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Martin Scorsese, eu e a morte

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Foto: Marcos Pacheco

Comecei nesta semana a ler o quarto livro do ano, o que por si só já é um recorde de muitos anos. Ok, estou roubando um bocadinho na conta. Terminei o obrigatório “O Resto é Ruído”, do Alex Ross, em janeiro, mas comecei a ler mesmo em setembro ou outubro, quando voltei a pegar metrô e trem para o trabalho, o que trouxe a leitura de volta ao meu cotidiano (faço parte do grupo de pessoas que não pode ler em ônibus nem carro – enjoo na certa).

O segundo livro foi “A Visita Cruel do Tempo”, romance magnifico de Jennifer Egan. Agradeço imensamente à Ana Carolina, da Intrinseca, por ter me enviado o livro. O Gabriel já tinha recebido um para resenhar para o site (aqui), mas a Ana mandou assim mesmo um para mim. Nas entrelinhas, um “você precisa ler isso”. Obrigado, Ana. Egan me pegou de jeito. No meio da correria não calculei todo o impacto do livro sobre mim, mas foi forte, beeeem forte.

Sobre o terceiro, “Sexo na Lua”, de Ben Mezrich (o mesmo autor de “Bilionários por Acaso”, que originou o filme “A Rede Social”), falo um pouquinho mais em resenha (curta, mas direta) para uma revista (quando sair aviso aqui). E, então, comecei o meu quarto livro de 2012, “Conversas com Scorsese”, do crítico e documentarista Richard Schinkel, edição da Cosac Naify que segue o modelo do ótimo “Conversas com Woody Allen”, de Eric Lax.

Assim como Lax, Schinkel conheceu seu “objeto de estudo” no começo dos anos 70. Eric Lax conheceu Woody em 1971 (e as entrevistas começaram em 1973) enquanto Richard Schinkel convidou um amigo para uma projeção em casa de “Jejum do Amor” (1940), de Howard Hawks (“Uma das melhores de todas as comédias românticas”, grifa o crítico), e esse amigo trouxe Marty. A amizade seguiu, mas as entrevistas do livro começaram a ser feitas apenas em 2004.

“Acredito, de fato, que a coisa mais importante que descobri sobre Marty foi o poder que o passado exerce em seu trabalho”, conta Schinkel no prefácio. “Estou falando, por exemplo, da forma como a violência se apresenta em seus filmes. Ela aparece tão de repente. Raramente existe uma preparação para ela. Ele quer que fiquemos tão chocados – e tão atentos – como ele foi um dia (em Little Italy). É a assinatura gravada de sua sensibilidade”, analisa.

Estou apenas no começo do livro (página 60 de quase 500), mas me impressionou como o medo era um integrante vivo da rotina de Scorsese quando criança, uma criança asmática, o caçula de uma família numerosa que vivia em um apartamento de dois cômodos e meio numa rua do bairro italiano (e mafioso) de Nova York – e que conseguia um pouco de paz apenas dentro de um cinema e da igreja (ele foi coroinha e cogitou ser padre).

Impressionado com a quantidade de vezes que Marty usa a palavra “medo” (ou equivalentes) em 30 páginas (as que tratam de sua infância em Little Italy), comecei a rememorar minha própria infância, olhar para trás para identificar algum sentimento, algo que tenha ficado para trás (análises, ahh, a idade – risos). Não é questão de comparar, apenas uma curiosidade sobre si mesmo, mas óbvio que a minha infância foi bem mais calma que a do cineasta.

Ainda assim me lembrei de algo que tomou boa parte dos meus primeiros anos – não sei ao certo de quando a quando, mas me parece algo entre os quatro até os seis (talvez mais tarde, não sei). Mas durante meses (ou anos) eu deitava na cama e me via… morto. Ok, não me via, mas via o caixão, e sabia que eu estava lá. E sabia que era um eu velhinho, ou seja, não era uma preocupação de “posso dormir e não acordar”, mas sim uma preocupação… futura.

A vida era leve nessa época (pais exigentes e carinhosos, futebol com a molecada na rua, não tenho lá tantas memórias até a primeira série, aos 6 anos, quando a vida realmente “começa”), e não sei de onde esse sonho surgiu, e porque me acompanhou tanto tempo, mas um dia do nada ele foi embora (provavelmente trocado pela paixão pelo futebol, ou por uma das meninas da sala de primeiro ano, ou, claro, por uma das professoras de catecismo – tão óbvio). Dos sonhos estranhos…

Voltando a Scorsese (e 2012), já estou fazendo um planejamento mental de filmes para ver nos próximos dias. Amo o tristíssimo e dolorido “A Época da Inocência” (1993), embora não o veja desde os anos 90. Marty fala muito de “Os Infiltrados” (2006) no começo do livro, e deu vontade de revê-lo, assim como alguns do começo da sua carreira que nunca vi – “Quem Bate à Minha Porta?” (1968), “Caminhos Perigosos” (1973) e “Alice Não Mora Mais Aqui” (1974).

Outro que até tenho na estante e nunca assisti é “O Rei da Comédia” (1983), mas quero mesmo rever “Gangues de Nova York” (2002 – na época gostei tanto que escrevi isso aqui). Revi “Goodfellas” mês passado, e “A Cor do Dinheiro” (1986), “Taxi Driver” (1976) e “Cassino” (1995) estão fresquinhos na memória (revi os três em 2011). Já “A Última Tentação de Cristo” (1988) me venceu duas ou três vezes…

A leitura está rendendo como há tempos não rendia. Mas ainda tenho os dois Jonathan Safran Foer na fila (e a Nicole Krauss também), comprei a coleção “O Tempo e o Vento”, do Érico Verissimo, para reler (um dos meus livros preferidos desde sempre) e ainda tenho “Escuta Só”, do Alex Ross e muitos outros me olhando na estante (Shakespeare e Oscar Wilde pedem atenção e ainda tem os quatro volumes do… Marcel Proust). Devagar e sempre.

Leia também:
– Leia o 1º capítulo de “A Visita Cruel do Tempo”, de Jennifer Egan (aqui)
– “O minimalismo e o rock and roll”, trecho de “O Resto é Ruído” (aqui)
– De Luis Buñuel para Erasmo Carlos (aqui)
– De volta ao mundo de Rob Fleming (aqui)
– Os filmes prediletos de Woody Allen: 15 americanos, 12 europeus (aqui)
– Woody Allen de 0 a 10, por Marcelo Costa (aqui)
– “Quem precisa pensar sobre tamanhas bobagens”, Woody Allen (aqui)

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