verde e tomate confit. Os vinhos da noite foram uma seleção agradavel da Bodega Terraza de Los Andes, que se não me soaram tão especiais quantos os do JA!, acompanharam muito bem os pratos do PuraTierra.
Na manhã de sexta-feira, um seminário bem interessante sobre a “Vinicultura na Argentina” seguido de degustação de vinhos de quatro bodegas: El Porvenir de Cafayate, El Esteco, Amalaya e Tukma – gostei bastante do El Porvenir Laborum Tannat 2012 e do excelente e meio maluco Tukma Altura 2670 Sauvignon Blanc 2014. No almoço, na Casa Restaurante Umare, uma entrada fenomenal (que estou tentando encontrar a descrição) e um prato principal bom, mas não surpreendente. Para acompanhar, os ótimos vinhos que havíamos provado um pouco antes.
Fechando a parte de Buenos Aires, à tarde dei uma passada na Cervelar (ótima loja próxima a Calle Florida com um bom número de cervejas argentinas – comprei 18 garrafas) e, à noite, show de tango no Café Los Angelitos (que, de forma impressionante, eu gostei, e muito – o quinteto musical é muito bom, já o jantar é médio!). A primeira parte da viagem foi excelente para descobrir bons vinhos (com excelente assessoria – ainda visitamos a excelente loja El Fenix, na avenida Santa Fé, 1199) e matar saudade de Buenos Aires. A próxima parada é Neuquén, na Patagonia.
Turismo: Na rota das vinícolas argentinas (aqui)
outubro 18, 2014 No Comments
Bora beber vinho na Argentina
Eis o roteiro da viagem que farei pela Argentina conhecendo vinícolas em cinco cidades numa promoção da Wines of Argentina. Em janeiro fui convidado para participar de um desafio que pedia uma harmonização de dois vinhos com músicas de uma playlist preparada por eles, e minha harmonização foi uma das escolhidas pelo júri. O prêmio foi essa viagem:
16/10 – São Paulo – Buenos Aires
17/10 – Buenos Aires
18/10 – Neuquén (Patagonia)
19/10 – Neuquén (Patagonia)
20/10 – Mendoza
21/10 – Mendoza
22/10 – Mendoza
23/10 – Mendoza
24/10 – San Juan
25/10 – La Rioja
26/10 – Buenos Aires – São Paulo
Entre as vinícolas que irei conhecer estão a Del Rio Elorza, Fin del Mundo e NQN, em Neuquén; Trivento, Norton, Los Toneles, Diamandes e Gouguenheim Winery em Mendoza; Finca Las Moras e Casa Montes em San Juan; La Riojana e Paimán em La Rioja. Ufa! Abaixo um vídeo que explica o processo do desafio e anuncia os vencedores. No fim da página há link para a minha harmonização.
Leia também:
– Desafio: Harmonizando vinho e música (aqui)
outubro 6, 2014 No Comments
Desafio: Harmonizando vinho e música
Fotos de Liliane Callegari
Sempre fui um admirador de vinhos, mas nunca um profundo conhecedor. Não sei, por exemplo, que vinho combina com determinada comida muito menos ocasião, e quando o pessoal da Wines of Argentina me propôs uma harmonização de vinhos com músicas, achei que seria o momento perfeito para corrigir alguns erros no meu currículo de bebedor, afinal meu olfato evoluiu bastante desde que me formei Beer Sommelier no primeiro semestre de 2013, e passei a estudar a bebida fermentada com afinco. Talvez eu esteja pronto para aproveitar mais do vinho na taça do que há alguns anos atrás. A Wines of Argentina me mandou duas garrafas de vinho: um Kaiken Torrontés 2012, branco, da cidade de Salta, e um Reserve Pinot Noir 2011 da Bodega Salentein, de Mendoza. Se cada vinho precisasse ser harmonizado com apenas uma canção, eu iria de “What’d I Say”, de Ray Charles, para o Kaiken Torrontés 2012 (uma canção sedutora e atrevida para um vinho idem), e “Chelsea Hotel #2”, de Leonard Cohen, para o Reserve Pinot Noir 2011 da Bodega Salentein (uma canção de saudade e memórias, suave e profunda que combina com este vinho), mas optei por criar uma pequena trilha sonora (com canções retiradas da playlist que me foi disponibilizada aqui) que me acompanhasse no tempo em que eu bebesse o vinho.
