Com Lag - Radiohead
por
Marcelo Costa
maccosta@hotmail.com
13/10/2004
O Radiohead
volta a ordem do dia com Com Lag, coletânea de b-sides
do álbum Hail To The Thief compilada para promover a
tour japonesa que o grupo fez em 2004. Antes de entrar no mérito
de resenhar o disco, algumas explicações se fazem necessárias.
A primeira é de que o álbum vem sendo apresentado como um EP,
o que é uma tremenda bobagem. Com Lag traz dez faixas
em pouco mais de 36 minutos de música, o que remete aos velhos
e bons tempos do vinil. Um EP, ou extended play, traz, invariavelmente,
entre três e seis faixas, no máximo sete. Então vamos deixar
de bobagem e tratar Com Lag como um disco. Dois: a coletânea
foi feita para promover a tour nipônica do quinteto e chega
ao Brasil importada pela gravadora, custando os olhos da cara.
O mercado nipônico é uma loucura. Todo mundo sabe que, em termos
de objetos eletrônicos, independente do que quer seja, os japoneses
fizeram antes... e melhor. Assim, um CD japonês custa muito
mais caro que um CD americano, europeu ou brasileiro. O tal
disquinho que é feito no Japão traz um fio de ouro que aumenta
a durabilidade e a qualidade do áudio em dezenas de vezes. Porém,
quando o assunto é grana, não basta se apoiar na qualidade,
pois o público irá atrás do mais barato, seja aqui, em Vladivostok
ou no Japão. É inevitável e histórico. Com isso, estando
no Japão, sai muito mais em conta comprar um CD americano
do Radiohead do que comprar um CD japonês do Radiohead. A genial
saída dos japas: colocar canções bônus que só se encontram no
mercado japonês.
É por isso que, via de regra, o mercado japonês (um dos maiores do mundo) é abastecido com itens especiais, edições que trazem faixas bônus exclusivas e o escambau. Dessa forma, não dá para
entender Com Lag como um disco para o mercado brasileiro. O alto preço do CD (em torno de R$ 80) mostra a disparidade entre a economia dos dois países. E, convenhamos, nenhum CD vale R$ 80. Eu paguei R$ 40 no meu, em uma lojinha da Galeria do Rock, após ter esbarrado com o CD em outras duas lojas por R$ 45. Ainda assim, acho um absurdo. Porém, é um
item de colecionador e, sobretudo, um passeio pelo mundo estranho e belo do Radiohead.
A rigor, Com Lag só traz uma faixa quase inédita: é a
versão de 2+2=5, canção que abre o disco Hail To The
Thief , captada ao vivo em Londres, no dia 26 de novembro
de 2003. Com bateria eletrônica à frente, a canção cresce, empolga
e arrebenta: é o Radiohead abraçando as guitarradas. 2+2=5 ainda
engorda a parte multimídia do disco, com um vídeo gravado
no Festival Belfort. As outras noves faixas são lados b inclusos
nos três singles de Hail To The Thief, a saber, There
There, Go To Sleep e 2+2=5, todos lançados
entre maio e novembro de 2003 nos Estados Unidos, Reino Unido,
Japão e Canadá..
Não dá para cobrar uma concisão no repertório, dado as circunstâncias
da reunião do material, mesmo assim, Com Lag merece
aplausos por reunir sob a luz do laser o lado lírico-sombrio e o lado
eletro-esquizofrênico do Radiohead. Do primeiro grupo surgem
as principais pérolas do disco: I Will - Los Angeles Version
foi retirada do single 2+2=5 e ganhou mais ritmo
com uma pequena mudança no arranjo. O vocal, duplicado, tornou
a música mais bela que a versão original, presente em Hail
To The Thief. A versão original de Fog engordou o
single de Knives Out, do álbum Amnesiac. Esta
nova versão, gravada ao vivo no Planet 2Nite TV show, em agosto
de 2003, e lançada como b-side no single de Go To Sleep,
despiu a música dos barulhinhos eletrônicos e a deixou comovente.
É só Thom Yorke, piano e voz. E basta. A terceira faixa que
expõe o lirismo do grupo é Gagging Order, o melhor momento
do disco. Retirada do single Go To Sleep, e conduzida
por violões, Gagging Order dá seu recado logo na primeira
linha: "I Know What You'Re Thinking / But I'm Not Your Property".
Brilhante.
Do lado eletrônico, dois remixes pedem passagem: Remyxomatosis é a versão
de Cristian Vogel para Myxomatosis, de Hail to the Thief.
Foi lançada no single de 2+2=5 e é um duelo de batidinhas eletrônicas com teclados climáticos.
Por cima disso, a voz marcante de Thom Yorke. Skattrbrain é a versão
do Four Tet para Scatterbrain, também do Hail to the Thief,
retirada também do single 2+2=5. As batidinhas marcam
presença, mas o clima melancólico da canção permanece. Mesmo mantendo pequenos traços das canções originais, os dois remixes são interessantes, porém
inferiores.
Retiradas do single de Go To Sleep, as inéditas I Am a Citizen Insane e I Am a Wicked Child relembram a atmosfera de Amnesiac. I Am a Citizen Insane é uma boa faixa instrumental com batida eletrônica à frente
enquanto I Am a Wicked Child é outra das grandes canções do disco, trazendo
uma guitarrinha safada duelando com o sax disparado pelos teclados e o vocal
forte de Thom Yorke. Paperbag Writer (do single de There There)
se apóia na eletrônica, no jazz e no funk. Linha de baixo marcante, teclados climáticos, batidinhas se completam no arranjo. Para fechar, outra faixa retirada do single da música There There: a instrumenal Where Bluebirds Fly,
a faixa mais eletrônica e estranha do disco, preenchida por batidas aceleradas,
sussurros de Thom Yorke e teclados suntuosos.
Teoricamente, Com Lag não acrescenta nada na carreira do Radiohead. É apenas uma boa coletânea de b-sides de uma banda que costuma relegar ao segundo plano belas canções de seu extenso repertório
(quem conhece Punchdrunk Lovesink Singalong, How Can You Be Sure? e Polyethylene,
para ficar apenas em três, sabe o que estou dizendo). Com um belo trabalho gráfico (que incluí as letras, obrigatórias em qualquer álbum lançado no Japão), Com Lag reúne o lado sombrio e o lado futurista do Radiohead em um mesmo disco, sem muito alarde. Novidade mesmo só quando a banda entrar em estúdio
para parir o sucessor de Hail To The Thief. Aí será uma outra história...
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