entrevista por Guilherme Lage
Gabriel Thomaz é nome conhecido na cena musical brasileira há pelo menos três décadas. Vocalista, guitarrista e principal compositor de nomes como Autoramas e Little Quail & The Mad Birds, um dos mais célebres filhos da capital federal assina também colaborações com artistas como Raimundos e Erasmo Carlos, entre tantos.
Desde 2021 Gabriel divide seu tempo na música entre estúdio, palco e mesa de produção. Naquele ano, Thomaz fundou ao lado do amigo Roncoletta o Maxilar Records, selo independente que preza pela pluralidade de gêneros do cenário independente brasileiro.
Gabriel falou de tudo um pouco nesta conversa: as dificuldades de se organizar um festival, parcerias, como é a vida dividindo o palco e a produção. Confira!
Gabriel, me conta um pouco sobre como é o desafio de organizar um festival?
Cara, é o segundo ano que estou fazendo isso. (O Maxilar Festival) é direcionado basicamente para os artistas do selo, que está lançando um monte de coisa legal. Neste ano resolvi concentrar em São Paulo, ano passado fiz em seis cidades diferentes, São artistas diferentes entre si, tem bandas pesadas e cantora de jazz ao mesmo tempo. Estou mandando brasa nas paradas. Temos muitas opções de artistas, temos um público interessado. São muitos lançamentos. Hoje mesmo (23 de junho) saíram quatro lançamentos. Temos Lost Liars, de Jundiaí, os caras são bem jovens, na faixa de 17 anos, moleques incríveis. Quem me dera tocar tão bem quanto eles quando tinha 17 anos (risos). Tem o Asteroid Trio, que faz um rockabilly, punkabilly, eles lançaram um disco com o João Gordo que foi super bem recebido, agora estão lançando uma música para um filme, “Ataque dos Vampiros”, uma coisa tipo pornochanchada. Além disso tem uma banda garage punk amazônica, Acossados, já é o segundo EP deles que eu lanço. Também tem uma banda de Londrina, que é o Alienista, é uma banda totalmente anti-comercial. Acho que precisavam mesmo de um cara como eu para lançar uma parada assim (risos).
E para você que sempre esteve no palco, é difícil trabalhar atrás dele, na produção?
Sempre fiz isso. Quando comecei lá em Brasília sempre trabalhei com produção, aliás, sempre quis ter um selo. Não é a primeira vez que trabalho com selo, tive um chamado Gravadora Discos, que lançava só vinil e cassete numa época que ninguém fazia isso. Hoje o mercado não precisa mais de mim pra isso, há gente muito mais preparada fazendo (risos). No início eu também trabalhava em uma produtora em Brasília, quando tinha lá meus 18 anos, isso faz muito tempo, uns 30 anos. Eu sempre soube fazer isso, sempre produzi show de todo mundo. Fiz um festival muito tempo no Rio, o Ruído Festival, que durou bastante tempo. Sempre botei a mão na massa, sou muito experiente nisso. As próprias turnês do Autoramas, tinha vezes que eu produzia e tocava, fiquei até doente de tanto trabalho. Muitas vezes estava depois do show, dando atenção ao público, e tendo que assinar contrato, resolver milhões de coisas. Teve uma vez que caí doente, foi aí que parei de fazer as coisas do Autoramas no Brasil, comecei a fazer lá fora. Garimpando contatos, concatenando tudo, sabe. Sempre fiz essas coisas, não é novidade. Produzir disco, capa, clipe, vídeo, dvd, eu fiz isso tudo, cara. O essencial é saber administrar o calendário. Também é necessário ter ideias, direcionamentos, saber para que lado você quer ir. A gente vai metendo a mão na massa mesmo, já estou acostumado a fazer. (Mas) Dá um trabalho do cacete (risos).
Você sempre foi muito eclético, dá pra notar suas influências de punk rock, new wave, Jovem Guarda. Você procurou explorar pluralidade musical brasileira com o selo?
Olha, inicialmente não, eu queria fazer as coisas que eu tenho mais domínio, mas começaram a aparecer coisas que eu curtia, eu comecei a me esforçar para chegar em outras turmas. Não sei se sou a melhor pessoa pra fazer isso, mas muitos artistas me pedem para ajudar, e eu não consigo dizer não se eu gosto da música. É uma doideira, eu acabei descobrindo que eu conheço gente de tantas modalidades musicais que eu acabo falando de um artista pra quem eu acho que vai gostar. Acabo falando de muitos artistas pra diferentes pessoas, de acordo com o gênero, apesar de saber que eu não sou a pessoa que mais domina isso. A gente vai na boa vontade e as coisas podem acontecer de formas legais.
Você trabalha com bandas e artistas solo na gravadora, há um interesse desde que a música seja legal?
Não importa o formato, por exemplo, no selo tem artistas que têm bandas, que são bissextas, como é o caso das Bruxas Exorcistas, que tem a Virginie do Metrô e várias outras meninas (Luísa Matsushita, Erika Martins, Maria Paraguaya, Apolônia Alexandrina, Camila Costa e Emillie Ducassé). Elas lançaram dois singles, um em cada ano, nunca fizeram show e acho que nem vão fazer. Acho tudo isso muito interessante, é diferente, mas tento fazer de todo jeito.
Quando converso com amigos sobre seus projetos, sempre falamos dos efeitos que você usa, diferentes pedais, o que torna sua música quase que experimental. Você procura artistas nessa mesma pegada?
Nem sempre. às vezes eu gosto de alguns artistas bem tradicionais que trabalham a música de forma bem tradicional no som que fazem. Mas uma das coisas que mais admiro nos artistas é a originalidade, com certeza. Esse termo ‘experimental’, não sei se é exatamente o que define. Eu curto bandas que tentam atingir a originalidade, imprimir novas ideias e muitas vezes essas novas ideias são mega populares. Eu me acostumei a usar o termo experimental para sons mais, entre aspas, difíceis. Se vejo alguma coisa nova, algo que nunca vi, eu fico louco, admiro, bato palmas e tento divulgar, nem sempre é algo que a gente consegue. Tenho minhas coisas apontadas para esse lado. Uma vez eu li um livro que me fez dar muita risada sobre o termo experimental. Dizia assim “quando o artista rotula a própria música como experimental, é porque o experimento não deu certo” (risos). Eu penso nisso também, você tem uma ideia nova que cola e é aquilo, legal pra caramba. Fazer uma coisa muito doida que ninguém entendeu, rotula de experimental (risos). Não que eu ache que isso é 100% verdade, mas me diverti bastante.
E sobre o público, há uma expectativa legal para o festival?
Tomara que sim! Ano passado rolou em várias cidades mas foram apenas locais pequenos, para um público específico. Espero que esse ano seja uma média legal de público também. O local onde vai rolar, a Associação Cultural Cecília, é onde faço a entrega do Prêmio Gabriel Thomaz, então sempre ferve, tem muita gente.
E cara, quando você descansa? Porque parece que está sempre trabalhando.
Realmente, tenho trabalhado bastante. Tem rolado essa necessidade, de fato. Mas então, eu sempre eu tiro um dia por semana pra descansar pra cuidar da cabeça e do corpitcho (risos).
– Guilherme Lage (fb.com/lage.guilherme66) é jornalista e mora em Vila Velha, ES. A foto que abre o texto é de Marcelo Costa / Scream & Yell