A Sete Palmos
por
Angélica Bito
mordendotampas.blogger.com.br
03/07/2003
O sucesso de "Beleza Americana" abriu
portas para que o cinema americano pudesse, finalmente, deixar para lado
a perseguição do sonho americano para levar às telas
o 'loser'. Para quem não sabe, o 'loser' é aquele cara que
não é, exatamente, um exemplo à sociedade. Ele, simplesmente,
vive a realidade das ruas, e não dos filmes. É exatamente
pela mão de um dos produtores de "Beleza Americana", Alan Ball,
que chega às nossas telinhas "A Sete Palmos", série produzida
e exibida pelo canal por assinatura HBO desde 2001. O programa mostra essa
sociedade longe de máscaras, longe de ser perfeita e que existe
na maioria das famílias. Ball, mentor dessa série, dá
um chute na hipocrisia e mostra, semanalmente, os problemas pra lá
de comuns da família Fisher.
Assim como em "Beleza Americana",
esta é uma história familiar, contemporânea, urbana,
na qual os dramas são permeados por situações bizarras,
com leves pinceladas de humor negro. A família Fisher tem seu patriarca,
Nathaniel, e uma funerária. Imagine você crescendo entre cadáveres
nus em seu porão; gente chorando e um caixão no meio da sala,
quase todos os dias; na garagem, um carro funerário. Foi assim que
cresceram Nate, David e Claire, os filhos. A mãe é a serena
Ruth. Logo no primeiro episódio, começa o drama quando Nathaniel
sofre um acidente e morre. Seus filhos e mulher, então, se vêem
sozinhos, tendo de tocar suas vidas e os negócios da família.
Nate é o mais velho e morava em Seattle, mas teve de voltar ao lar,
em Los Angeles, depois da morte do pai. David é tímido, reprimido
e trabalhou ao lado do pai a vida inteira, apesar de não ser esse
seu mais forte desejo. Claire é a caçula problemática,
depressiva e sensível. E, como se não bastasse, adolescente.
Ao longo dos capítulos, eles aprendem a conviver sem o pai - apesar
de ele visitá-los sempre em conversinhas dentro de suas cabeças
- e com uma funerária para tocar. Cada um, claro, tem seus problemas
e dilemas: Nate é desenvolve uma doença rara e fatal; Ruth
tenta lidar com seu próprio pudor quando arranja outro companheiro
para substituir Nathaniel em sua vida; Claire arranja um namorado problemático
e não sabe como será seu futuro; David deve superar seus
próprios preconceitos e assumir sua homossexualidade e o relacionamento
com um policial.
"Every time I've ever believed in
a happy ending I've gotten severely fucked" (Todas as vezes que acreditei
em um final feliz eu me ferrei muito), diz Brenda, noiva de Nate, em um
episódio. Dias felizes e ensolarados não existem. Não
há finais felizes na vida real, nem em "A Sete Palmos". Cada capítulo
começa com uma morte e é em torno dela que as situações
de seus protagonistas se desenvolvem. Se Nelson Rodrigues ainda estivesse
vivo, certamente soltaria um sorriso a cada episódio, que já
teve diretores do calibre de Kathy Bates, Miguel Arteta ("Por Um Sentido
na Vida") e Rodrigo Garcia ("Coisas que
Você Pode Dizer Só de Olhar Para Ela") atrás das
câmeras, jogando seus olhares cruamente sobre a sociedade hipócrita
em que vivem. A Sete Palmos é uma série extremamente americana.
No entanto, por se tratar de problemas existenciais inerentes a qualquer
um que viva em sociedade, pode conquistar qualquer tipo de espectador.
"A Sete Palmos" é, também,
uma série densa e, para isso, o elenco é essencial. A maioria
dos atores é desconhecida e oriunda do teatro. O rosto mais conhecido
talvez seja o de Jeremy Sisto, que já chegou a encarnar Jesus Cristo
em um filme e foi o pesadelo de Alicia Silverstone e Jeff Goldblum em "O
Esconderijo". Ele é Billy, o irmão problemático da
não menos louca Brenda, vivida pela australiana Rachel Griffiths,
que ganhou reconhecimento internacional ao ser a melhor amiga de Toni Collette
em "O Casamento de Muriel". Ela é a noiva de Nate, vivido por Peter
Krause, um ex-atleta que resolveu virar ator e já fez participações
em seriados como "Ellen", "O Quinteto", "Seinfeld" e até "Barrados
no Baile". Michael Hall, que até agora só tinha atuado no
teatro, é David, enquanto que Claire é Lauren Ambrose.
Elenco e roteiro caminham juntos para
o sucesso dessa série, que já colhe frutos. Em 2001, ganhou
dois Globos de Ouro: de Melhor Série de Drama e Melhor Atriz Coadjuvante,
para Rachel Griffiths. Neste ano, já concorre nas as categorias
de Melhor Série Dramática, Melhor Ator (Peter Krause) e Atriz
(Rachel Griffiths) em Série Televisiva. No Brasil, o seriado chegou
à segunda temporada e a terceira está prometida para o fim
de 2003 pelo canal HBO, produtor da série. No entanto, o canal Warner
Channel comprou os direitos de exibição das primeiras temporadas
de "A Sete Palmos". Se você não acompanhou na época
em que era exibido pela HBO, a sua chance de conhecer a família
Fisher começa no dia 6 de julho. E prepare-se para enterrar seus
preconceitos e ver que seriados americanos não se resumem somente
a risadas enlatadas e problemas de adolescentes.
|