'Os Irmãos Grimm'
por Marcelo Costa
Fotos - Site Oficial
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04/11/2005

Como fazer cinema de qualidade tendo um orçamento de US$ 80 milhões ao seu dispor, uma mega-corporação no encalço lhe enfiando expectativas de público goela abaixo, e uma velha história de conto de fadas nas mãos? A resposta: Irmãos Grimm, adaptação burlesca assinada por Terry Gilliam das histórias clássicas de Jacob e Wilhelm Grimm, que, entre outras coisas, foram os responsáveis pelas primeiras publicações registrando para a posteridade textos recolhidos da memória popular alemã como A Branca de Neve & os Sete Anões, Chapeuzinho Vermelho e A Bela Adormecida.

No entanto, apesar do tom de conto de fadas da obra dos Grimm, o diretor Terry Gilliam (um dos "cabeças" do grupo Monty Python) optou por mudar todo o conceito da empreitada, transformando os irmãos em larápios ao invés de heróis. A artimanha deu certo, embora o resultado final pareça um tanto esquizofrênico. Na verdade, as idéias de Gilliam inundam a tela, mas o próprio diretor tenda molda-las ao estilo blockbuster. Entre Hollywood e Monty Python, Os Irmãos Grimm diverte e entretém o espectador, mas não é perfeito.

O bom roteiro assinado por Ehren Kruger (Terry Gilliam e Tony Grisoni não puderam ser creditados como roteiristas, apesar de terem feito muitas modificações no roteiro original, devido a problemas com a Writers Guild of América) imagina os irmãos Will (Matt Damon) e Jake (Heath Ledger) como dois grandes vigaristas que viajam entre vilarejos para realizar falsos exorcismos e livrar os moradores de bruxas e monstros em troca de dinheiro. Na linha "malandro é malandro, mané é mané", os Irmãos Grimm criam cenários dominados por fantasmas (com auxilio de dois amigos) e surgem como a salvação do povo assustado pelo sobrenatural.

A fama dos Irmãos Grimm corre a Alemanha até chegar aos ouvidos do general francês Delatombe (Jonathan Pryce), militar responsável por manter a ordem no território alemão ocupado pelos franceses. O general manda prender os rapazes, mas lhes dá uma chance de fugir da guilhotina, caso consigam desmascarar outros pseudo-larápios que estão assustando um povoado alemão ao seqüestrar crianças em uma floresta. Junto aos irmãos, o general envia o torturador italiano Cavaldi (Peter Stormare) para que fique encarregado de saber se tudo está correndo como o planejado. Cavaldi e Delatombe são os personagens que ligam Os Irmãos Grimm aos clássicos filmes da trupe Monty Python. O italiano torturador é um dos personagens mais hilários do filme, criando engenhocas sádicas para arrancar confissões de bandidos.

Porém, apesar dos bons efeitos visuais e das boas atuações de Pryce e Stormare, os dois atores principais não conquistam o espectador. Matt Damon e Heath Ledger parecem perdidos na história, nas roupas de época exageradas, e não soam sedutores, não causam empatia com o público. Mesmo o incipiente romance dos irmãos com Angelika (Lena Headey) soa pífio. E a bela Mônica Belucci, aqui como a rainha do espelho, parece sub-aproveitada em um papel menor. Por ironia, o núcleo central do filme acabou sendo obscurecido pelo brilho do roteiro. Ao injetar picaretagem e medo nos famosos Grimm, o roteiro acabou lhes tirando a aura de sedução, que só parece surgir quando o filme se encaminha para o final.

Grimm Brothers é o primeiro filme do diretor Terry Gillam desde o fracasso da produção de The Man Who Killed Dom Quixote, que não chegou a ser finalizada, e de Medo e Delírio em Las Vegas, boa adaptação cinematográfica do livro de Hunter S. Thompson lançada em 1998. Pressionado pelos temíveis Harvey Weinstein e Bob Weinstein (donos da Miramax), que devem ser bem mais assustadores do que cavalos engolindo crianças e árvores se mexendo em florestas, Terry Gillam acabou fazendo uma obra no meio termo entre terror e humor. A interessante distorção do conto de fadas e as recriações do universo Monty Python credenciam o filme, mas é bom ir ao cinema sabendo que Os Irmãos Grimm é um embate entre diretor e produtor. O resultado esquizofrênico não tira os méritos da obra, mas também a impediu de ser melhor.

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