A primeira garrafa aberta foi a de Kaiken Torrontés, numa terça-feira calorenta de São Paulo, que tornou o vinho branco, gelado (calculei mais ou menos 10 ºC), ainda mais aconchegante. Na taça, a percepção do Torrontés é de um vinho com um intenso bouquet floral, remetendo a um jardim primaveril. A uva é bastante perceptível no aroma, mas há mais notas frutadas (como, por exemplo, abacaxi), que se traduzem de forma mais clara no paladar, remetendo a pêssego (principalmente em calda) no final.
No quesito harmonização, a sensação que o Torrontés passa é de um vinho perfeito para abrir um início de noite a dois, ainda com o dia claro e com um clima de sedução que valoriza o feminino, por isso abri com a versão de Brad Mehldau para “Dear Prudence”, dos Beatles, cuja letra original convida a menina para brincar ao sol, algo que o Torrontés parece reafirmar. “What’d I Say”, de Ray Charles, é ótima para fazer a ponte da metade da garrafa, um pouco mais atrevida, mas nem tanto, enquanto os ânimos aquecem. “Eu Sou do Tempo Que a Gente Se Telefona”, de Blubell, com seu arranjo, que começa nos anos 40, e lá pelo meio cresce e preenche o ambiente, parece perfeita para o calor que o vinho e a conversa trazem nesse estágio, e quando a alegria parece querer pular para fora da taça, “Tuve Sol”, do Bajofondo. Uma harmonização de encontro a dois, ao mesmo tempo sedutor e respeitoso, que os aproxima conforme a garrafa esvazia.
No dia seguinte foi a vez do Reserve Pinot Noir 2011 da Bodega Salentein, um vinho tinto de coloração avermelhada, puxada para o rubi. A recomendação era para bebê-lo em torno dos 17 ºC, mas dado o calor intenso deste começo de janeiro, deixei-o aproximar-se dos 20 ºC e, ao tirar da geladeira, deixei-o a garrafa sobre a mesa alguns minutos, para que o vinho se acostumasse com a temperatura ambiente do meu apartamento. Na taça, o Salentein Pinot Noir me pareceu bastante frutado (frutas vermelhas, mas puxado para amora e cereja), com um leve toque de amadeirado, que também traz baunilha. O paladar, por sua vez, começa doce e frutado, e se abre, como um leque, oferecendo uma paleta variada de tons (leve acidez, frutado, amadeirado, uma pitada de álcool, um toque de baunilha).
Para este vinho, no quesito harmonização, minha percepção foi direcionada para um conjunto de canções suaves, mas, ao mesmo tempo, profundas. Desta forma, imaginei abrir a garrafa ao som de “Chelsea Hotel #2”, de Leonard Cohen, uma canção de saudade, de memórias, suave e profunda (impressão que o arranjo delicado amplifica). Imagino o vinho descendo aconchegante e nos trazendo memórias e sonhos. Mantendo o clima, “Todas Las Hojas Son Den VIento”, do Pescado Rabioso, grupo que o saudoso Luis Alberto Spinetta manteve entre 1971 e 1973, e, na sequencia, outro de El Flaco, desta vez solo com “Era de Tontos”, as duas canções cumprindo a função de acompanhar o vinho na passagem do estágio da contemplação para o da excitação, com a memória atiçada pelo líquido e pela letra (“No puedo evitar que mi memoria esté recompilando los viejos tempos”, canta El Flaco). Para o final da garrafa, nada acelerado (ao contrário do Torrontés), mas mais reflexão: “Off You”, do Breeders, conduzindo o ouvinte, de mãos dadas com o vinho, por um mundo que muda a todo momento – o que valoriza todo o percurso de memórias feito até aqui.
Vamos começar de novo?
janeiro 10, 2014 No Comments